Com o advento do novo Código de Processo Civil (NCPC), o instituto de desconsideração da personalidade jurídica passa a operar de forma estruturada, por meio da formação de um incidente processual. O objetivo dessa inovação é garantir o devido contraditório à parte que sofrerá os efeitos da desconsideração, o que já vinha sendo proposto pelo STJ. Nesse sentido, nos casos em que a desconsideração é requerida na petição inicial, a formação do incidente é dispensada, na medida em que a defesa do réu será oportunizada em sede de contestação.
O incidente de desconsideração tem cabimento em qualquer processo ou procedimento na fase de conhecimento ou de execução e sua instauração se dá por provocação da parte ou do Ministério Público, na qualidade de custos legis, não havendo a possibilidade de atuação ex officio do juiz. Uma vez instaurado o incidente, o processo principal será suspenso, com a comunicação ao distribuidor para fins de registro da sua conexão com a ação originária e ciência a eventuais credores e interessados.
Quanto aos mecanismos de defesa, além da citação do sócio ou da pessoa jurídica para manifestação no prazo de 15 dias, há previsão de embargos de terceiro para os que sofrerem constrição de bens em incidente de desconsideração do qual não fizeram parte. Por outro lado, nada impede que o sócio levante matérias que seriam inerentes à exceção de pré-executividade, por serem reconhecidas de imediato, tais como a ausência de participação no quadro societário da empresa, ou até mesmo o fato de não ser integrante da sociedade ao tempo em que fora praticado o ato que ensejou a instauração do incidente de desconsideração.
Por disposição expressa, o provimento judicial que resolve o incidente de desconsideração tem natureza de decisão interlocutória e, portanto, é passível de recurso de agravo de instrumento, conforme previsão do artigo 1.015 do NCPC. Na hipótese de o incidente ser instaurado em segundo grau e decidido monocraticamente, caberá agravo interno para a turma julgadora.
Uma vez acolhido o pedido de desconsideração, eventual alienação ou oneração de bens ocorrida em fraude de execução será ineficaz em relação ao requerente. A intenção dessa regra é coibir que o sócio ou o administrador aliene ou onere bens de modo a frustrar os efeitos do reconhecimento da desconsideração.
A par da desconsideração convencional, com responsabilização de sócios ou de administradores por obrigações da sociedade, o incidente aplica-se também à desconsideração no sentido inverso - o afastamento do princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar a sociedade por obrigação do sócio.
Como se verifica, inovações consideráveis foram trazidas pelo NCPC com relação ao instituto de desconsideração da personalidade jurídica, de modo a sanar antigas controvérsias jurisprudenciais e submeter a flexibilização do princípio da autonomia patrimonial ao crivo do contraditório. De outro lado, com a previsão e com a regulamentação do incidente, espera-se uma responsabilização mais eficaz daqueles que se utilizam fraudulentamente da pessoa jurídica, com a ressalva de que a desconsideração representa exceção à regra, sendo que sua aplicação desarrazoada pode causar desestímulo à atividade empresarial.