RECURSO ESPECIAL Nº 1.974.633/RS – MIN. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE: GABRIEL NORBERTO LOTTICI
RECORRIDO: TOKIO MARINE SEGURADORA S.A.
TESE
A 3ª Turma do STJ reconheceu, por unanimidade, a possibilidade de isentar a seguradora de responsabilidade na hipótese de alienação do interesse segurado, desde que respeitado o dever de informação. O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, reforçou a importância de observar o disposto no art. 785 do Código Civil, segundo o qual a transferência do interesse segurado sem aviso escrito não produz efeitos em relação ao segurador.
EMENTA
“RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CONTRATO DE SEGURO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA NEGADA. INTERESSE SEGURADO. ALIENAÇÃO A TERCEIRO. ART. 785, §1º, DO CÓDIGO CIVIL. COMUNICAÇÃO. NECESSIDADE. CLÁUSULA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. VALIDADE. DEVER DE INFORMAÇÃO. OBSERVÂNCIA. SÚMULA Nº 465/STJ. INAPLICABILIDADE. 1. A controvérsia dos autos resume-se a saber se ficou configurada a hipótese de negativa de prestação jurisdicional e a definir se é válida cláusula inserida em contrato de seguro de coisa – escavadeira hidráulica –, que exclui a responsabilidade da seguradora na hipótese de alienação do interesse segurado. 2. Não há falar em falha na prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível, mesmo que em desacordo com a expectativa da parte. 3. Há relação de consumo no seguro empresarial se a pessoa jurídica o firmar visando à proteção do próprio patrimônio (destinação pessoal), sem o integrar nos produtos ou serviços que oferece, mesmo que seja para resguardar insumos utilizados em sua atividade comercial, pois será a destinatária final dos serviços securitários. Precedentes. 4. A partir do exame dos precedentes que deram origem à Súmula nº 465/STJ, segundo a qual a seguradora não se exime do dever de indenizar em razão da transferência do veículo sem a sua prévia comunicação, ressalvada a hipótese de efetivo agravamento do risco, podem ser destacados os seguintes aspectos: a) o debate se estabeleceu em torno da contratação de seguro para veículos de uso comum, normalmente utilizados para fins de deslocamento de pessoas e/ou cargas; b) a negativa de pagamento da indenização securitária apresentava como fundamento, no mais das vezes, o simples descumprimento da obrigação de comunicar à seguradora a venda do bem segurado. 5. Hipótese que apresenta peculiaridades que a diferencia dos precedentes que deram origem à Súmula nº 465/STJ, tendo em vista que o bem segurado – escavadeira hidráulica –, além de ser concebido para o desempenho de tarefas que, por sua própria natureza, apresentam elevado grau de risco, era efetivamente utilizado no desenvolvimento de atividade empresarial, e porque havia, no contrato, cláusula expressa prevendo não apenas o dever de comunicar eventual alienação do bem, mas a exclusão da cobertura na hipótese de "transferência do interesse segurado nos bens cobertos, ainda que temporariamente, através de arrendamento, cessão ou locação destes bens a terceiros". 6. Necessidade de revisitação da orientação compendiada na Súmula nº 465/STJ à luz do § 1º do art. 785 do Código Civil, que admite a transferência do contrato nominativo de seguro de coisa a terceiro, com a alienação ou cessão do interesse segurado, condicionando seus efeitos, contudo, à comunicação do fato à seguradora. 7. Cláusula contratual suficientemente clara quanto à isenção de responsabilidade da seguradora na hipótese de alienação do interesse segurado, com pleno atendimento ao dever de informação (art. 6º, VIII, do CDC). 8. Recurso especial não provido.”