Valmar
Hupsel Filho e Fábio Brandt | Brasília
Especialistas
ouvidos pelo Estado comemoraram ontem a publicação do decreto que sancionou a
Lei Anticorrupção por estabelecer critérios mais específicos em tópicos
presentes na legislação, como a aplicação das multas impostas a empresas
condenadas e diretrizes para a adoção do "programa de integridade".
Mas criticaram a impossibilidade de recurso em caso de condenação e a falta de
clareza no trecho que restringe à Controladoria Geral da União a competência
para celebrar acordos de leniência sem a participação de outros órgãos, como
Ministério Público e Polícia Federal.
Para o
ex-juiz federal Luciano Godoy, professor de direito da FGV, o texto estabelece
que o próprio órgão que determinou a punição pode ser acionado para
reconsiderar a decisão. "Isso é estranho, geralmente teria que ter um
órgão acima para julgar o recurso". No caso de multas aplicadas por órgãos
internos da CGU, afirma Godoy, deveria ser possível recorrer a uma instância
superior, que seria o próprio ministro. "Da forma como o decreto foi
escrito, ele afirma que esse tipos e recurso não existe."
O
consultor jurídico Gustavo Justino de Oliveira, professor de Direito
Administrativo da USP, considerou "confuso" o trecho do decreto que
restringe à CGU a competência para celebrar acordos de leniência. "A CGU
ficou como um órgão curinga porque pode avocar a competência dos órgãos",
disse.
Oliveira
também criticou a demora de quase 14 meses para a publicação do documento,
atribuída à "inação" do governo provocada por dificuldades políticas
e pelos desdobramentos da Operação Lava Jato. Entretanto, ele considera o
decreto uma "mudança de cultura na prevenção e combate à corrupção".
A lei
12.846, batizada de Anticorrupção, foi sancionada em 1.º de agosto de 2013 e
entrou em vigor 180 dias depois, em 24 de janeiro de 2014. O decreto de sanção
foi publicado no Diário Oficial de anteontem. "Não tenho condições de
informar porque demorou. Só lamento não ter entrado em vigor antes", disse
o ex-ministro da Controladoria-Geral da União, Jorge Hage, um dos responsáveis
pela elaboração do anteprojeto da lei.
Segundo
Hage, o Brasil foi cobrado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) pela demora. "Chegou a ser apontado como falha o atraso
em avaliação periódica da OCDE", disse. Ainda assim, o ex-ministro
considera que a sanção significa o cumprimento a um compromisso firmado pelo
País junto à Organização há mais de dez anos.
Critérios.
Para Adriana Dantas, sócia da área de Ética Corporativa da BM&A Associados,
o decreto estabelece critérios mais objetivos e oferece informações mais
precisas para a aplicação da lei. "Apresenta, por exemplo, a dosimetria
para aplicação das multas. Na lei era estabelecido apenas a pena mínima e
máxima."
Leonardo
Machado, sócio do escritório Machado,
Meyer, Sendacz e Opice Advogados na área de Compliance, avalia que o ponto
alto do documento é o trecho dedicado ao "programa de integridade"
que estabelece as normas e procedimentos que as empresas devem seguir para
evitar casos internos de corrupção.- O Estado de S. Paulo - 20.03.2015, p. A6