O Banco Central do Brasil (BCB) publicou, em 24 de janeiro, a Consulta Pública 98/24, que dispõe sobre o processo de planejamento de recuperação e resolução de instituições financeiras (IFs) e demais instituições autorizadas a funcionar pela autarquia, bem como disciplina o conteúdo, a elaboração e a remessa ao BCB do Plano de Recuperação e de Saída Organizada (PRSO).

A consulta pública surge em meio às contribuições do Conselho de Estabilidade Financeira (Financial Stability Board – FSB), que, ao estabelecer os atributos essenciais sobre o regime de resolução de IFs, indica que o processo de ser conduzido de forma ordenada, que preserve a continuidade de suas funções críticas e evite o uso de recursos públicos.

A preocupação do FSB e do BCB nasce da apreensão em relação a instituições de grande magnitude que, em caso de eventuais crises, podem comprometer a estabilidade do Sistema Financeiro Nacional (SFN), do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) ou da economia real.

Qual a diferença entre recuperação e resolução?

No âmbito do BCB, a grande diferença entre recuperação e resolução é o momento em que elas ocorrem. Quanto mais grave a situação e mais amplamente arriscada para a economia popular, mais próxima a instituição está do regime de resolução.

Recuperação

A recuperação é adotada quando a instituição ainda está em funcionamento. Seu objetivo é restaurar a viabilidade das operações, ou seja, as ações de recuperação visam reverter as anormalidades/dificuldades em estágios iniciais, antes que se tornem críticas.

Nesse cenário, a Resolução CMN 4.502/16, norma que dispõe sobre requisitos mínimos a serem observados na elaboração e execução de planos de recuperação por IFs, visou implementar um plano de recuperação nas instituições de maior porte. De forma estratégica, a norma organizava um conjunto de ações que poderiam ser tomadas em situações econômicas deterioradas e de falta de liquidez.

A consulta pública do BCB traz uma continuidade e um aprofundamento dos procedimentos e requisitos já trazidos pela Resolução CMN 4.502/16, que se limitava às situações de recuperação.

Resolução

Quando as medidas de prudência e de recuperação, como o plano indicado pela Resolução CMN 4.502/16, não funcionam como deveriam, o BCB decreta o regime de resolução ao avaliar que a gestão da instituição para a recuperação é inviável. São previstos pela regulamentação aplicável três regimes de resolução: o Regime de Administração Especial Temporária (RAET), a intervenção e a liquidação extrajudicial.

O conceito de “resolução” está atrelado ao conjunto de medidas adotadas ou determinadas pelo BCB quando constatada a inviabilidade ou perspectiva de inviabilidade da instituição, com intuito de mitigar danos à estabilidade do SFN, SPB e à economia real decorrentes da descontinuidade de uma instituição. Portanto, tal conceito não abrange somente os regimes de resolução nos termos da legislação vigente, mas também as medidas que podem ser determinadas pelo BCB.

A quem se aplica essa nova consulta pública?

As propostas são aplicáveis somente às IFs que atendam ao requisito da Resolução CMN 4.553/17 para enquadramento no Segmento 1 (S1). É o caso de bancos múltiplos, bancos comerciais, bancos de investimento, bancos de câmbio e caixas econômicas que:

  • tenham porte igual ou superior a 10% do Produto Interno Bruto (PIB); ou
  • exerçam atividade internacional relevante, independentemente do porte da instituição.

Além disso, em concordância com os ditames da Resolução CMN 4.502/16, todas as entidades integrantes do conglomerado prudencial e as entidades pertencentes ao grupo econômico que desempenhem linhas de negócios principais, serviços essenciais, funções críticas ou serviços críticos, também fazem parte do escopo da norma prevista pelo BCB.

Ainda assim, caso o BCB entenda ser necessário, devido ao desempenho de “funções críticas”, outras IFs e demais instituições por ele autorizadas a funcionar não enquadradas como S1 podem ser requisitadas pelo órgão a cumprir, no todo ou em parte, as medidas previstas no planejamento e elaboração do PRSO.

O que está sendo discutido pelo Banco Central?

O BCB apresentou duas minutas para análise do mercado:

  • uma resolução CMN, que regulamenta o processo de planejamento da recuperação e da resolução de IFs; e
  • uma resolução BCB, que dispõe sobre a elaboração e remessa do PRSO.

Com base na resolução CMN, o planejamento será um processo contínuo que a IF deve implementar a fim de se preparar para enfrentar de forma efetiva situações críticas que comprometam ou possam comprometer sua viabilidade. Esse processo compreende, em linhas gerais, a previsão de cenários de estresse, a definição de estratégias para enfrentar potenciais situações de recuperação e resolução e a autoavaliação da capacidade de recuperação e da resolubilidade.

A resolução CMN também dispõe, resumidamente, sobre:

  • a estrutura de suporte ao planejamento da recuperação e resolução, que incluem o programa de monitoramento e sistemas de informações alinhados às estratégias e medidas planejadas;
  • a continuidade de funções críticas, seção específica que dispõe que as IFs devem ser capazes de assegurar a continuidade dos serviços críticos em caso de recuperação e resolução;
  • a autoavaliação de capacidade de recuperação e resolubilidade, que deve conter, no mínimo, geração de dados e informações, financeira, continuidade operacional das funções críticas e separabilidade; e
  • o conteúdo mínimo do PRSO.

O PRSO, em linhas gerais, será um documento dedicado a registrar a análise, o diagnóstico e os resultados do planejamento da recuperação e resolução da instituição. Ele deverá ser elaborado e remetido periodicamente ao BCB.

O PRSO deverá conter, no mínimo, os seguintes itens descritos detalhadamente:

  • perfil organizacional;
  • estrutura de suporte;
  • governança do processo de recuperação e de resolução;
  • estratégias de recuperação e de resolução;
  • autoavaliação da capacidade de recuperação e da resolubilidade;
  • plano de ação para eliminação ou mitigação das barreiras e riscos à recuperação e à resolução; e
  • plano de comunicação.

Nos termos da resolução BCB, o PRSO deverá transmitir uma imagem extremamente precisa da instituição. O documento será elaborado com base em modelos fornecidos pelo BCB, de forma semelhante ao sistema de modelos do Manual de Organização do Sistema Financeiro (Sisorf).

A consulta pública do BCB trata de um tema altamente relevante para o SFN, que vem sendo tratado por meio de evoluções incrementais, que seguem tendência mundiais de maior segurança dos sistemas financeiros.

Os interessados podem oferecer contribuições até o dia 8 de março de 2024, por meio do formulário disponível no site do BCB, na página Sistema de Consulta Pública.