O BNDES aprovou em setembro quatro operações de crédito para três diferentes companhias do setor ferroviário, totalizando quase meio bilhão de reais destinados à revitalização de vias, manutenção de equipamentos e compras de novos vagões e maquinários. Essa medida acompanha as novas políticas e diretrizes governamentais de fomento ao setor ferroviário, o qual, desde 2007, quando ocorreu a subconcessão do Tramo Norte da Ferrovia Norte-Sul, se ressente da carência de projetos consistentes de desestatização.
A título de exemplo, o Plano de Investimento em Logística (PIL), lançado em 2012, previa R$ 91 bilhões em investimentos em um pacote de dez mil quilômetros de linha férrea a serem construídos em 12 traçados diversos. O modelo fracassou tanto pela incapacidade de priorização quanto pela insegurança regulatória: o open access e a separação das atividades de infraestrutura e de transporte, com remuneração take or pay pela Valec, não convenceu, e, com isso, nenhum dos projetos saiu papel. Já o PIL II, lançado em 2015, foi mais conservador. Baseado no modelo anterior de concessão de exploração vertical, ele previa quatro mil quilômetros de linhas férreas concentradas em apenas quatro projetos, até hoje não executados.
O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), inaugurado pela Lei nº 13.334/16, incorporou os quatro projetos prioritários do PIL II, mas com importantes diferenças regulatórias e de traçado. Conjugado com a Lei nº 13.448/17 e com o Plano Nacional de Logística (PNL), aprovado em 2018, o PPI finalmente apresentou as condições mínimas para que os projetos ferroviários possam ser executados por meio de ritos administrativos coerentes com o nosso sistema jurídico. A preocupação com a diversificação logística dos modais de transporte – especialmente com o desenvolvimento nacional ferroviário – intensificada pela recente greve dos caminhoneiros deu, por sua vez, uma tração mais acelerada naqueles ritos administrativos.
Essencialmente, o PPI sinaliza ao mercado a estratégia do governo de promover o desenvolvimento da malha ferroviária nacional por meio de investimentos em empreendimentos pré-qualificados e contemplados no Cenário PNL 2025, que propõe a construção de 3,2 mil quilômetros de ramais ferroviários previstos no Programa Avançar Parcerias, quais sejam:
- Subconcessão da EF-151-Ferrovia Norte Sul (FNS-TC), que interliga Estrela d’Oeste/SP a Porto Nacional/TO. A FNS-TC foi recentemente aprovada com algumas recomendações e determinações pelo Tribunal de Contas da União (TCU), cujo atendimento pela ANTT poderá desencadear, ainda em 2018, a publicação do edital;
- Subconcessão da EF-334-Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), importante corredor de escoamento de minério do sul do estado da Bahia, que interliga Caetité/BA a Ilhéus/BA. Atualmente, a FIOL está em consulta pública para recebimento de subsídios e contribuições aos documentos técnicos, jurídicos e econômico-financeiros publicados pela ANTT; e
- Concessão da EF-170 (Ferrogrão), que interliga Sinop/MT a Itaituba/PA, foi objeto de consulta pública e aguarda a publicação de relatório pela ANTT.
Paralelamente, o PPI considerou estratégica a ampliação da capacidade de ferrovias já concedidas à iniciativa privada. Nesses termos, ao amparo da Lei nº 13.448/17, encontra-se em estágio avançado a prorrogação antecipada de algumas estradas de ferro cujas concessionárias solicitaram a extensão de prazo em contrapartida de investimentos adicionais. Tais investimentos adicionais podem ocorrer não apenas em malha própria, mas também naquelas de interesse da Administração Pública, tendo o PPI e o MTPA se servido do permissivo legal para pré-qualificar a Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO) e o Ferroanel de São Paulo igualmente como projetos prioritários.
O planejamento estratégico proporcionado pelo PNL, a sistemática de priorização de projetos pelo PPI e a edição de marcos legais adequados elevaram a decisão governamental de promover o desenvolvimento da malha ferroviária nacional por meio de novos investimentos, especialmente privados, a um patamar superior de viabilidade e seriedade. Para que o ritmo não se perca, o desafio para o próximo governo será menos o de ampliar o leque de projetos ferroviários do que, efetivamente, concretizar aqueles já pré-qualificados, o que demandará disciplina de cronograma, qualidade das modelagens, atratividade do investimento privado e, sobretudo, compromisso com a competitividade e inserção internacional do Brasil.