O Brasil já tem regras para regulamentar o regime jurídico da multipropriedade de imóveis e seu registro. Trata-se da Lei nº 13.777/2018, que alterou e introduziu novos dispositivos no Código Civil e na Lei de Registros Públicos. Publicada no Diário Oficial na sexta-feira, 21, ela tem origem no Projeto de Lei nº 10.287/2018, sancionado no dia anterior, e entra em vigor em 4 de fevereiro de 2019 (45 dias após a sua publicação).
A multipropriedade é espécie do gênero time-sharing e, embora não configure um instituto novo no Brasil, a expectativa do mercado é que, com a sua regulação, os investidores e consumidores tenham mais segurança jurídica e interesse na realização desse tipo de negócio. Ela representa uma maneira moderna de se compartilhar imóveis, otimizando recursos e tornando mais viável para a população o sonho de uma segunda moradia para momentos de descanso e lazer. A tendência é cada vez mais evidente em uma era marcada pelo uso da tecnologia para compartilhamento de serviços e espaços, a exemplo do Airbnb, WeWork e Uber, e pela preocupação crescente com o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis.
O instituto da multipropriedade permite que um mesmo imóvel – casa de praia ou campo, flat, village ou quarto de hotel, entre outros – seja detido de forma compartilhada por diversos multiproprietários, com divisão fracionada do tempo para uso e gozo do imóvel entre eles. Cada multiproprietário utiliza a sua cota de tempo para usufruir do imóvel em determinado período (por exemplo, uma semana), que pode ser fixo, flutuante ou um misto dos dois a cada ano. Reconheceu-se, assim, a existência da chamada “propriedade tridimensional” (coisa no tempo e espaço), em que cada multiproprietário tem o direito exclusivo de usufruir de forma plena de um determinado imóvel em um período estabelecido, durante o qual pode usar o bem, locá-lo, dá-lo em comodato ou simplesmente não ocupá-lo. Todas as despesas do bem (IPTU, condomínio etc.) são rateadas entre os multiproprietários com base na sua respectiva coparticipação.
Com a promulgação da nova lei e o reconhecimento da multipropriedade como um direito real, que prevê a individualização das unidades de tempo de cada multiproprietário no Registro de Imóveis, parte das discussões sobre o tema restarão resolvidas. No entanto, algumas questões polêmicas ainda precisam ser reguladas e esclarecidas pelo mercado e pelo Judiciário. A questão da execução da quota do multiproprietário por dívidas (de condomínio e IPTU, por exemplo), o regramento do que acontece em caso de renúncia do direito de propriedade por um dos multiproprietários e outros temas sensíveis dependerão de regramentos específicos a serem estabelecidos nas convenções de condomínio de cada empreendimento.
O sucesso desse tipo de empreendimento e da boa convivência entre os multiproprietários está diretamente associado a uma boa estruturação jurídica dos contratos que regerão esse relacionamento, principalmente a convenção de condomínio. A própria lei exigiu que os empreendimentos em que tenha sido instituído o regime da multipropriedade, no todo ou em parte, sejam necessariamente administrados por um administrador profissional.