Nos últimos anos, embora o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tenha fixado teses sobre a utilização do seguro garantia ou fiança bancária como caução em discussões tributárias, contribuintes ainda enfrentam insegurança jurídica em relação aos efeitos da apresentação de seguro garantia judicial e fiança bancária em execuções fiscais. A dúvida se dá especialmente sobre a possibilidade de ocorrer posteriormente protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA) e inscrição no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin).
Em julgamentos recentes, a 2ª Turma do STJ[1] tem se manifestado no sentido de que a garantia da execução fiscal mediante seguro, fiança bancária e/ou bens imóveis, por si só, não inviabiliza juridicamente a realização de protesto e/ou inclusão no Cadin, “salvo se, por outro motivo – como no caso de tutelas judiciais antecipatórias (art. 151, IV e V, do CTN) –, o crédito tributário estiver com a exigibilidade suspensa".
Ainda em relação à jurisprudência, podemos mencionar a decisão monocrática do ministro Gurgel de Faria, segundo o qual “o oferecimento de seguro garantia, embora autorize a expedição de Certidão Positiva de Débito com Efeito de Negativa (CPD-EN), não é causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário e, por isso, e não impede o fisco de proceder ao protesto da CDA e de inscrever o nome da devedora em cadastro de inadimplentes”.
Vê-se, assim, que a 2ª Turma do STJ, cujo entendimento vem sendo aplicado monocraticamente por alguns ministros que integram a 1ª turma,[2] se posiciona pela possibilidade de realizar o protesto da CDA, mesmo na hipótese em que o débito esteja garantido por seguro. A fundamentação adotada está amparada na tradicional jurisprudência de que essa modalidade de garantia não suspende a exigibilidade do crédito tributário.
No entender da 2ª Turma da Corte Superior, a suspensão do protesto de obrigação descrita em título executivo e/ou a retirada do contribuinte do Cadin estaria intrinsecamente ligada à expressa suspensão da exigibilidade do crédito tributário, prevista no artigo 151 do Código Tributário Nacional (CTN). Essa medida teria o poder de afastar a situação de inadimplência para todos os fins e permitir que o contribuinte obtenha certidões de regularidade fiscal, impedindo sua inclusão no Cadin e/ou protesto do título executivo.
Esse entendimento impacta os contribuintes que pretendem ou já utilizam o seguro garantia e/ou a fiança bancária para fins de garantia em execuções fiscais. Além de trazer graves implicações à atividade empresarial, a posição da 2ª Turma do STJ evidencia a insegurança jurídica que esses contribuintes podem enfrentar devido às interpretações divergentes do Poder Judiciário sobre os efeitos da penhora dessas garantias.
Em termos práticos, se o magistrado, ao analisar a garantia ofertada, não fizer menção expressa à suspensão da exigibilidade do crédito tributário, o contribuinte poderá ser surpreendido com o protesto da CDA ou, ainda, com a sua inscrição no Cadin, mesmo com o débito garantido por seguro garantia e/ou fiança bancária.
Havendo garantia idônea, a administração tributária está integralmente resguardada em caso de êxito na demanda, o que, inclusive, esvazia – ou deveria esvaziar – seu interesse na adoção de quaisquer outras medidas constritivas.
O protesto de CDA e inscrição em cadastros de inadimplentes, portanto, a nosso ver, representa mais um meio coercitivo para cobrar a dívida, o que implica ofensa à função social da empresa, à propriedade privada, à boa-fé e ao princípio da moralidade. Afrontam, ainda, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, assim como o da menor onerosidade.
Além disso, diante da apresentação de garantia idônea, não existe previsão legal de que os efeitos da suspensão da exigibilidade do crédito tributário são exclusivos às hipóteses contidas no CTN. Não há qualquer prejuízo ao fisco, já que o débito está integralmente garantido.
Apesar desses precedentes, a discussão está longe de ser encerrada, já que há fortes argumentos que sustentam a impossibilidade de protesto da CDA e inscrição no Cadin, com base em crédito garantido por seguro garantia e/ou fiança bancária. De todo modo, é importante acompanharmos o posicionamento do Poder Judiciário, especialmente as futuras decisões do STJ sobre o tema.
[1] REsp 1.796.295/ES, REsp 1.775.749/SC, agravo interno nos embargos de declaração no REsp 2.001.275/PB.
[2] Embargos de declaração no REsp 1.923.413, REsp 1930057; REsp 1.930.057; e AREsp 2.159.394.