Por Ana Karina Souza, Laura Souza, Lair Loureiro e Rafaela Falavina
Foi aprovado na Câmara dos Deputados, em 18/08/2021, o Projeto de Lei nº 5.829/19, que visa instituir o marco regulatório da minigeração e microgeração distribuída e o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) no Brasil. Resultado de um esforço conjunto de agentes do setor, deputados e órgãos reguladores, o projeto de lei busca aumentar a segurança jurídica do setor de geração distribuída no Brasil e segue para análise e deliberação do Senado.
De acordo com o texto aprovado, poderão aderir ao SCEE os consumidores de energia, pessoas físicas ou jurídicas e suas respectivas unidades consumidoras:
- com microgeração ou minigeração distribuída com geração local ou remota;
- integrantes de empreendimento de múltiplas unidades consumidoras;
- com geração compartilhada ou integrantes de geração compartilhada; e
- caracterizadas como autoconsumo remoto.
As unidades participantes do SCEE ficarão sujeitas às regras tarifárias estabelecidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para as unidades consumidoras com microgeração ou minigeração distribuída após 31 de dezembro de 2045, quando existentes na data de publicação da lei ou se protocolarem solicitação de acesso na distribuidora em até 12 meses contados da publicação da lei. Projetos com solicitação de acesso entre o 13º e 18º mês de vigência da lei serão inseridos nas regras de transição até 2031, enquanto projetos com solicitação de acesso a partir do 19º mês de vigência da lei serão inseridos nas regras de transição até 2029.
Após os prazos de transição indicados na lei, a unidade consumidora participante ou que venha a participar do SCEE será faturada pela mesma modalidade tarifária vigente estipulada pela Aneel para a sua respectiva classe de consumo. A cobrança incidirá sobre a energia elétrica ativa consumida da rede de distribuição e sobre o uso ou a demanda de todas as componentes tarifárias não associadas ao custo da energia, devendo ser abatidos todos os benefícios ao sistema elétrico propiciados pelas centrais de microgeração e minigeração distribuída.
A partir de 12 meses contados da data de publicação da lei, a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) custeará temporariamente as componentes tarifárias não associadas ao custo da energia incidentes e não remuneradas pelas unidades consumidoras-geradoras sobre a energia elétrica compensada pelas unidades consumidoras participantes do SCEE.
O Conselho Nacional da Política Energética (CNPE) terá seis meses, a partir da publicação da lei, para definir as diretrizes de valoração dos custos e benefícios da micro e da minigeração distribuída. A Aneel, por sua vez, deverá utilizar as diretrizes estabelecidas pelo CNPE para valorar os benefícios da geração distribuída para o Sistema Interligado Nacional (SIN). Esse cálculo será concluído por meio de regulamentação da Aneel em até 18 meses contados da data de publicação da lei e deverá considerar todos os benefícios da microgeração e minigeração distribuída para o sistema elétrico, que compreende as componentes de geração, perdas elétricas, transmissão e distribuição.
Após os períodos de transição, as unidades participantes do SCEE ficarão sujeitas às regras tarifárias estabelecidas pela Aneel para as unidades consumidoras com microgeração ou minigeração distribuída.
A Aneel deverá estabelecer um formulário padrão para a solicitação de acesso para microgeração e minigeração distribuída, que deve ser protocolado na concessionária de distribuição de energia elétrica competente, não cabendo à concessionária solicitar documentos adicionais àqueles indicados nos formulários padronizados. Em outras palavras, a Aneel unificará os critérios de conexão dos projetos de geração distribuída, acabando com a análise atualmente descentralizada feita por cada concessionária de distribuição de energia elétrica.
O texto também determina que os interessados em implantar projetos de minigeração distribuída devem apresentar garantia de fiel cumprimento em montantes que variam entre 2,5% do valor do investimento (para centrais geradoras com potência instalada superior a 500 kW e inferior a 1.000 kW) ou 5% do valor do investimento (para centrais com potência instalada maior ou igual a 1.000 kW), ficando dispensadas dessa obrigação as centrais de microgeração ou minigeração distribuída enquadradas nas modalidades de geração compartilhada por meio da formação de consórcio ou cooperativa e enquadradas na modalidade de múltiplas unidades consumidoras.
Além disso, os projetos de minigeração distribuída serão considerados projetos de infraestrutura de geração de energia elétrica, que poderão ser beneficiários do Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi). Também serão enquadrados no rol de projetos que poderão constituir Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE) e Fundo de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I), sendo, portanto, considerados projetos prioritários e que proporcionam benefícios ambientais e sociais relevantes ao Brasil.
Especificamente em relação às distribuidoras, os montantes de energia elétrica excedentes das concessionárias ou permissionárias de distribuição de energia elétrica, em função da variação de mercado decorrente da opção dos consumidores pelo regime de microgeração e minigeração distribuída, serão considerados exposição contratual involuntária, reduzindo assim o risco de sobrecarga por sobreposição de energia causada pelos consumidores.
A lei também institui o Programa de Energia Renovável Social, destinado a investimentos na instalação de sistemas fotovoltaicos e outras fontes renováveis, na modalidade local ou remota compartilhada, em benefício dos consumidores da Subclasse Residencial de Baixa Renda, cujos recursos financeiros virão do Programa de Eficiência Energética, de fontes de recurso complementares ou, ainda, da parcela de outras receitas das atividades exercidas pelas distribuidoras de energia elétrica convertidas para a modicidade tarifária.
Mesmo ainda dependendo de deliberação do Senado, a aprovação do texto pela Câmara dos Deputados representa um importante passo na consolidação e modernização da regulação das atividades de geração distribuída no Brasil, inclusive em relação à segurança jurídica. Esses fatores, desde que efetivamente implementados no texto final a ser convertido em lei, podem servir como importante vetor de investimentos no setor e ampliar a participação da fonte solar na matriz energética brasileira.