O Banco Central do Brasil (BCB) publicou, em 8 de novembro de 2024, os editais de Consulta Pública 109 e 110, que disciplinam os processos de constituição e funcionamento das prestadoras de serviços de ativos virtuais (VASPs, na sigla em inglês) e dispõem sobre a prestação de serviços de ativos virtuais por outras instituições autorizadas a funcionar pelo BCB.
As consultas públicas fazem referência à Lei 14.478/22 (Marco Legal dos Criptoativos), aos subsídios coletados por meio do Edital de Consulta Pública 97/23, aos diálogos do BCB com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), assim como às recomendações emitidas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), Conselho de Estabilidade Financeira (FSB) e o Banco de Compensações Internacionais (BIS).
As minutas normativas foram elaboradas com o objetivo de proteger os clientes e investidores no mercado de ativos virtuais, promover a governança do segmento, mitigar riscos associados à oferta de produtos e serviços e garantir a segurança jurídica. A solidez, eficiência e funcionamento adequado das sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais e o desenvolvimento do mercado de ativos virtuais também são prioridades centrais.
- TIPOS DE AUTORIZAÇÃO
Por meio do edital de Consulta Pública 109, o BCB propõe a criação de três modalidades de sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais: intermediárias de ativos virtuais, custodiantes de ativos virtuais e corretoras de ativos virtuais, conforme especificação a seguir.
- INTERMEDIÁRIAS DE ATIVOS VIRTUAIS
São as sociedades prestadoras de serviço de ativos virtuais cujo objeto social permite a realização de uma ou mais das seguintes atividades:
- intermediar distribuição de ativos virtuais;
- subscrever, isoladamente ou em consórcio com outras sociedades autorizadas, emissões de ativos virtuais;
- comprar, vender e trocar ativos virtuais, por conta própria e de terceiros;
- atuar como provedores de liquidez no mercado de ativos virtuais;
- administrar carteiras de ativos compostas por ativos virtuais, ou carteiras compostas por ativos virtuais, valores mobiliários, ativos financeiros e outros instrumentos financeiros admitidos na regulamentação específica;
- exercer funções de agente fiduciário nas operações do mercado de ativos virtuais;
- realizar operações de staking de ativos virtuais para seus clientes;
- prestar serviços de intermediação e de assessoria ou assistência técnica para seus clientes e para os emissores de ativos virtuais, no mercado de ativos virtuais;
- praticar operações de conta margem relacionadas a ativos virtuais;
- exercer outras funções de prestadora de serviços financeiros em sistemas de registro distribuído ou similares;
- ofertar contas de pagamento, na forma da regulamentação específica;
- praticar operações de prestação de serviços de ativos virtuais no mercado de câmbio; e
- exercer outras atividades expressamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil, quando sejam da mesma natureza e riscos das atividades no mercado de ativos virtuais mencionadas acima.
As intermediárias de ativos virtuais deverão ofertar conta de pagamento aos seus clientes nos termos da regulamentação pertinente. Além disso, terão de observar a regulamentação que disciplina o mercado de câmbio quando prestarem serviços de ativos virtuais nesse mercado.
- CUSTODIANTES DE ATIVOS VIRTUAIS
São as sociedades prestadoras de serviço de ativos virtuais que têm por objeto social a guarda de ativos virtuais, o que compreende:
- a guarda e o controle do ativo virtual, em favor de seu cliente, bem como dos instrumentos que afetam o exercício da titularidade do ativo (o que incluí a preservação das características do ativo virtual custodiado);
- a descrição, continuamente atualizada, da posição do ativo virtual, de cada tipo de ativo do titular, bem como a conciliação dessa posição com as informações pertinentes disponíveis nos sistemas de registro distribuído;
- o atendimento das instruções de movimentação emitidas pelo titular do ativo virtual ou pela pessoa à qual foi delegado o poder de agir no interesse do titular;
- o tratamento dos eventos incidentes sobre o ativo virtual;
- a constituição e a extinção de ônus e gravames sobre o ativo virtual; e
- a administração das informações relevantes para o exercício de alguma das atividades descritas acima a respeito do titular e dos seus ativos virtuais custodiados.
- CORRETORAS DE ATIVOS VIRTUAIS
São as sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais que têm por objeto social executar a combinação das atividades desempenhadas por intermediárias e custodiantes de ativos virtuais, observadas as regras gerais e específicas para cada modalidade, conforme estabelecido na minuta normativa. Assim como as intermediárias de ativos virtuais, as corretoras de ativos virtuais deverão ofertar conta de pagamento aos seus clientes.
- REGRAS DE CAPITAL
O BCB estabelece os seguintes limites mínimos de capital social integralizado e de patrimônio líquido para as sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais, sendo eles:
- Intermediária de ativos virtuais: R$ 1 milhão;
- Custodiante de ativos virtuais: R$ 2 milhões; e
- Corretora de ativos virtuais: R$ 3 milhões.
