Por Caroline Marchi

A Justiça do Trabalho não é entusiasta da solução de conflitos extrajudicialmente. Os acordos realizados entre patrões e empregados não são executáveis na Justiça, mesmo com a assistência sindical, e, com isso, os processos se avolumam.

Fernando Henrique Cardoso tentou, em 2000, introduzir a Comissão de Conciliação Prévia como forma de previr conflitos judiciais e evitar o grande volume de processos que, por vezes, são resolvidos em primeira audiência ou, ainda, possuem valores muito baixos. Seria uma forma de antecipar a primeira audiência do processo trabalhista que possui forte viés conciliador, também por um forte incentivo dos juízes. Ora, se as partes irão se conciliar na primeira audiência por que não fazer antes?

Os sindicatos poderiam, de acordo com a nova lei, dentro de seus estabelecimentos ou, na empresa, instituir a Comissão e, caso fosse, a ela o empregado estaria obrigado a submeter a sua demanda.

A ideia vingou muito pouco. Logo, diversos processos suscitaram que a obrigação de submeter o conflito à Comissão de Conciliação Prévia era inconstitucional, o que somado às diversas comissões criadas fraudulentamente, sem qualquer propósito de defesa dos interesses do empregado, levou ao repúdio do Judiciário Trabalhista que, em sua maioria, acolheu a tese de inconstitucionalidade, seguido posteriormente pelo STF.

Sempre se defendeu que muitos dos direitos trabalhistas são irrenunciáveis e que, portanto, a realização do acordo extrajudicial, ainda que com a assistência sindical, não poderia ter a força pretendida pelas partes.

Mas não obstante a indisposição do Judiciário trabalhista às negociações individuais extrajudicialmente, a Constituição de 88, mesmo antes da sua grande reforma, em 2004, pensou que para os casos de negociação coletiva poderiam ser eleitos árbitros!

A antiga inovação, de quase 30 anos, é uma tentativa corajosa de introduzir a arbitragem no direito trabalhista brasileiro, enquanto que em outros ramos, mais adeptos às soluções extrajudiciais, ela ainda era embrionária.

Um ano após a promulgação da Constituição, a Lei 7.738, que trata sobre o direito de greve, também trouxe a possibilidade de solução do conflito coletivo por meio de árbitros. Mais adiante, em 2000, quando editada a Lei 10.101 de Participação nos Lucros e Resultados, o legislador também entendeu que a solução de eventual conflito sobre a matéria poderia ser solucionada por meio da eleição de árbitros.

A grande diferença dessas leis de cunho trabalhista e a postura do Judiciário em relação às ações individuais, está no fato de que a solução entre sindicatos e/ou entre estes e as empresas, resultado da negociação coletiva, não obstante encontre, de vez em quando, percalços no Judiciário, é bem acolhida, diferentemente da individual. As convenções e os acordos coletivos resultantes da negociação possuem força de norma e devem ser respeitados, conforme previsão constitucional.

Portanto, se a negociação é respeitada, nada mais coerente que se as partes desejarem eleger árbitros para a solução do conflito, que também haja o respeito do Judiciário.

Ocorre que, apesar da velha inovação, não se deparou até hoje com uma solução de conflito sindical que tenha sido feita pela eleição de árbitro, ou se houve não foi amplamente divulgada.

Ainda que, ao longo dos anos, cada vez mais, se tenha o consenso de que os conflitos coletivos devam se afastar da intervenção judicial – ao que a reforma constitucional de 2004 deu coro, com a introdução da necessidade do comum acordo e a limitação do Poder Normativo da Justiça do Trabalho –, os sindicatos ainda sentem a necessidade do manto do Judiciário.

O conforto de que a Justiça do Trabalho possui para os casos de direito coletivo a mesma visão protetora que tem com relação ao individual, apesar da constituição ter feito expressamente a diferenciação, ainda é o motivador para que os sindicatos judicializem seus conflitos e suas negociações.

Surpreende, entretanto, que ao sindicato pairem dúvidas quanto ao instituto da arbitragem, já que as partes podem definir quais as regras de direito, mesmo internacionais, os princípios e os costumes a serem aplicados ao processo arbitral.  Além disso, os princípios da equidade, com prevenção legal em caso de hipossuficiência, do contraditório, da motivação das decisões, da autonomia, da imparcialidade e da autonomia das vontades estão todos ali presentes na lei arbitral.

Mas a resistência a solução de conflitos pelas vias não judiciais, como explicado, não é de hoje. Corajosa foi a inserção pelo legislador da possibilidade de eleição de árbitros quando frustrada a negociação coletiva, mais ainda, ao mantê-la após a reforma de 2004, mesmo não tendo exemplos até então de que as partes dela se utilizariam.

Mas, mais bela é a atitude do legislador, verdadeiro estadista, pois se a reforma sindical vier, o medo vira coragem e os sindicatos mais fortalecidos poderão dar à sociedade o gostinho de ter uma solução de conflito de negociação coletiva via arbitragem.

(Jota-Br - 01.09.2016)

(Notícia na íntegra)