Por meio da Portaria 104/22, de março deste ano, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) atualizou o Guia para Análise Econômica da Prática de Preços Predatórios, publicado em 2002. O preço predatório – muitas vezes erroneamente chamado de dumping – é a conduta de vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo.
O Cade já investigou diversos casos sobre preço predatório sem, contudo, condenar qualquer empresa desde a entrada em vigor da Lei 8.884/94, que antecedeu a atual Lei de Defesa da Concorrência (Lei 12.529/11).
A investigação de preço predatório é tarefa extremamente complexa, pois a simples venda abaixo do preço de custo não constitui infração. De acordo com os precedentes do Cade, a condenação por preço predatório não ocorre apenas com a comprovação da redução de preços de custo por determinado período. É preciso comprovar que a empresa cobrava preços abaixo do custo variável médio, visando eliminar seus concorrentes para, posteriormente, aumentar esses preços. Com essa prática, a empresa poderia recuperar os prejuízos iniciais em um mercado muito menos competitivo e obter lucros semelhantes aos de um monopolista.
A portaria visa orientar a análise de casos e reduzir os custos de investigação da autarquia. De acordo com a norma, o Cade deve observar as seguintes etapas, sucessivamente:
- definição do mercado relevante;
- estrutura desse mercado e as condições de entrada;
- condições de oferta da empresa investigada e sua capacidade produtiva;
- capacidade de financiamento dessa empresa, própria ou via terceiros, para suportar os prejuízos de curto prazo; e
- comparação entre preço e custo.
Na última etapa, a mais complexa de todas, a portaria sugere que sejam analisados os custos de produção – custo médio total (custo total dividido pelo número de bens produzidos) e custo variável médio (custo variável total dividido pelo número de bens produzidos).
Quando o preço for igual ou superior ao custo médio total de produção, não há preço predatório. Se o preço estiver entre o custo médio total e o custo variável médio, a empresa fica sob suspeita de prática predatória. O Cade, nesse caso, analisa as condições de demanda e de oferta (por exemplo, se houve, repentinamente, contração da demanda na indústria ou excessos de capacidade) que poderiam justificar a prática e afastar a ilicitude. Analisadas todas as etapas, caso se identifique que o preço é inferior ao custo variável médio, o Cade entende que se configura preço predatório.
Na prática, não se espera que as orientações da nova portaria promovam necessariamente condenações por preços predatórios, pois a análise do custo variável médio é de difícil aplicação. No Brasil e no exterior, já se discute até mesmo o uso de outras metodologias para identificar a existência desse tipo de ilícito, como a análise de pré-condições estruturais que possam sugerir uma conduta predatória racional e o uso de conceitos da Teoria dos Jogos, com análise de informações assimétricas como fator central para discussão da racionalidade econômica.