Os veículos elétricos de pouso e decolagem vertical (eVTOLs) representam uma revolução no campo da aviação e da mobilidade urbana contemporânea.

A promessa do eVTOL está em sua capacidade de oferecer uma alternativa rápida, eficiente e sustentável para o transporte terrestre congestionado. Em tese, essa opção seria também mais econômica do que o deslocamento por helicópteros convencionais.

Espera-se que esses veículos substituam grande parte dos transportes convencionais, incluindo carros, ônibus e helicópteros, especialmente em áreas urbanas densamente povoadas.

Inicialmente concebidos para atender às demandas comerciais e de lazer, os eVTOLs podem oferecer serviços de transporte flexíveis, desde pequenos deslocamentos dentro da cidade até viagens interurbanas. Uma solução inovadora e versátil para as necessidades de mobilidade em constante evolução das comunidades urbanas.

Os eVTOLs surgem também como uma promissora solução para os desafios da sustentabilidade na aviação. Ao adotar tecnologias avançadas, esses veículos são capazes de reduzir muito as emissões de carbono e os impactos ambientais associados ao transporte aéreo.

Comparados com aviões e helicópteros, que usam combustíveis fósseis, os eVTOLs são uma opção mais limpa, pois não emitem poluentes durante o voo.

Além disso, a natureza silenciosa e eficiente dessas aeronaves elétricas minimiza a poluição sonora. Isso as torna ambientalmente mais amigáveis e aceitáveis em áreas urbanas densamente povoadas.

Com seu potencial de integrar fontes de energia renovável em suas operações, os eVTOLs assumem um papel importante na construção de um futuro mais sustentável e ecologicamente consciente na aviação e na mobilidade urbana.

Ausência de normas regulatórias específicas

Em relação à regulamentação dos eVTOLs no Brasil, não há normas específicas que abordem integralmente o tema.

Atualmente, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) adota uma abordagem individualizada para regular o segmento, evitando a imposição de uma norma geral. A certificação dos veículos apresentados para operação é feita com base nas características de cada caso.

Essa abordagem busca acompanhar o avanço tecnológico e garantir a segurança das operações durante o processo de certificação dos equipamentos. Não cria barreiras desnecessárias à entrada de novas empresas no setor.

Em relação à certificação dessas aeronaves, uma consulta pública encerrada em março abordou os critérios de aeronavegabilidade e segurança para a operação da EVE-100, desenvolvida pela EVE Soluções de Mobilidade Aérea Urbana Ltda.

A iniciativa teve por objetivo estabelecer parâmetros de certificação aplicáveis não apenas à aeronave mencionada, mas também a futuros projetos de eVTOL. Além disso, permitiria a validação da certificação de eVTOLs estrangeiros.

As autoridades brasileiras, por meio da Anac, estão se empenhando em desenvolver um arcabouço regulatório adaptado às necessidades desse segmento emergente da aviação. O esforço está em estágio inicial, mas já é perceptível.

O Brasil não está sozinho ao lidar com questões regulatórias, mas outras jurisdições estão em estágios ligeiramente mais avançados nesse aspecto.

Europa é pioneira na regulamentação

A Agência de Segurança da Aviação da União Europeia (Easa) estabeleceu, em junho de 2022, as primeiras normas do mundo para a operação de aeronaves eVTOL em ambientes urbanos.

Esse novo marco regulatório foi submetido à consulta pública e abrange aspectos técnicos relacionados à aeronavegabilidade, operações aéreas, licenciamento de tripulação de voo e regras do espaço aéreo.

Já nos Estados Unidos, a Administração Federal de Aviação (FAA) determinou, no primeiro semestre de 2022, que os eVTOLs de asa rotativa sejam certificados por meio da categoria especial de aeronaves de “elevação motorizada”. No entanto, projetos de aeronaves com características mais específicas podem demandar certificações adicionais, que ainda estão em fase de discussão.

Embora a tecnologia seja promissora, os operadores e fabricantes de eVTOLs vão encarar inúmeros desafios regulatórios.

Como já mencionado, ainda não existe no Brasil um arcabouço regulatório específico que aborde integralmente esse tipo de operação. O processo de certificação deverá ser desenvolvido pela Anac de forma cautelosa, considerando sempre as características próprias do eVTOL – como bateria, propulsão elétrica e múltiplos rotores em mesmo plano.

Esses fatores devem ser estudados amplamente pela autoridade certificadora, para que se possa estabelecer um conjunto de critérios e requisitos a serem cumpridos pelas empresas que pretendam desenvolver e operar eVTOLs.

