Laura Ignacio

Advogados de multinacionais já estudam os novos argumentos da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul) sobre a tributação de remessas para pagamento de serviços prestados por empresa no exterior. Segundo tributaristas, se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a favor das companhias for revertida, o resultado poderá ser o afastamento de investimentos estrangeiros do país.

′′Caso o governo estrangeiro entenda que o serviço prestado não é técnico, vai cobrar o imposto cheio - que em geral pode chegar a 20% -pelo rendimento da empresa no exterior, ocorrendo a dupla tributação, que totalizaria 35% de imposto′′, afirma Luiz Felipe Centeno Ferraz, do Mattos Filho Advogados. Segundo o tributarista, se isso ocorrer, essas empresas deverão aumentar o preço do serviço direto na fatura ou incluir o valor do imposto no preço (gross up).

A nova tese da Fazenda Nacional é baseada nos protocolos dos tratados. Para Maurício Chapinoti, sócio de Tozzini Freire, a interpretação da PGFN é forçada. ′′Como o protocolo é parte do tratado já analisado pelo STJ, julgar agora o protocolo seria reabrir uma discussão de mérito transitada e julgada. É como se a PGFN falasse que o STJ não analisou todo tratado.′′

Segundo Chapinotti, desde a primeira decisão do STJ muitas multinacionais adiam o pagamento pelo serviço. Para fazer a remessa ao exterior, a companhia deve apresentar ao banco: o comprovante (Darf) do imposto quitado, decisão judicial de mérito dizendo que não é necessário recolher o Imposto de Renda ou carta de conforto responsabilizando-se pela carga tributária.

Para os advogados, se não houver transferência de tecnologia, não há royalties. ′′A nova tese da PGFN quer atribuir ao protocolo uma força maior do que ele tem, contrariando a boa aplicação do tratado internacional, que deve ser interpretado à luz do conceito de royalties da OCDE′′, afirma Fernando Tonanni, sócio da área tributária do Machado Meyer. ′′Além do mais, de acordo com a Lei nº 9.279, de 1996, que regula a propriedade industrial no país, só são passíveis de registro os contratos que envolvem transferência de know-how.′′

Tonanni sugere cuidados na pactuação de contratos. ′′Para evitar que o Fisco caracterize essas remessas como royalties orientamos deixar claro que não há transferência de tecnologia, só mera prestação de serviço, e a dispensa de averbação do contrato junto ao INPI′′, diz.

Mesmo se a nova tese da PGFN emplacar, valerá a pena discutir o assunto no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e Judiciário, segundo tributaristas. ′′Porque a maior parte dos serviços em discussão não enseja nenhuma transferência de tecnologia e continua a se encaixar no artigo 7º dos tratados [sobre o que entra ou não no conceito de lucro], impedindo a tributação no Brasil′′, afirma Tércio Chiavassa, do Pinheiro Neto Advogados.

Para Chiavassa e os advogados Jorge N. F. Lopes Jr. e Diego Caldas R. de Simone, da mesma banca, além de afastar investidores privados que contam com o respeito aos tratados internacionais de seus países, a nova tese desgasta a imagem do Brasil no exterior. ′′Não é demais lembrar que certos países, como a Finlândia, já ameaçaram denunciar o tratado com o Brasil pela específica razão de o país não respeitar o entendimento predominante no cenário internacional.′′

(Valor Econômico - 05.08.2016)

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