A Lei 14.514/22, publicada em 29 de dezembro de 2022, trouxe duas alterações relevantes ao setor minerário: a possibilidade de constituição de ônus sobre alvarás de pesquisa e um novo conjunto de normas aplicáveis à pesquisa, lavra e comercialização de substâncias, minérios e minerais nucleares.
A nova lei, cujo foco foi alterar as regras sobre a estatal Indústrias Nucleares do Brasil S.A. (INB) e a exploração de minerais e minérios nucleares, também alterou outras regras do setor de mineração.
Entre elas, destaca-se a inclusão do artigo 92-A ao Decreto-Lei 227/67 (o Código de Mineração). O novo artigo estabelece expressamente a possibilidade de oneração e oferta em garantia de alvarás de autorizações de pesquisa, concessões de lavra, licenciamento mineral, permissão de lavra garimpeira e o direito persistente após a vigência da autorização de pesquisa e antes da outorga da concessão de lavra.
A oferta de direitos minerários em garantia, tema de grande importância para o setor, foi disciplinada pela Agência Nacional de Mineração (ANM) por meio da Resolução ANM 90/21, após um longo período em que o tema foi regulado apenas pelo Parecer JT-05. Esse parecer, vinculante a toda a Administração Federal por força de sua aprovação presidencial, abordava apenas a possibilidade de constituição de penhor e concluía que a oneração seria aplicada somente às concessões de lavra.
Como tratado em artigo anterior, a publicação da Resolução ANM 90/21 trouxe novas possibilidades e definiu a mecânica para a constituição de ônus sobre direitos minerários como garantia para a captação de recursos por seus titulares, ainda sem abordar expressamente a possibilidade de oneração de alvarás de autorização de pesquisa ou de licenças minerárias.
Com a inclusão do novo artigo 92-A no Código de Mineração, espera-se que a ANM publique regulamentação complementar a fim de recepcionar a novidade trazida pela alteração legislativa, que agrega segurança jurídica a operações de financiamento à indústria de mineração e atende a um pleito antigo dos agentes do setor.
Alterações também afetam o setor de minérios nucleares
Conforme os termos do art. 1o da Lei 4.118/62, a União tem o monopólio sobre a pesquisa, lavra, enriquecimento, reprocessamento, industrialização e o comércio de minerais e minérios nucleares e seus derivados, elementos nucleares e seus compostos, materiais físseis e férteis, substâncias radioativas e subprodutos nucleares.
No Brasil, reservas minerais pertencem à União e somente podem ser exploradas por entidades privadas por meio de concessões, licenças ou pela antiga figura jurídica da mina manifestada, extinta com a separação da propriedade do solo da do subsolo a partir da Constituição Federal de 1934, mas que permanece em nosso ordenamento em observância ao princípio do direito adquirido.
A nova Lei 14.514/22, em conjunto com a Lei 14.222/21, determina que, se o titular de um direito que permita a exploração de reservas minerais identificar a ocorrência de elementos nucleares (como, por exemplo, urânio, tório, plutônio e outros determinados pela autoridade competente), ele deverá notificar o fato à ANM, à nova Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN) e à INB, nos termos do artigo 4º da Lei 6.189/74.
A INB, por sua vez, avaliará a viabilidade técnica e econômica dos recursos do mineral nuclear e determinará como ele será explorado, conforme os critérios resumidos abaixo.
- Caso o potencial econômico dos elementos nucleares encontrados na reserva seja superior ao das demais substâncias pesquisadas ou lavradas na mesma jazida, o aproveitamento dos recursos da jazida somente poderá ser realizado mediante associação entre a INB e a empresa detentora da concessão (relação sujeita ao controle dos benefícios pela INB) ou mediante expropriação dos direitos minerários pela INB (sujeito a indenização prévia ao titular do direito minerário).
- Caso o potencial econômico dos elementos nucleares encontrados na reserva seja inferior ao das demais substâncias pesquisadas ou lavradas na mesma jazida, o direito minerário será mantido com o titular original.
Nesse caso, se o aproveitamento do elemento nuclear for considerado técnica e economicamente viável, as partes deverão determinar uma maneira de entregar esse elemento nuclear incluído no minério extraído à INB de acordo com regra a ser estabelecida em regulamento futuro.
Já se os benefícios dos elementos nucleares encontrados forem considerados técnica e economicamente inviáveis, o titular do direito minerário deve descartá-los conforme as leis ambientais aplicáveis.
A nova legislação, portanto, não deixa clara a possibilidade de uma entidade privada poder livre e individualmente (sem a participação da INB na cadeia de produção ou comercialização) explorar e comercializar minerários nucleares.
Há, entretanto, uma sinalização de que a INB poderá celebrar contratos com pessoas jurídicas privadas e remunerá-las por meio do direito de comercializar minérios associados a minérios ou minerais nucleares, além do direito de compra do produto de lavra com exportação previamente autorizada (de forma ainda a ser definida em regulamento futuro), além de outras formas estabelecidas em contrato entre a INB e a entidade privada.
Essa possibilidade é uma inovação legislativa, que deverá ser mais bem esclarecida por meio de regulamentação futura e de uma prática de mercado a ser desenvolvida.
Também não há clareza sobre o tipo de arranjo que pode ou deve ser estabelecido entre os titulares de direitos minerários e a INB para a produção e a comercialização.
Considerando que futuras leis deverão regulamentar a forma como a INB passará a receber elementos intrínsecos aos minérios extraídos das entidades privadas, possivelmente novas normas sobre o assunto serão criadas para que a estatal possa negociar certos arranjos com entidades privadas, a fim de permitir maior participação na produção e comercialização de minérios nucleares.
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