Além disso, a intermediária ou corretora de ativos virtuais que deseje realizar as atividades ou operações de staking de ativos virtuais em nome de seus clientes, ou ofertar conta margem de ativos virtuais para seus clientes, deverá acrescentar o valor de R$ 2 milhões ao capital social mínimo e ao patrimônio líquido.
- INSTITUIÇÕES JÁ AUTORIZADAS A FUNCIONAR PELO BCB
A minuta normativa proposta pelo BCB autoriza as seguintes instituições a atuar na modalidade de intermediação e custódia de ativos virtuais: bancos comerciais, bancos múltiplos, bancos de investimento, a CEF e as sociedades corretoras e distribuidoras de títulos e valores mobiliários.
Essas instituições devem cumprir os limites operacionais mínimos regulamentares, inclusive de capital principal, Nível I e Patrimônio de Referência, além do limite de patrimônio líquido mínimo. Devem manter também o nível mínimo de salvaguardas previsto para prestadores de serviço de emissão de moeda eletrônica, nos termos da regulamentação específica.
As instituições autorizadas que desejem prestar serviços de ativos virtuais devem comunicar o BCB, com antecedência mínima de 12 meses, sobre o início das atividades nas modalidades indicadas na minuta normativa. Além disso, devem tomar as medidas necessárias para adaptar suas políticas de atuação e estruturas de governança, como políticas de controles internos e de gestão de riscos.
- PROCESSO DE AUTORIZAÇÃO
A resolução proposta por meio do edital de Consulta Pública 109/24 exige que as sociedades prestadoras de serviço de ativos virtuais solicitem autorização prévia do BCB para iniciar a prestação de serviços de ativos virtuais.
No entanto, as sociedades que já estiverem prestando serviços de ativos virtuais antes da entrada em vigor da minuta poderão continuar operando, desde que solicitem autorização para funcionamento até a data a ser estipulada pelo BCB em 2025. Durante esse período, as sociedades poderão manter seus serviços até a conclusão do processo de autorização, mas estão proibidas de ampliar do rol de atividades realizadas entre a data de entrada em vigor da resolução e a data-limite de solicitação de autorização para funcionamento.
Por meio do edital de Consulta Pública 110/24, o BCB apresentou minuta de resolução que disciplina o processo de autorização das sociedades prestadoras de serviço de ativos virtuais. A proposta também consolida os procedimentos para autorização de corretoras de câmbio, distribuidoras e corretoras de valores mobiliários.
Nesse sentido, o BCB cria regras transitórias aplicáveis aos processos de autorização das prestadoras de serviço virtual que já estão em operação e das que vão iniciar suas atividades após a entrada das novas resoluções em vigor.
Quanto às disposições transitórias aplicáveis às sociedades que já estão em funcionamento, o BCB divide o processo de autorização em duas fases:
- Fase 1 – engloba:
- análise da comprovação das sociedades que iniciaram suas atividades antes da entrada em vigor das resoluções;
- cumprimento dos requisitos de capital e patrimônio líquido mínimo; e
- prestação de informações detalhadas sobre a estrutura da sociedade e suas operações (como controladores, responsáveis, tipos de serviços prestados e tamanho das operações); e
- Fase 2 – é quando se verifica o cumprimento dos requisitos estabelecidos na resolução proposta pelo edital de Consulta Pública 110/24, como o envio de declarações de capacidade econômico-financeira, origem lícita dos recursos, requerimento mínimo de capital, entre outros.
O BCB também poderá estabelecer procedimentos de instrução simplificada para os pedidos das prestadoras de serviço de ativos virtuais que já estão em funcionamento, com base em avaliação dos riscos envolvidos.
A abordagem faseada e detalhada busca garantir a segurança e a integridade das operações no mercado de ativos virtuais, ao mesmo tempo que permite a entrada de novos participantes, desde que cumpram os requisitos especificados pelo regulador.
- SEGREGAÇÃO DE RECURSOS
Em relação à segregação de recursos, o BCB pretende exigir que as sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais mantenham uma separação clara entre seus próprios recursos e os recursos de seus clientes. Dessa forma, os recursos de clientes devem, necessariamente, ser mantidos em contas de pagamento ou de depósitos individualizados. Para cumprir essa exigência, a VASP deve manter políticas e procedimentos que assegurem a devida segregação de recursos.
Além disso, a resolução proposta veda às sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais utilizar os ativos de titularidade de seus clientes ou de outras contrapartes negociais para a realização de operações próprias. Essa regra é excetuada na realização das seguintes operações:
- staking de ativos virtuais, atendidas as recomendações e a disciplina específica aplicáveis a essas operações; e
- realizadas com ativos virtuais de titularidade de investidores qualificados ou profissionais, conforme definido na regulamentação da CVM, mediante anuência expressa do titular dos ativos virtuais.
