Roberta Danelon Leonhardt e Carolina de Almeida Castelo Branco do Escritório Machado Meyer Sendacz Opice. Com os recentes enfrentamentos públicos de comunidades indígenas que habitam áreas onde hoje se instalam grandes projetos de infraestrutura, a questão indígena ganha, dia a dia, mais notoriedade no Brasil. Assim, merece destaque o conceito do Free, Prior and Informed Consent (FPIC), ou Consentimento Livre, Prévio e Informado, reconhecido na legislação internacional, bem como por órgãos intergovernamentais, convenções e normas internacionais de direitos humanos. Dentre elas, destacam-se a Convenção da Organização Internacional do Trabalho, recepcionada pelo Brasil por meio do Decreto Federal nº 5.051/2004, e a Declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela Assembléia Geral da ONU. Em linhas gerais, o FPIC é o princípio que garante a uma comunidade afetada ou tradicional (comunidades locais situadas na área de influência do projeto) o direito de dar, ou não, o seu consentimento a projetos que possam afetar suas terras, entendidas como aquelas que habitualmente ocupam ou utilizam. No que diz respeito ao sistema legal brasileiro, a Constituição Federal reconhece aos índios: sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, bem como os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Considerando os diversos conflitos amplamente divulgados sobre a questão indígena no licenciamento de obras de grande porte, foi publicada, em janeiro de 2012, a Instrução Normativa nº 01/2012, que estabelece normas sobre a participação da Fundação Nacional do Índio (Funai) no processo de licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades potencial e efetivamente causadoras de impactos ambientais e socioculturais que afetem terras e povos indígenas. Ademais, está sendo discutida de maneira prioritária a edição da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas. O documento, que pretende garantir a proteção e promoção dos direitos dos índios, que incluem a posse permanente dos seus territórios e o usufruto exclusivo de suas riquezas naturais, assim como a sua cultura e bem estar, está na Casa Civil desde o final de 2011 e deve ser publicado na forma de um decreto. Em paralelo, nos últimos anos, vem sendo conferida extrema importância aos Princípios do Equador (PE), que podem ser entendidos como um conjunto de critérios mínimos para se determinar, calcular e administrar os riscos socioambientais em relação à concessão de crédito para um determinado projeto. Os PE têm por objetivo servir como padrões voluntários e requisitos comuns à implementação, por cada instituição financeira, de suas políticas internas relativas à área socioambiental e de seus procedimentos e regras relacionados às suas atividades voltadas ao financiamento de projetos. Formulados em 2002 e revistos em 2006, têm como base as diretrizes básicas adotadas pelo International Finance Corporation (IFC), braço financeiro do Banco Mundial para operações dessa natureza. Nessa conjuntura, está sendo discutida a inclusão do FPIC, a partir de 30 de junho de 2012, como um de seus padrões voluntários para projetos de alto potencial poluidor. A inserção do FPIC nos PE é polêmica, considerando que, no Brasil, o seu conceito não é recepcionado por nossa legislação tal como entendido nas regras internacionais. Apesar da existência de arcabouço legal sólido para a defesa dos indígenas, o consentimento para a instalação de um determinado projeto não é dado diretamente pelas comunidades afetadas. O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas, devem ser autorizados previamente pelo Congresso Nacional, ouvidos os indígenas. Caso o projeto não esteja inserido em terras indígenas, mas, ainda assim, seus impactos afetem essas áreas, a Funai deverá manifestar-se durante o licenciamento ambiental. Contudo, diferentemente do FPIC, a manifestação não vincula a decisão do órgão ambiental. Esse cenário, portanto, deve gerar obstáculos para as instituições financeiras brasileiras, que enfrentarão, certamente, dificuldades para alcançarem a nota máxima atrelada a esse potencial novo padrão dos PE. (Jornal do Commercio 13.06.2012)(Notícia na Íntegra)