Com a Instrução Normativa 2.180/24, publicada em 13 de março, a Receita Federal do Brasil regulamentou as novas regras de tributação de rendimentos de investimentos no exterior detidos por residentes fiscais no Brasil, introduzidas pela Lei 14.754/23, em vigor desde 1º de janeiro de 2024.

A IN 2.180 seguiu a categorização introduzida pela Lei 14.754, segregando os investimentos no exterior em:

  • aplicações financeiras;
  • entidades controladas; e
  • trust

Os rendimentos oriundos desses investimentos passaram a ser tributados pelo Imposto de Renda da Pessoa Física à alíquota de 15%.

Destacamos a seguir os principais pontos abordados pela IN 2.180.

Apólices de seguro

A Lei 14.754 prevê que as apólices de seguro no exterior que possibilitem o resgate do valor principal ou dos rendimentos (de forma conjunta ou separada) pelo segurado ou pelos seus beneficiários serão tratadas como aplicações financeiras para fins de tributação.

Contudo, a IN 2.180 estipula que essas apólices serão consideradas entidades controladas nos casos em que o investidor tenha poderes para definir ou influenciar a estratégia de investimento.

Tal previsão, que não consta expressamente da Lei 14.754, pode ser vista como um indício de que, no entendimento da RFB, quaisquer instrumentos financeiros que atribuam à pessoa física capacidade de influenciar as decisões de investimento podem ser classificados como investimentos em entidades controladas.

Atualização do valor de bens e direitos no exterior

Outra novidade é que a opção de atualização de valor de bens e direitos no exterior a valor de mercado em 31/12/2023 deverá ser feita por meio da Declaração de Opção pela Atualização de Bens e Direitos no Exterior (Abex), que estará disponível no sistema eletrônico do e-CAC de 15/3/2024 a 31/5/2024.

A opção pela atualização do valor dos ativos no exterior é efetivada por meio da apresentação da Abex e do recolhimento do IRPF (à alíquota de 8%) até o dia 31/5/2024. Se cumpridos esses requisitos, a opção produzirá efeitos desde 1/1/2024.

Além disso, a IN 2.180 estabelece que o contribuinte poderá alienar, baixar ou liquidar bem ou direito mantido no exterior, além de distribuir lucros da entidade controlada entre 1/1/2024 e a data da efetivação da opção.

Nessa hipótese, os lucros ou ganhos de capital resultantes estarão sujeitos ao IRPF, apurado com base no custo de aquisição a que o contribuinte teria direito após a atualização (desde que a opção seja efetivada posteriormente).

Regime de transparência fiscal

A opção pelo regime de transparência fiscal em relação às participações detidas em entidades controladas diretas ou indiretas qualificadas (sujeitas ao regime de tributação automática dos lucros ao final de cada ano) existentes no exterior em 31/12/2023 deverá ser indicada na Declaração de Ajuste Anual (DAA), a ser entregue até 31/5/2024, com efeitos a partir de 1/1/2024.

A IN 2.180 prescreve a fórmula que deve ser utilizada pelos contribuintes para alocação do custo de aquisição aos bens e direitos detidos por tais entidades, quando da opção pelo regime de transparência.

A opção pelo regime de transparência fiscal é irreversível. No entanto, a IN 2.180 esclarece que, em relação às participações em entidades controladas adquiridas a partir de 1/1/2024, inclusive as controladas por sucessão e herança, legado ou doação, a pessoa física sucessora/receptora poderá alterar a opção realizada na DAA do de cujus ou do doador. Nessa hipótese, o valor total a ser registrado na DAA deve ser igual ao valor anteriormente registrado pelo de cujus ou doador.

A IN 2.180 também esclareceu que a adoção do regime de transparência fiscal não afasta a retenção de IRRF, conforme aplicável, quando do pagamento de rendimentos à entidade controlada por fonte brasileira.

Pontos relevantes não abordados

A IN 2.180 não abordou aspectos importantes da Lei 14.754 que podem ser objeto de controvérsias no futuro.

O primeiro envolve a ausência de regra expressa ou esclarecimento sobre os impactos tributários decorrentes da adoção dos padrões de contabilidade internacionais (IFRS) e local (BR-GAAP) para a apuração de lucros/dividendos em controladas no exterior. Isso inclui especialmente o tratamento aplicável aos ganhos decorrentes da atualização de ativos financeiros pelo seu valor justo contabilizados em conta de Ajuste de Avaliação Patrimonial ou Outros Resultados Abrangentes.