- CONTRATAÇÃO DE CUSTODIANTE DE ATIVOS VIRTUAIS NO EXTERIOR
A minuta normativa permite que a VASP contrate custodiante em jurisdição estrangeira, desde que o contrato seja formalizado de acordo com as regras dispostas na própria minuta, mais especificamente:
- O acordo deve atender às disposições aplicáveis à contratação de custodiante no país;
- A legislação e a regulamentação do país onde a entidade está constituída devem apresentar padrões compatíveis com os da regulamentação brasileira, conforme avaliação do BCB;
- A autoridade reguladora competente do país onde a entidade está constituída deve ter acordo de cooperação vigente com o BCB, aplicável aos aspectos de autorização de entidades sediadas em outros países; e
- A entidade estrangeira deve:
- ser autorizada a funcionar por autoridade competente do país onde está constituída;
- ter representante legal no Brasil;
- possuir bens e direitos estabelecidos no Brasil ou que a prestadora de serviços de ativos virtuais contratante exija ou contrate garantias financeiras que possam ser prontamente acionadas em caso de falhas da custodiante estrangeira;
- possibilitar o monitoramento dos registros de posições, o acesso a informações relevantes e o controle sobre os ativos virtuais custodiados na instituição contratada, por parte da sociedade prestadora de serviços de ativos virtuais, em relação aos ativos virtuais sobre os quais se aplica o contrato de custódia;
- franquear o acesso do BCB aos registros e demais sistemas relevantes da entidade que se relacionam com a custódia dos ativos virtuais sobre os quais se aplica o contrato; e
- adotar a formalização, com eficácia jurídica plena no país da entidade contratada, da segregação dos ativos virtuais do cliente de qualquer recurso da instituição, de modo que assegure a tempestiva disponibilidade dos ativos virtuais nas hipóteses de insolvência ou decretação de falência ou regime de resolução por parte de autoridade competente.
- CONTRATAÇÃO DE CORRESPONDENTES
Na minuta de resolução, o BCB propõe vedar, em qualquer hipótese, a contratação de correspondente no país para operações realizadas pelas prestadoras de serviços de ativos virtuais, assim como a contratação de misturadores e embaralhadores que visem dificultar as operações realizadas com ativos virtuais.
- COBRANÇA DE TARIFAS
A minuta proposta pelo BCB por meio do edital de Consulta Pública 109/24 também abrange modificações nas regras de cobrança de tarifas por parte de instituições autorizadas a funcionar pelo BCB, mais especificamente, a Resolução CMN 3.919/10.
As alterações propostas abrangem a possibilidade de cobrança de tarifas em atividades prestadas no mercado de ativos virtuais, como a administração, avaliação, reavaliação ou substituição de bens recebidos em garantia de operações, compra ou venda e custódia de ativos
- NOVAS TOMADAS DE SUBSÍDIOS
O BCB busca também obter subsídios sobre:
- o rol de atividades admitidas para as intermediárias de ativos virtuais;
- a necessidade de estabelecimento de regramentos para as operações financeiras realizadas nos ambientes de finanças descentralizadas; e
- as ausências ou omissões identificadas no arcabouço regulatório proposto nesta etapa da regulamentação
- OUTROS PONTOS ABORDADOS
As minutas normativas também abordam procedimentos referentes a:
- requisitos mínimos para a seleção de ativos virtuais a serem ofertados pelos intermediários e corretoras de ativos virtuais – listagem, deslistagem e partes relacionadas aos ativos virtuais;
- elegibilidade dos ativos virtuais ofertados pelas intermediárias de serviço de ativos virtuais;
- regras referentes à governança mínima da sociedade prestadora de serviços de ativos virtuais;
- responsabilidade das prestadoras de serviços de ativos virtuais;
- contratação de serviços essenciais para a prestação de serviços de ativos virtuais;
- governança na prestação de serviços de ativos virtuais;
- monitoramento das operações com ativos virtuais;
- procedimentos de segurança para prestação e serviços de ativos virtuais;
- prestação e divulgação de informações sobre a prestadora e serviços de ativos virtuais;
- direitos e obrigações dos clientes;
- armazenamento das chaves privadas e guarda dos ativos virtuais;
- procedimentos de avaliação e adequação do atendimento ao perfil de risco dos clientes;
- mitigação de conflitos de interesse;
- operações de conta margem de ativos virtuais;
- operações de staking de ativos virtuais; e
- prestação dos serviços de custódia de ativos virtuais.
- PRÓXIMOS PASSOS
Os editais de Consulta Pública 109 e 110 ficam abertos para tomada de subsídios até 7 de fevereiro de 2025. As propostas de atos normativos estão disponíveis no Portal Participa + Brasil, com link disponível no endereço eletrônico do Banco Central do Brasil na internet. Os interessados podem encaminhar sugestões e comentários por meio dos links mencionados e dos e-mails Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. ou Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..