O Brasil registrou piora em seu desempenho histórico no Índice de Percepção da Corrupção 2023 (IPC 2023), divulgado ontem, 29 de janeiro, pela Transparência Internacional (TI), a mais importante organização global do terceiro setor dedicada ao tema da corrupção. O país perdeu dois pontos e despencou dez posições em relação ao ano anterior, ocupando agora o 104º lugar entre os 180 países avaliados.
Produzido anualmente desde 1995, o IPC avaliou 180 países e territórios, atribuindo notas em uma escala entre 0 e 100 – quanto maior a nota, maior é a percepção de integridade do país. Com os anos, o IPC se tornou o mais importante referencial de maturidade dos instrumentos de combate à corrupção e o mais citado termômetro sobre o desempenho de cada país no tema.
Com 36 pontos, o Brasil está abaixo da média global e regional das Américas, ambos com 43 pontos, e da média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que ficou em distantes 66 pontos. Além disso, como revela a TI, a pontuação também está abaixo da média mesmo entre países classificados como “democracias falhas”. Em dez anos, o Brasil caiu mais de 30 posições no ranking.
Com marcos legislativos – como a edição de Lei Anticorrupção em 2013 – e judiciais sobre a corrupção – como as condenações feitas na esteira de grandes operações de investigação – o Brasil chegou a melhorar sensivelmente sua avaliação. No entanto, no conjunto das avaliações, a TI enxerga mais retrocessos que avanços.
A variação da posição brasileira entre o ranking anterior e o atual representa uma queda acentuada, atribuída pela TI a múltiplos fatores. A organização aponta que houve um desmonte da estrutura e do discurso de prevenção e combate à corrupção no Brasil nos últimos anos. Um aspecto destacado expressamente pela entidade é que “a maioria dos profissionais de compliance de grandes empresas no país considera que a aplicação da Lei Anticorrupção está estagnando ou diminuindo”.
Contudo, mesmo com a avaliação ruim, a organização reconheceu avanços, entre os quais a melhora no controle social da corrupção com base em uma postura mais transparente da Controladoria Geral da União (CGU).
Embora a CGU tenha tido uma postura bastante ativa em 2023, a avaliação da TI no índice mais recente reflete um enfraquecimento contínuo na agenda anticorrupção do Brasil, abrangendo vários anos e instituições. E é justamente esse ponto que traz uma esperança para o país: se as medidas tomadas pela CGU recentemente surtirem efeito, poderia se inverter a tendência de queda do Brasil no IPC na avaliação do próximo ano.
Impactos para as empresas que operam no Brasil
Apesar de o ICP 2023 ser elaborado por uma organização sem fins lucrativos e não ser um instrumento oficial, ele é o ranking mais utilizado como referência do cenário de riscos de corrupção nas jurisdições avaliadas.
A queda da pontuação brasileira acarreta, portanto, um aumento do escrutínio das empresas globais sobre operações realizadas no Brasil e uma pressão maior pela implementação de controles de conformidade mais robustos.
Geralmente, programas de compliance mais desenvolvidos não proíbem que empresas realizem negócios em países com avaliações ruins de corrupção, mas condicionam esses negócios à implementação de controles maduros, efetivos, detalhados e alinhados com o local de atuação. Nesse sentido, a desidratação contínua da nota brasileira deve se refletir na percepção das empresas globais que atuam no território brasileiro.
A boa notícia é que as iniciativas dos órgãos de controle quanto à interação dos setores público e privado têm sido positivas, como a própria TI reconhece, e isso pode levar a um cenário de maior segurança para empresas. A CGU fortaleceu nos últimos anos as relações público-privadas, como é o caso do Pacto Brasil Pela Integridade Empresarial, o aprimoramento do Selo Pró-Ética, além de medidas de cooperação entre a CGU e outros entes, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e o BNDES.
O IPC 2023 destaca a urgente necessidade de dar prioridade à pauta anticorrupção nos setores público e privado. Há boas oportunidades sendo exploradas, como a regulamentação da obrigação de programas de compliance em licitações de grande vulto, a revisão do Pró-Ética e o aumento de requisitos de conformidade para acesso a financiamento de fomento. O modo como essas oportunidades serão aproveitadas deverá estar refletido na avaliação da Transparência Internacional a ser publicada em 2025.