Em segundo lugar, a IN 2.180 não esclarece qual é o tratamento tributário e/ou as obrigações do settlor ou de beneficiários de trust discricionário quando há falecimento do settlor, mas não há definição do destinatário do patrimônio do trust.

Outros temas regulamentados

Outros pontos abordados pela IN 2.180:

  • A) APLICAÇÕES FINANCEIRAS NO EXTERIOR
  • Soluções para o reporte de investimentos possuídos em condomínio: a IN 2.180 dispõe que cada condômino deverá reportar o investimento em relação à parcela de que é titular ou de maneira igual entre os titulares nos casos em que não é possível identificar o valor atribuído a cada titular do ativo.
  • Ativos virtuais qualificados como aplicação financeira no exterior: ativos virtuais, inclusive as carteiras digitais com rendimentos, serão qualificados como aplicação financeira caso (i) sejam uma representação digital de outra aplicação financeira no exterior; ou (ii) tenham natureza e características de aplicação financeira. Além disso, a IN 2.180 esclarece que os ativos virtuais e arranjos financeiros com ativos virtuais serão considerados localizados no exterior, independentemente do local do emissor do ativo virtual e do arranjo financeiro com o ativo virtual, quando forem custodiados ou negociados por instituições financeiras.
  • Forma de aproveitamento do imposto pago no exterior: o imposto pago no exterior sobre o rendimento de uma aplicação financeira não poderá ser utilizado para deduzir o IRPF incidente sobre o rendimento de outra aplicação financeira ou sobre o lucro ou dividendo de uma entidade controlada.
  • Variação cambial de depósitos em moeda estrangeira: a variação cambial decorrente da utilização, inclusive o saque em espécie, dos recursos financeiros do depósito em moeda estrangeira em conta corrente ou em cartão de débito ou crédito no exterior não estará sujeita ao IRPF, desde que os critérios da Lei 14.754 sejam cumpridos (ou seja, não remuneração e manutenção em instituição financeira autorizada a funcionar pela autoridade monetária da respectiva jurisdição).

Ganho decorrente da alienação de moeda estrangeira em espécie: aplicação das regras de ganho de capital ao ganho resultante (IRPF às alíquotas progressivas de 15% a 22,5%).

  • B) CONTROLADAS NO EXTERIOR
  • Aplicação das regras de tributação de controladas no exterior à veículos ou entidades segregadas: em linha com o disposto na Lei 14.754, a IN 2.180 dispõe que cada classe de cotas ou ações vinculadas a patrimônios segregados dentro de uma mesma entidade será considerada entidade separada. A IN 2.180 acrescentou, ainda, que estruturas gerenciais, contratuais ou societárias que produzam efeito equivalente (segregação patrimonial) terão o mesmo tratamento.
  • Balanços elaborados para a apuração de lucros em controladas: o balanço da controlada, direta ou indireta, deverá ser assinado por contabilistas legalmente habilitados aos IFRS ou ao BR GAAP. Além disso, a IN 2.180 estabeleceu controles que devem ser adotados na escrita contábil de tais entidades, especialmente no caso de participação em outras controladas qualificadas.
  • Controladas indiretas ou coligadas não sujeitas ao regime de tributação automática: a IN 2.180 tratou das estruturas com controladas indiretas ou coligadas não enquadradas no regime de tributação automática, dispondo que o resultado apurado em decorrência dessa participação societária deverá ser mantido no balanço da controlada, direta ou indireta, que detiver a participação para efeitos da tributação anual automática.
  • Lucros acumulados até 31.12.2023: os lucros acumulados até 2023 por entidade controlada qualificada devem ser destacados em conta específica de reserva de lucros, estando sujeitos à tributação somente quando da sua efetiva disponibilização. A disponibilização dos lucros entre controladas sujeitas ao regime de tributação anual automática não ficará sujeita à incidência do IRPF no momento da disponibilização. Deve ser mantido o registro destacado no balanço da controlada que recebeu os lucros disponibilizados. Ainda nesse caso, o IRRF retido na fonte no exterior será passível de dedução na apuração do IRPF devido pela pessoa física controladora no Brasil sobre os lucros apurados até 31/12/2023.
  • Movimentações de dividendos e reduções de capital entre entidades controladas: a IN 2.180 estabeleceu regras para situações envolvendo distribuição de dividendos e devoluções de capital entre controladas qualificadas.