Comprar um fan token do time de coração não é coisa só de torcedor apaixonado, disposto a adquirir, por exemplo, o direito de votar na cor da terceira camisa do time favorito. Por trás de um torcedor, pode existir também um consumidor e, não raro, um investidor.
A euforia dos fan tokens começou em 2021 e possivelmente o assunto se manterá na ordem do dia por um bom tempo, pois essa nova modalidade de ativo digital trouxe uma série de riscos jurídicos ainda não dimensionados.
Esses riscos variam de acordo com o tipo de fan token emitido e comercializado. No caso dos fan tokens de sócio-torcedor, que dão aos seus adquirentes direitos de acesso a algum produto ou serviço imediatamente ou em uma data futura, podem ocorrer, por exemplo, problemas de falta de informação no projeto de emissão e comercialização dos tokens. Questões do tipo: para que serve aquele fan token? Que benefício exatamente ele dá ao seu adquirente? Em que momento? O que acontece se o adquirente não se sentir satisfeito com o benefício disponibilizado em data futura?
Todas essas questões deveriam ser tratadas de forma detalhada nos termos de uso da plataforma que oferece publicamente os tokens. Muitas iniciativas do gênero, entretanto, não são suficientemente claras em seus termos, o que pode acarretar sérios problemas no futuro.
Mesmo quando se toma o cuidado de informar o público sobre cada detalhe da operação, o risco existe. Os termos de uso da plataforma que comercializa fan tokens podem ser considerados contratos de adesão, não sujeitando o adquirente dos tokens a muitas das cláusulas ali expressas perante as cortes brasileiras. Um exemplo é a cláusula de eleição de foro estrangeiro para resolução de eventuais conflitos entre o adquirente do token e o seu emissor ou ofertante. Esse risco pode ser potencializado se a disputa envolver direitos do consumidor.
Além dos riscos associados aos tokens de sócio-torcedor, existe um risco mais genérico que pode afetar toda a categoria de fan tokens, incluindo os denominados tokens de solidariedade. Trata-se do risco de o fan token estar associado a um contrato de investimento coletivo. Nesse caso, o fan token possivelmente estará sujeito à Lei 6.385/76, que estabelece a necessidade de registro no órgão regulador.
Um fan token pode ser considerado um contrato de investimento coletivo se gerar, para o seu adquirente, o direito de participação, parceria ou remuneração, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros. Com relação a esse ponto específico, tokens de solidariedade são os que melhor se encaixam nessa definição.
Apesar disso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), ao analisar o caso específico do Vasco Token – token de solidariedade que representa direitos creditórios sobre transações futuras de alguns jogadores do time – entendeu que o fan token não consistia em um contrato de investimento coletivo. A autarquia considerou que os direitos de participação resultantes da comercialização do Vasco Token eram tão incertos que não seria possível dizer que os tokens representariam por si sós direito de participação, parceria ou remuneração com rendimentos que adviriam do esforço do time ou de terceiros.
Apesar disso, o risco de fan tokens semelhantes se aproximarem da categoria de contrato de investimento coletivo é relativamente considerável. Para mitigar esse risco, cada detalhe da estrutura do projeto de emissão e comercialização dos tokens deve ser rigorosamente pensado. Do contrário, a dor de cabeça poderá ser proporcional à paixão pelo time ou até maior.