A América Latina atravessa um momento conturbado e de grandes incertezas, reflexo do atual cenário de crise econômico-política instaurado em vários países da região, como Chile, Bolívia, México, Argentina e, nos últimos dias, Colômbia. Embora todos esses países estejam experimentando dificuldades internas do ponto de vista macroeconômico, são diversas as causas e circunstâncias que têm contribuído para a atual conjuntura, afetando governos liberais ou de esquerda.
No Chile, protestos por reformas constitucionais, originados pelo descontentamento da população com a política e economia do país, levam o governo de centro-direita do presidente Sebastián Piñera a enfrentar uma grave crise social e política, gerando insegurança para novos investimentos e para os mercados financeiros.
A Bolívia, por sua vez, encontra-se imersa no caos político e social. As numerosas manifestações e protestos ocorridos no país em virtude das acusações de fraude eleitoral levaram o presidente de centro-esquerda Evo Morales – no poder desde 2006 – a renunciar ao cargo. Essa incerteza agrava a situação da economia boliviana, que já vinha se desacelerando nos últimos anos.
A Argentina, ao contrário dos problemas circunstanciais do Chile e da Bolívia, enfrenta uma situação à qual se poderia atribuir um caráter crônico, em virtude das sistemáticas crises sofridas ao longo das últimas décadas. Os mercados vivem um momento de bastante apreensão em relação ao país, em virtude da volta do kirchnerismo, com a vitória do presidente Alberto Fernández e da vice-presidente Cristina Kirchner nas eleições de outubro. A crise econômica e o temor do retorno de um governo mais protecionista produziram desconfiança no setor privado e levaram à saída de investidores do mercado argentino nos últimos meses.
Já no México, apesar do crescimento do PIB nos últimos anos, o governo de esquerda do presidente Andrés Manuel López Obrador dá sinais preocupantes para os investidores, principalmente na área de infraestrutura. O destaque é a insegurança jurídica provocada pelo cancelamento da construção de um novo aeroporto internacional na Cidade do México.
Na Colômbia, cuja economia experimenta indiscutível melhora ao longo dos últimos anos, a crise provocada pelas manifestações ainda é muito recente e seus desdobramentos são totalmente incertos.
Origem de investimentos importantes na América Latina, a Espanha, por sua vez, vive o fim de um quase bipartidarismo entre os socialistas do PSOE e os liberais do PP, que provocaram recentemente frequentes bloqueios políticos internos e levaram à celebração de novas eleições gerais em novembro, pela quarta vez desde 2015. O resultado do pleito parece conduzir o país a um governo de coalizão entre o socialista Pedro Sánchez, atual presidente, e Pablo Iglesias, líder do partido de extrema-esquerda “Unidas Podemos”. Esse movimento exigirá, no entanto, o apoio de grupos minoritários do regionalismo independentista de esquerda para manter alguma estabilidade. Sob um prisma econômico, projetam-se perspectivas pouco promissoras de crescimento do mercado interno, o que pode ter impacto direto no comportamento dos investidores do país.
Todo o contexto de crise na América Latina afeta negativamente o fluxo comercial entre os países da região, principalmente com a Argentina. Já o fluxo de investimentos estrangeiros obedece a uma lógica distinta, com conotação em alguma medida contracíclica. Explicamos. A economia brasileira apresenta um cenário favorável aos investidores estrangeiros. Os juros historicamente baixos e a inflação controlada incentivam novos investimentos e aquecem o crédito e o consumo do potente mercado interno. O novo governo, de viés liberal, trabalha no lançamento de um ambicioso programa de privatização de importantes empresas públicas e na ampliação do programa existente de parcerias com a iniciativa privada para o desenvolvimento de novos projetos.
Devido ao imenso déficit brasileiro por infraestrutura, agravado pela ausência de grandes projetos nos últimos anos, há boas empresas e bons projetos ofertados em praticamente todos os setores, desde energia e óleo e gás até aeroportos, ferrovias, rodovias e portos.
Além disso, o baixo crescimento de parte das companhias brasileiras nos últimos anos e seu maior endividamento criaram oportunidades atraentes de aquisições privadas (M&A) em vários setores, como saúde, educação e geração de energia renovável.
Nesse cenário, o Brasil surge como destino natural para diversificação do fluxo de investimentos dos principais grupos empresariais latino-americanos, bem como para um incremento do já historicamente elevado fluxo de investimentos espanhóis.
Esse movimento vem sendo claramente sentido por nós, no âmbito do Latin American & Iberian Desk do Machado Meyer - grupo multidisciplinar de sócios e associados fluentes no idioma castelhano e com experiência no ambiente de negócios desses países, pois temos representado importantes investidores latino-americanos e espanhóis com interesse em fazer negócios no Brasil.