A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) emitiu, em 20 de outubro, a Resolução CVM 193/23, que trata da divulgação de informações sobre sustentabilidade pelas companhias abertas, de acordo com os padrões IFRS S1 e S2.
O objetivo é aumentar a transparência, a confiabilidade, a consistência e a comparabilidade das informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, com base em indicadores e métricas claros e padronizados internacionalmente.
A norma permite, a princípio de forma voluntária (já a partir de 2024), que as companhias abertas, os fundos de investimento e as companhias securitizadoras elaborem e divulguem um relatório anual especial sobre ESG, seguindo as normas IFRS S1 e S2 emitidas pelo International Sustainability Standards Board (ISSB), órgão vinculado à Fundação
A IFRS S1 exige que as entidades divulguem informações sobre todos os riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade que possam afetar os fluxos de caixa da entidade, o seu acesso ao financiamento ou o custo de capital a curto, médio ou longo prazo (entendidos, em conjunto, como riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade que possam afetar as perspectivas da entidade).
Essa norma estabelece requisitos gerais relacionados ao conteúdo e à apresentação dessas divulgações, para que a informação divulgada ajude os interessados a tomar decisões sobre o fornecimento de recursos para a entidade. Resumidamente, uma entidade ou empresa deve fornecer informações sobre:
- os processos, controles e procedimentos de governança que a empresa utiliza para monitorar, gerir e supervisionar riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade;
- a estratégia da empresa para gerir riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade;
- os processos que a empresa utiliza para identificar, avaliar, priorizar e monitorar riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade; e
- o desempenho da empresa em relação aos riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade, incluindo o progresso em qualquer meta que a empresa tenha definido ou seja obrigada a cumprir por lei ou regulamento específicos.
A IFRS S2 exige que uma empresa/entidade divulgue informações sobre riscos e oportunidades relacionados mais especificamente com o clima que possam afetar os fluxos de caixa da entidade, o seu acesso ao financiamento ou o custo de capital a curto, médio ou longo prazo. Resumidamente, a norma se aplica a:
- riscos físicos relacionados com o clima;
- riscos de transição relacionados ao clima; e
- oportunidades relacionadas ao clima disponíveis para a entidade.
Com a padronização internacional das informações divulgadas, espera-se que a comparação entre empresas fique mais fácil, o que ajudaria o trabalho de avaliação de reguladores e investidores globais.
Segundo a CVM, a adoção do relatório é uma recomendação da Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (Iosco) e vai auxiliar o mercado a avaliar os impactos dos riscos e as oportunidades de sustentabilidade sobre os fluxos de caixa das empresas, contribuindo para o desenvolvimento de uma economia sustentável e regenerativa.
A divulgação será obrigatória para as companhias abertas a partir de 2026, com possíveis ajustes após a realização de consulta pública e análise de impacto regulatório. Os relatórios deverão ser apresentados no formulário de referência, sempre em maio.
A partir de 2027, porém, a divulgação deverá ocorrer três meses após o término do exercício social ou simultaneamente às demonstrações financeiras (o que ocorrer primeiro).
Em breve, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) também deve aprovar resolução semelhante, tornando a regra obrigatória para as sociedades limitadas.
Além de se antecipar em relação a regulamentações internacionais, a CVM buscou se alinhar às melhores práticas globais de divulgação de informações de sustentabilidade. Mas a ideia não é apenas essa. A intenção também é estimular as empresas a adotarem práticas mais sustentáveis e responsáveis, contribuindo para o desenvolvimento do mercado de capitais e para o atingimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU.
A norma integra o Plano de Transformação Ecológica do Ministério da Fazenda e o Plano de Ação de Finanças Sustentáveis da CVM para 2023-2024. Com ela, o Brasil se torna o primeiro país no mundo a adotar regras de comunicação de sustentabilidade seguindo os padrões do IFRS S1 e S2.
Essa divulgação, entretanto, vai requerer das empresas um estudo jurídico, contábil, financeiro e tributário específico, não só devido ao tipo de informação a ser divulgada, mas também pela responsabilidade dos administradores em relação a essa divulgação e pelas próprias consequências que as informações divulgadas podem trazer para as demonstrações financeiras das companhias.
A pergunta é: será que alguma companhia já estaria preparada para, mesmo que voluntariamente, começar a divulgação em 2024?
A norma tem relevância não apenas em termos de transparência “efetiva”, ao exigir dados técnicos, financeiros e contábeis – e não apenas textos longos e bem escritos sobre a sustentabilidade teórica. Ela também é relevante porque, ao praticar esses estudos e levantar dados, as empresas estariam minimamente se educando sobre a questão da sustentabilidade e o real significado dos princípios ESG.
Ao mesmo tempo, toda essa cadeia de informações tem implicações técnicas e contábeis-financeiras, cujo conhecimento específico e efeitos “cascata” que cada dado pode representar não estão ainda claros para os envolvidos no processo.
Talvez pareça exemplar que o Brasil seja o pioneiro, mas essa iniciativa, por outro lado, pode exigir um preparo tão grande que seja difícil para as empresas se adequarem até 2026. Não cabe, porém, apenas esperar para ver. Até lá, é importante que as empresas, especialmente seus profissionais diretamente envolvidos (auditores, financeiros e jurídicos), comecem a se preparar.