O licenciamento ambiental no Estado de Minas Gerais é regido, principalmente, pela Lei Estadual n° 21.972/2016, que instituiu o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema), e pelo Decreto Estadual n° 44.844/2008, que estabelece normas gerais de licenciamento ambiental e o trâmite a ser seguido nos processos administrativos de fiscalização e aplicação de penalidades. De acordo com a legislação estadual, cabe ao Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), entre outras atribuições, aprovar normas relativas ao licenciamento e às autorizações para intervenção ambiental, inclusive quanto à tipologia de atividades e empreendimentos, considerando os critérios de localização, porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou do empreendimento. Usualmente, o Copam exerce sua atividade regulatória por meio de deliberações normativas e portarias, que estabelecem os critérios e as especificidades aplicáveis ao licenciamento ambiental mineiro. Considerando as disposições gerais constantes da legislação estadual, a Deliberação Normativa n° 74/2004 destacava especialmente há algum tempo a determinação de “critérios para classificação, segundo o porte e potencial poluidor, de empreendimentos e atividades modificadoras do meio ambiente passíveis de autorização ou de licenciamento ambiental no nível estadual”. Por meio da conjugação de informações específicas, a norma regia as atividades e empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental na esfera estadual. No entanto, a Deliberação Normativa n° 217/2017, publicada no Diário Oficial de Minas Gerais em 8 de dezembro de 2017, além de trazer inovações para o processo de licenciamento ambiental, ao estabelecer critérios para a definição das modalidades de licenciamento aplicáveis e a classificação dos empreendimentos e atividades que utilizam recursos ambientais no Estado de Minas Gerais, revoga na íntegra a Deliberação Normativa n° 74/2004 e mais 50 deliberações do Copam.
A nova deliberação normativa entrará em vigor somente 60 dias após a sua publicação na Imprensa Oficial, não apenas com normas aplicáveis aos novos licenciamentos, mas também com regras de transição e modificações propostas aos processos existentes.
Entre as novidades trazidas pela deliberação normativa, destacam-se as três modalidades de licenciamento ambiental possíveis: (i) Licenciamento Ambiental Trifásico (LAT), em que a Licença Prévia (LP), a Licença de Instalação (LI) e a Licença de Operação (LO) são concedidas em etapas sucessivas; (ii) Licenciamento Ambiental Concomitante (LAC), em que serão analisadas as mesmas etapas previstas no LAT, mas com a possibilidade de expedição concomitante de duas ou mais licenças, como já previa a Lei Estadual n° 21.972/2016; e (iii) Licenciamento Ambiental Simplificado (LAS), similar à antiga Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF) e realizado em etapa única, por meio do cadastro eletrônico de informações relativas à atividade ou ao empreendimento no órgão competente, ou pela apresentação de Relatório Ambiental Simplificado (RAS).
Com a criação do LAS, a figura da AAF deixa de existir. A diferença entre os dois ritos recai, primordialmente, nas informações e nos documentos a serem apresentados pelo empreendedor para formalizar seu processo de licenciamento. Enquanto para a AAF o empreendedor precisava realizar cadastro, acompanhado de Termo de Responsabilidade e da respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), a LAS requer o preenchimento de cadastro eletrônico de informações ou a apresentação de RAS.
Além disso, a nova Deliberação Normativa regulamenta o processo de licenciamento corretivo, aplicável aos casos em que a instalação e/ou operação de empreendimentos e atividades, inclusive na hipótese de ampliação, tenham sido iniciadas sem prévio licenciamento.
Neste contexto, por força da Deliberação Normativa n° 217/2017, a determinação do rito de licenciamento a ser seguido leva em conta características específicas da atividade ou do empreendimento, estabelecidas nas listagens trazidas na norma, além de critérios locacionais de enquadramento e fatores de restrição e vedação. Passam a ser consideradas questões como a localização em certas categorias de unidades de conservação, em áreas com alto grau de incidência de cavidades ou em áreas de corredor ecológico formalmente instituído.
