estuda uma nova estatal petrolífera, para controlar e angariar os recursos e o petróleo dos megacampos do pré-sal, divide especialistas no setor e autoridades federais. As maiores resistências vêm de parcela do setor privado, que desconfia da mudança de regras e da volta de um excessivo peso do Estado no segmento. Integrantes do próprio governo também temem o enfraquecimento da Petrobras. Em outro flanco, os defensores da idéia consideram que só uma empresa 100% pública poderá garantir a toda a população os dividendos da exploração na nova área.
O que os une é a ansiedade diante da política a ser adotada pelo governo. A resposta está a cargo da Empresa de Planejamento Energético (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia, que apresentará nas próximas semanas estudos para balizar as decisões do governo.
Segundo o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, serão analisados critérios como ritmo de produção, receita das empresas, risco da exploração e até a destinação final dos recursos para a sociedade. Eles vão indicar o modelo de produção a ser adotado.
— O debate começou pela porta lateral, pois não é a criação de uma estatal preponderante. O importante é ter uma visão de longo prazo e saber o que vai se fazer com esse petróleo — alerta Tolmasquim.
Existem três modelos no mundo, com variações. O de concessões, adotado atualmente no Brasil, permite que empresas tenham direito a toda a produção dos campos, mediante o pagamento de royalties ao governo. Ele está associado ao maior risco de não se achar petróleo nos campos licitados.
O segundo, chamado de “partilha de produção”, implica na contratação de empresas pelo governo para exploração, mediante pagamento em óleo ou dinheiro. A maior parte da produção fica com o Estado e, por isso, ele é adotado por países onde a exploração é considerada menos arriscada. Os contratos de serviço são parecidos, mas envolvem cláusulas prefixadas e a produção costuma ser depois repassada a uma estatal.
Na visão dos especialistas, a criação da nova estatal seria uma conseqüência natural no caso de adoção da “partilha de produção”. Este é o modelo que mais apetece o Palácio do Planalto, pois o risco de exploração no pré-sal é considerado baixo e a rentabilidade, muito alta.
Segundo o professor de planejamento energético da Coppe/UFRJ Alexandre Szklo, esta estatal, já proposta pelo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, funcionaria como uma espécie de “Banco Central do Petróleo”, definindo quando, onde e quanto seria a produção. Segue o modelo da Petoro, estatal norueguesa com 60 funcionários, mas produtora de 1,4 milhão de barris/dia — a Petrobras produz 1,9 milhão de barris/dia.
Ao defender uma nova estatal, Lobão argumenta que a produção do pré-sal tem de favorecer a população e não só aos acionistas da Petrobras. O advogado Luiz Antonio Lemos, sócio do TozziniFreire Advogados, lembra que, apesar de ser controlada pelo governo, a Petrobras ficaria impedida de assumir este papel, pois dois terços do seu capital estão pulverizados no mercado de capitais.
— Isso poderia ser caracterizado como desrespeito aos princípios constitucionais de igualdade e isonomia.
Outros analistas acreditam que a criação de uma nova estatal significa um retrocesso do modelo brasileiro, adotado desde 1997 e que atraiu o capital privado para o país. O Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), que reúne as grandes empresas do setor, defende a manutenção da lei atual, aumentando a parcela de recursos destinada ao governo.
— A lei em vigor tem flexibilidade para acomodar os volumes do pré-sal, os ganhos adicionais em função do aumento do preço do petróleo e também a percepção de menor risco exploratório — diz Ivan Simões Filho, diretor do IBP.
José Virgílio Lopes Enei, sócio do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, alerta para o aumento da politização de uma área que deve ser técnica:
— O risco são disputas partidárias pela empresa, corrupção, impasses e conflitos de interesse com a Petrobras.
Após divulgada a idéia de Lobão, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, reagiu, dizendo que ela não é adequada aos interesses da empresa. Com a polêmica, o governo determinou a lei do silêncio.
Na defesa da estatal, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) afirmou logo que o modelo do pré-sal deve passar pela Petrobras. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, fez questão de dizer que a estatal participará das discussões.
Mas as seqüelas apareceram. Felipe Cunha, analista de petróleo da Brascan, lembra que a possibilidade de a Petrobras deixar de ter acesso às reservas do pré-sal já teve reflexos no valor de mercado da empresa. Segundo ele, em julho, o valor das ações da estatal caiu 12% — mais do que a Bovespa, que teve uma queda de 7%:
— Isso ocorreu num momento em que o preço do barril subiu. O discurso do ministério criou uma mensagem ruim ao mercado em relação à empresa.
Texto de Gustavo Paul