Outra questão a ser enfrentada é a dificuldade de organizar o espaço aéreo. Isso se deve à operação concomitante de eVTOLS, aeronaves convencionais, helicópteros e drones.

O Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) já manifestou a intenção de usar a operação de helicópteros como base para a integração dos eVTOLs. A organização indicou que um dos principais desafios será desenvolver a tecnologia necessária para regular as solicitações de acesso ao espaço aéreo feitas por operadores dos diferentes modelos de aeronaves. O crescimento no número de operações também exigirá um aumento do efetivo de controladores de tráfego aéreo.

Novas oportunidades de negócio e estruturas de financiamento

Apesar dos desafios técnicos e regulatórios, o surgimento de um novo tipo de transporte traz oportunidades para novos negócios e estruturas de financiamento. Isso vale tanto para equipamentos quanto para a infraestrutura necessária à operação deles.

Com relação aos equipamentos, estruturas semelhantes àquelas utilizadas para o arrendamento e financiamento de aeronaves em geral poderão ser replicadas. Isso inclui financiamentos incentivados por programas de agências de fomento à exportação, além de estruturas de leasing e de financiamento de ativos em geral.

Um exemplo é a notícia de que a companhia aérea GOL, de olho nesse novo mercado, já realizou uma encomenda em parceria com uma conhecida empresa de arrendamento de aeronaves.

A operação das aeronaves eVTOL demandará também uma infraestrutura específica, tanto em relação aos vertiportos quanto aos locais de carregamento das aeronaves. A implementação e manutenção dessas estruturas também envolverão discussões sobre financiamento específico de projetos.

Uma possível solução para potenciais operadores dos vertiportos é buscar debêntures de infraestrutura. Esse instrumento financeiro pode ajudar a financiar investimentos em projetos de infraestrutura aeroportuária e de transporte aéreo, segundo as normas e leis aplicáveis.

As debêntures de infraestrutura são reguladas pela Lei 14.801/24, que estabelece uma série de incentivos para a emissão e investimento nesses papéis – principalmente em relação ao tratamento tributário.

A Lei 14.801/24 dispensa a aprovação ministerial prévia para os projetos desenvolvidos nos setores prioritários de infraestrutura. Esses setores estão listados no Decreto 11.964/24, que regulamenta os critérios e as condições para enquadrar e acompanhar projetos de investimento prioritários na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação.

Em seu artigo 4º, o decreto estabelece quais projetos são considerados prioritários na área de infraestrutura. Destacam-se os aeródromos e projetos do setor de mobilidade urbana:

“Art. 4º Na área de infraestrutura, os projetos prioritários pertencerão a um dos seguintes setores prioritários:

e) aeródromos e instalações aeroportuárias de apoio, exceto aeródromos privados de uso privativo;

II – mobilidade urbana, incluídos exclusivamente:

a) infraestruturas de transporte público coletivo urbano ou de caráter urbano;

b) aquisição de veículos coletivos associados às infraestruturas a que se refere a alínea “a”, como trens, barcas, aeromóveis e teleféricos, exceto ônibus que não se enquadrem no disposto na alínea “c”; e”

Além disso, de acordo com o artigo 5º do mesmo decreto, para que um projeto de infraestrutura seja enquadrado como prioritário ele deve atender, simultaneamente, a dois requisitos:

  • ser objeto de instrumento de concessão, permissão, autorização, arrendamento ou, na hipótese de projeto de saneamento básico, do contrato de programa; e
  • envolver ações de implantação, ampliação, recuperação, adequação ou modernização.

Outra novidade proposta pela Lei 14.801/24 é a permissão para que residentes ou domiciliados no exterior adquiram debêntures de infraestrutura, desde que haja uma autorização do Ministério da Fazenda. Essa aquisição deve ocorrer em conexão com a emissão e a colocação no exterior de títulos relacionados a essas debêntures.

Estamos diante de um produto inovador que demandará a aquisição de equipamentos, a implementação de novas regulamentações, o desenvolvimento de infraestruturas específicas e a busca por soluções inovadoras para viabilizar sua operação. Ao mesmo tempo, essas inovações representam oportunidades de investimento, tanto em equipamentos quanto em suas estruturas.

Trata-se de um cenário que requer uma análise cuidadosa das questões contratuais, regulatórias e de financiamento envolvidas, para garantir a segurança jurídica e a viabilidade dos investimentos.