Os fatores de restrição ou vedação, por sua vez, são situações já positivadas na legislação em vigor que, em razão da necessidade de maior controle e/ou da possível ocorrência de danos ambientais, serão observadas mais atentamente no curso do processo de licenciamento. Entre elas, destacam-se as restrições/vedações aplicáveis à intervenção em áreas de preservação permanente, de segurança aeroportuária, inseridas no bioma Mata Atlântica, dotadas de rios de preservação permanente, terras indígenas e quilombolas.
A Deliberação Normativa n° 217/2017 inova, ainda, ao vedar expressamente a fragmentação do licenciamento ambiental, sob pena de aplicação das sanções cabíveis (artigo 11). Apesar de órgãos públicos já questionarem a prática por entenderem que ela causa prejuízos à análise dos impactos ambientais, até então tais questionamentos se embasavam em uma construção interpretativa da legislação ambiental e não em normas expressas e específicas sobre o assunto. Na prática, a vedação expressa poderá coibir a cisão de empreendimentos em fases ou etapas, utilizada como estratégia para a dispensa de Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impactos ao Meio Ambiente (EIA/RIMA), e até mesmo na tentativa de acelerar a emissão de licenças.
Por fim, de acordo com as normas de transição da Deliberação Normativa n° 217/2017: (i) serão declarados extintos e arquivados os processos de licenciamento das atividades que passam a ser isentas; (ii) serão revogadas as licenças e AAFs emitidas para atividades que passem a ser isentas do licenciamento ambiental; e (iii) as AAFs emitidas serão convertidas em Licença Ambiental Simplificada, desde que apresentada toda a documentação exigida pelo órgão licenciador. Note-se, porém, que a nova deliberação normativa autoriza a emissão de AAF até que o instituto do LAS seja devidamente implementado.
As novas caracterizações de porte e potencial poluidor, bem como os critérios de localização e os fatores de restrição ou vedação, serão consideradas para os processos de licenciamento em que a licença (corretiva ou não) e a AAF ainda não tenham sido emitidas pelo órgão competente. Para as atividades licenciadas até a entrada em vigor da nova deliberação normativa, as novas classificações terão efeitos somente quando da renovação das licenças, cabendo ao órgão licenciador realizar as adequações pertinentes.
Vale citar ainda que, apesar de trazer mais especificações, a Deliberação Normativa nº 217/2017 apresenta determinadas previsões que visam manter ou mesmo ampliar a discricionariedade do órgão ambiental no âmbito do processo de licenciamento, em linha com o que vem sendo proposto no Projeto de Lei (PL) nº 3.729/2004, debatido em âmbito federal e comumente conhecido como projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Exemplo disso são os dispositivos da Deliberação Normativa nº 217/2017 que tratam da possibilidade de o órgão ambiental, justificadamente, (i) determinar que o licenciamento seja realizado em quaisquer das modalidades previstas, independentemente do enquadramento preliminar da atividade (artigo 8º, §5º); e (ii) solicitar outros estudos que julgar necessários, além dos previstos na norma, para a correta identificação dos impactos ambientais (artigo 17, § 6º).
Por outro lado, a deliberação inova ao trazer uma previsão bastante importante e benéfica para o empreendedor. O artigo 29 reforça o direito constitucional ao contraditório e prevê a possibilidade de o interessado requerer a exclusão ou a alteração de determinada condicionante estabelecida no processo de licenciamento ambiental, desde que apresente fato superveniente ou justificativa técnica que demonstre a razão pela qual o seu cumprimento total ou parcial seria impossível.
Diante de tais inovações, percebe-se que a Deliberação Normativa nº 217/2017 não apenas ganha um papel de protagonismo no cenário jurídico-ambiental mineiro, como também reflete uma nova tendência em nível nacional. A institucionalização de licenciamentos concomitantes e simplificados por cadastro eletrônico, a expressa menção à possibilidade de contraditório em relação a condicionantes e o endurecimento em relação à fragmentação de licenciamentos ambientais podem ser apontados como mudanças relevantes. Elas revelam a consolidação de algumas práticas que já vinham sendo adotadas sem um arcabouço legal que lhes conferisse segurança jurídica, bem como alguns anseios dos administrados e do Poder Público por um licenciamento ambiental mais célere e justo.