"Estamos agindo na lógica da gestão do risco e não apenas do desastre (...) por entendermos que o custo de prevenir é sempre menor do que aquele de remediar”,[1] disse a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, em junho, após o governo federal instalar uma sala de situação preventiva para tratar da seca e do combate a incêndios no país.

Semelhante a uma doença que só é tratada depois da manifestação de sintomas severos, muitas questões são abordadas tardiamente, quando a crise já está mais do que instaurada. A intervenção precoce, porém, poderia ter mitigado ou até mesmo evitado o problema.

Aproveitando esse momento de reflexão e considerando o universo das empresas, podemos mencionar entre as medidas preventivas a análise de riscos, instrumento normalmente usado para tomada de decisões estratégicas.

Dificilmente uma petroleira, por exemplo, não fará uma avaliação de riscos antes de decidir quanto investirá em biocombustíveis em determinado ano. Da mesma forma, é esperado que uma rede hospitalar avalie os riscos envolvidos antes de decidir encerrar o atendimento emergencial em uma de suas unidades.

Até aí, estamos tratando de uma ação padrão. A verdadeira inovação, quando se fala de prevenção em gestão de crises, ocorre quando essa análise de riscos passa a ser acompanhada de um plano de mitigação de danos.

A decisão de correr riscos faz parte do dia a dia dos negócios, mas o diferencial é que nem todos investem em se preparar efetivamente para mitigar os prejuízos que resultarão da concretização desses riscos. Pensemos em dois exemplos distintos:

  • uma empresa fez a análise de riscos liderada pelos seus melhores engenheiros e revisada por uma consultoria prestigiosa, mas não elaborou um plano de mitigação de danos e nem investiu em ações de preparação para crise para além daquelas exigidas pela regulação do setor;
  • outra empresa também fez a análise de riscos devida com revisão externa, mas foi além e se preocupou em engajar o seu setor jurídico interno no processo de avaliação. Além de cumprir todas as ações exigidas pela legislação, traçou plano de mitigação dos possíveis danos e realizou treinamentos periódicos e exercícios simulados com setores diferentes, que até então não estavam tão habituados a interagir.

As duas empresas cumpriram a legislação e avaliaram os riscos de negócio, mas qual estaria melhor preparada para lidar com uma crise?

Sabemos da dificuldade que é sensibilizar a companhia sobre a importância do investimento em medidas preventivas, cujos resultados não costumam ser imediatamente percebidos. Conseguimos imaginar ser mais difícil para um gestor obter verba para a preparação para hipóteses de crises do que para aplicar em negócios que podem dar um retorno financeiro.

Felizmente, existe uma série de ações de baixos custos e esforços que podem ser adotadas para auxiliar na construção da gestão preventiva da crise e, ainda assim, gerarem resultados relevantes. Alguns exemplos:

  • Conscientização de lideranças – O esforço para conscientizar lideranças é de suma importância para que os executivos e gestores estejam preparados para enfrentar uma crise e mitigar seus danos. Com uma boa conscientização prévia, muito desgaste será evitado na hora da gestão da crise, pois o time estará mais bem-capacitado para lidar com a situação.
  • Capacitação de stakeholders estrangeiros – Se uma empresa conta com acionista estrangeiro, a capacitação prévia desse stakeholder sobre os costumes brasileiros também já pode ser considerada uma ação de prevenção de gestão de crise. Afinal, não é simples explicar o modus operandi do Poder Judiciário brasileiro, a cultura litigante, o perfil de atuação do Ministério Público e as regras processuais brasileiras, especialmente as possíveis liminares que podem vir a ser concedidas e todas as consequências de uma má gestão processual. Fazer isso no meio do caos, então…
  • Treinamentos, workshops e simulações guiadas – Outra importante ferramenta é a realização de exercícios variados com os times para compreensão das consequências de eventuais crises. A partir da identificação de gargalos operacionais e da visualização dos desdobramentos que podem ocorrer caso os riscos previamente mapeados se concretizem – o que reforça a necessidade do plano de mitigação de danos mencionado no começo desse artigo –, é possível dar seguimento com treinamentos e workshops. Essas iniciativas são importantes para capacitar melhor as pessoas, facilitar o engajamento entre áreas ou destravar falhas que podem ter sido identificadas nesse caminho.

Por meio desses exemplos, vemos que os investimentos não precisam ser altos para que as empresas possam ir além do estrito cumprimento da legislação e das praxes do mercado para melhor se preparar para crises.

Embora possa não ser a praxe, cada vez mais percebemos o quanto pode ser positivo dedicar parte dos esforços da empresa na preparação para as respostas a emergências, catástrofes, acidentes ou crises. Ainda que essas ações lideradas pelo setor jurídico não se proponham a evitar que uma crise ocorra, elas influenciam, e muito, a capacidade de reação das empresas. Isso, inegavelmente, tem um poder enorme, já que toda decisão tomada por uma empresa traz consequências de repercussão jurídica e podem refletir, positiva ou negativamente, na continuidade dos negócios, no tempo de recuperação etc.

As medidas preventivas não apenas podem orientar uma resposta mais organizada, célere e efetiva, como, principalmente, diminuir os prejuízos causados pelas crises.

A crise recém-instaurada no Rio Grande do Sul e a seca e queimadas no Pantanal e na Amazônia (dois lados opostos de problemas de natureza climática) colocou um holofote sobre a importância das ações de prevenção e preparação, além de chamar a atenção para o assunto.

Sabemos que o desafio é grande e o tema é dificílimo. Porém, em um mundo em que os impactos decorrentes das mudanças climáticas são cada vez mais frequentes e críticos, vale a pena empregar os melhores esforços para buscar neutralizar esses impactos, mitigá-los ou, ao menos, preparar-se melhor para dar respostas efetivas – até porque, como visto, medidas de fácil implementação e alto impacto, com baixos esforços e investimentos, podem gerar um impacto relevante na gestão de crise.

Essa atuação preventiva é benéfica para todas as empresas, especialmente aquelas inseridas em setores naturalmente mais expostos a variados tipos de riscos.

 

[1] Agência Brasil: Governo instala sala de crise para queimadas e seca no país