Antes vistos com muito mais frequência em companhias abertas e startups, os planos de opção de compra de ações (stock option plans ou SOPs) têm sido muito menos utilizados nos últimos anos.

O motivo? Falta de segurança jurídica.

A última década foi marcada por diversos embates entre contribuintes e autoridades fiscais, que têm autuado companhias de forma reiterada, para atribuir natureza jurídica remuneratória aos ganhos obtidos por participantes de planos de opção de compra de ações.

As autuações são direcionadas tanto às companhias – para a cobrança de contribuições previdenciárias e/ou IRRF, acrescidos de multa e juros – como aos executivos beneficiários – para a cobrança de IRPF supostamente devido em razão das opções.

Na esfera administrativa, a maioria das decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) são desfavoráveis às companhias. De acordo com o Carf, a existência dos elementos de “risco” e “onerosidade” é essencial para afastar a natureza remuneratória das opções. Essa interpretação, porém, tem sido restringida de forma sistemática, a ponto de se entender que os ganhos obtidos por participantes têm natureza remuneratória pelo simples fato de as opções terem sido dadas de forma gratuita.

Na esfera trabalhista, por outro lado, o panorama é bastante favorável às companhias.

A jurisprudência trabalhista, tanto dos tribunais regionais do Trabalho quanto do Tribunal Superior do Trabalho, em todas as suas turmas, evoluiu no sentido de que os ganhos auferidos por empregados em decorrência de sua participação em planos não têm natureza jurídica salarial. Dessa forma, não estão sujeitos a encargos e reflexos trabalhistas, como FGTS, reflexos em 13º salário, férias mais um terço etc.

As decisões da Justiça do Trabalho afastam a natureza jurídica remuneratória. Isso ocorre porque, ainda que a outorga das opções decorra da relação de emprego, há risco para o empregado (que pode auferir lucro ou não com a compra das ações, a depender da valorização ou desvalorização do valor de mercado das ações) e o exercício das opções é oneroso. Portanto, eventual ganho pelo empregado não é contraprestação ao trabalho.

Nessa linha, vejamos decisão recente do TST sobre o tema:

(...) STOCK OPTIONS (PLANO DE OPÇÃO DE COMPRA DE AÇÕES DA SOCIEDADE EMPREGADORA) (...) - DISCUSSÃO ACERCA DA NATUREZA JURÍDICA (...). O Tribunal Regional afastou a natureza jurídica salarial das Stock Options, reconhecida pela sentença, excluindo da condenação o pagamento das parcelas a elas concernentes. Amplamente utilizadas no exterior, em especial nos Estados Unidos da América, as Stock Options consubstanciam-se em opção de aquisição de ações da sociedade empregadora, oferecidas aos funcionários a título oneroso, por preços mais baixos que os praticados no mercado (Employee Stock Options). (...) a onerosidade da operação, os riscos suportados pelo empregado - que aufere lucros ou prejuízos de acordo com fatores aleatórios e independentes do trabalho - e alguma semelhança com a PLR contribuem para tonificar o posicionamento de que se trata de benefício de caráter estranho ao conceito de salário. O Tribunal Superior do Trabalho possui alguns precedentes que afastam, de forma peremptória, a possibilidade de integração das Stock Options à remuneração. (...). Agravo de instrumento conhecido e desprovido.[1] (grifo nosso)

Apesar do cenário favorável na Justiça do Trabalho, a insegurança jurídica trazida pelas decisões proferidas pelo Carf tem feito muitas companhias deixarem de implementar programas de opções de compra de ações – é notável, ao longo dos últimos anos, o movimento de companhias migrando para planos de outorga de ações, com atribuição de tratamento remuneratório: na dúvida, é melhor não correr o risco fiscal.

Julgamento do Tema 1226 traz mudança decisiva

Esse cenário, entretanto, acaba de ter um desfecho positivo no STJ. Em 11 de setembro, a Corte Superior julgou o Tema 1226 e definiu que os ganhos decorrentes de planos de opção de compra de ações não têm natureza jurídica remuneratória para fins de IRPF, mas sim de ganho de capital, quando ocorrer a venda das ações adquiridas pelo participante.

A decisão do STJ atribui grande segurança jurídica às companhias que optarem por implementar planos de opções de compra de ações. Primeiro, porque alinha o entendimento fiscal com a jurisprudência trabalhista, consolidando o entendimento de que os ganhos obtidos não têm natureza remuneratória. Segundo, porque a decisão do STJ, no âmbito de recurso repetitivo, tem caráter vinculante para o Carf, que não poderá proferir decisões divergentes sobre o tema em casos similares.

Surge, a partir de agora, um novo ambiente favorável à implementação de planos de opções de compra de ações por companhias no Brasil.

A segurança jurídica do plano, entretanto, está diretamente relacionada às suas características: companhias que utilizarem incentivos intitulados como plano de opções de compra de ações, mas que não observarem seus elementos essenciais, continuam correndo o risco de descaracterização da natureza jurídica mercantil das opções.

Nesse contexto, é essencial estruturar planos de opções de compra de ações de forma alinhada aos requisitos estabelecidos pela Justiça do Trabalho, pela Justiça Federal e pelo próprio STJ. A medida é necessária para afastar a natureza jurídica remuneratória dos ganhos eventualmente obtidos e evitar que companhias – e participantes – sejam expostos a riscos.

 


[1] TST - AIRR: 00004433120155020070. Relator: Alexandre De Souza Agra Belmonte. Data de julgamento: 15 de dezembro de 2021. 3ª Turma. Data de publicação: 4 de fevereiro de 2022.