Maior desafio é a criação da ANPD, constantemente postergada pelo Executivo federal

O Plenário do Senado Federal aprovou, no dia 3 de abril, o Projeto de Lei nº 1.179/20,[i] que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de direito privado, no período da pandemia de covid-19. Entre outras disposições, a versão final do PL, proposto pelo senador Antonio Anastasia (PSD/MG), altera para 1º de janeiro de 2021 a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), com a ressalva de que os artigos relativos às sanções administrativas (art. 52 ao 54) somente poderão ser aplicados a partir de 1º de agosto do ano que vem.

Com a aprovação pelo Senado, o texto será encaminhado para a revisão da Câmara dos Deputados, que poderá aprová-lo em sua integralidade ou fazer ajustes.

Além desse PL, a proposição de adiamento da vigência da LGPD era objeto de outros três projetos de lei anteriormente encaminhados ao Senado. No fim de 2019, o Projeto de Lei nº 5.762/19 propunha a alteração da vigência da LGPD de agosto de 2020 para agosto de 2022. A justificativa era a ausência de instalação da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e a pouca quantidade de grandes empresas com planos de adequação à lei.

É importante esclarecer que a atuação da ANPD não se restringirá ao papel de órgão fiscalizador e sancionador. Ela será também responsável por realizar estudos e editar regulamentos e diretrizes sobre as melhores práticas de proteção de dados, idealmente em articulação com as agências reguladoras e os setores econômicos, para orientar os impactados pela LGPD. Nesse sentido, sempre foi preocupante a morosidade do Poder Executivo em providenciar a sua instalação.

O contexto que vivemos é evidência disso, uma vez que, pela ausência de salvaguardas a direitos fundamentais e segurança jurídica para as empresas, os entes públicos têm enorme dificuldade de articular com o setor privado o tratamento e o compartilhamento de dados pessoais.

Com a instauração da pandemia do novo coronavírus (covid-19), o movimento pela postergação da LGPD, que tinha baixa adesão, ganhou força e resultou na edição de outros dois projetos de lei no Senado.[ii] Eles foram apensados ao PL e, consequentemente, prejudicados com a aprovação de sua versão final pelo Senado.

No cenário atual, com a ANPD ainda por instalar e a maioria das entidades públicas e privadas longe da implementação de programas de governança em privacidade (art. 50, 2, I, LGPD), há grandes chances de que a postergação da lei seja aprovada.

A urgência em instalar a ANPD é, mais do que nunca, patente. Ainda que a entrada em vigor da LGPD seja postergada, a edição de diretrizes oficiais possibilitaria ao Brasil não somente uma atuação mais eficiente do ponto de vista do tratamento de dados pessoais no contexto da pandemia, como também traria maior segurança jurídica aos processos de adequação dos setores público e privado.

[i] https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8081779&ts=1585615400034&disposition=inline

[ii] Projetos de Lei nº 1.027/2020, do senador Otto Alencar (PSD/BA), e nº 1.164/2020, proposto pelo senador Álvaro Dias (Podemos-PR), que, respectivamente, propunham a postergação da entrada em vigor para fevereiro de 2022; a postergação da aplicação das sanções para 12 meses após a entrada em vigor atualmente disposta (agosto de 2020) e a não prorrogação para os demais dispositivos da lei.