O Supremo Tribunal Federal (STF) votou, por unanimidade, em 12 de abril, pela devolução do Recurso Extraordinário 1.476.596 ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). O objetivo é que o recurso seja julgado considerando a tese fixada no Tema 1.046, de relatoria do ministro Gilmar Mendes. Pela tese, passou-se a prever a constitucionalidade dos “acordos e convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas”.

O caso que originou o recurso extraordinário refere-se a uma reclamação trabalhista movida contra uma empresa automotiva por um operador de processo. O reclamante afirma ter trabalhado em turnos ininterruptos de revezamento, com jornadas que se estendiam das 6h às 15h48 e das 15h48 à 1h09, de segunda a sexta-feira. Também alega ter realizado habitualmente horas extras e trabalhado aos sábados. A carga extrapolava, assim, as 44 horas semanais, o que levou o reclamante a pleitear o pagamento de horas extras.

O juiz de primeira instância, ao analisar o pedido, entendeu que as normas coletivas celebradas que previam o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento em número maior que o limite de oito horas diárias eram nulas. Para isso, considerou, principalmente, a previsão contida na Súmula 38 do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.

Submetido o recurso ordinário ao Tribunal Regional do Trabalho da 3.ª Região (TRT3), manteve-se o entendimento da sentença, para reafirmar “que, apesar da possibilidade de flexibilização, por norma coletiva, da jornada de trabalho dos empregados sujeitos a turnos de revezamento, nos termos do art. 7º, inciso XIV, da CF/88, no caso dos autos, não há como reconhecer a validade dos referidos instrumentos normativos, pois os turnos laborados extrapolavam o limite máximo diário de 08 horas, inclusive com trabalho aos sábados. Nesse sentido, é o entendimento consubstanciado na Súmula 423 do C. TST”.

Apesar de a empresa ter recorrido ao TST, seu recurso não foi provido pela turma, que entendeu tratar-se de interpretação da própria norma. Para o TST, não se estava declarando a nulidade da norma coletiva, mas sim que ocorreu sua descaracterização pelo trabalho habitual com prestação de horas extras aos sábados. Com isso não caberia enquadrar o caso no Tema 1.046.

Contra esse acórdão do TST, a empresa interpôs o recurso extraordinário, afirmando que a matéria discutida se enquadra na tese de repercussão geral do STF. De acordo com a empresa, o caso envolve a discussão sobre o negociado coletivamente em relação ao legislado, sem prejuízo aos trabalhadores, já que se presume que o sindicato pactuou com jornada mais favorável e preferível.

O recurso destacou ainda a ofensa literal e direta aos artigos 5º, XXXVI, 7º, XXII, XIV e XXVI, da Constituição Federal, devido à interpretação que limita os efeitos de cláusula convencional em vigor para a categoria profissional do trabalhador.

A vice-presidência do TST, responsável pelo juízo de admissibilidade inicial, admitiu o recurso extraordinário e o remeteu ao STF, como representativo da controvérsia. Considerou, portanto, que a questão jurídica discutida é idêntica e repetitiva e que o caso poderia servir como paradigma para a definição de uma tese de repercussão geral, a ser aplicada por todas as instâncias.

O STF, por unanimidade, entendeu que o tribunal de origem, apesar de fundamentar que o caso trata do descumprimento de norma coletiva sobre turnos ininterruptos de revezamento, acabou por invalidar a norma coletiva e afastar a aplicação do Tema 1.046.

Isso porque, o em seu voto no Tema 1.046, o ministro relator Gilmar Mendes registrou que, diante da jurisprudência do próprio TST e do STF, é possível dispor, em acordo ou convenção coletiva, ainda que de forma contrária à lei, sobre aspectos relacionados à jornada (abarcando, nesse ponto, os turnos ininterruptos de revezamento).

Com a recente decisão do STF, o Recurso Extraordinário 1.476.596 retornará para ser julgado no TST, que deverá considerar a tese firmada no Tema 1.046.

O precedente é importantíssimo para as empresas, sobretudo porque o STF definiu que o julgamento do Tema 1.046 é amplo e que a decisão do TST declarou “a nulidade de turnos ininterruptos de revezamento estabelecidos em acordo coletivo de trabalho”.

Segundo o STF “não se tratou, portanto, de exame de inadimplemento de cláusula, mas de anulação da negociação coletiva por suposta prevalência do legislado sobre o acordado”.