No julgamento do Recurso Extraordinário nº 695.911, publicado em 19 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela inconstitucionalidade da cobrança de taxas associativas em loteamentos fechados anteriores à Lei Federal nº 13.465/17, que alterou o teor da Lei nº 6.766/79 (Lei de Parcelamento do Solo Urbano), quando o proprietário do lote não tenha aderido à constituição de associação responsável pela administração do loteamento.

Com as disposições da lei federal de 2017, a cobrança passa a ser legítima se o proprietário se associar ou se, quando da aquisição do lote, tiver tomado conhecimento da obrigatoriedade de pagamento da taxa associativa por menção expressa à sua cobrança registrada em cartório de registro de imóveis.

No processo que deu origem ao julgamento, a proprietária de lote localizado no município de Mairinque, em São Paulo, opôs-se à cobrança de taxa associativa por entender que não utilizava os serviços cobrados e com fundamento no princípio da livre associação e no afastamento do enriquecimento ilícito. Em primeira e segunda instâncias, foi confirmada a legitimidade da cobrança das taxas associativas, o que demandou o julgamento do recurso extraordinário pelo STF.

Os loteamentos são formas de parcelamento do solo que consistem na subdivisão de um grande terreno em lotes destinados à edificação. As vias abertas para circulação entre os lotes, quando da instituição do loteamento, passam a integrar o patrimônio municipal, nos termos da Lei de Parcelamento do Solo Urbano. O loteamento fechado, por sua vez, teve sua primeira regulamentação na lei federal de 2017, que inseriu a modalidade de loteamento com acesso controlado no parágrafo 8º do artigo 2º da Lei de Parcelamento do Solo Urbano.

Em razão desse controle, serviços complementares aos serviços públicos são necessários dentro de um loteamento fechado, como coleta de lixo, sinalização e serviços de segurança, que deverão ser contratados e organizados por meio de associação de moradores. Os loteamentos fechados sempre tiveram, portanto, funcionamento similar ao de estrutura condominial, em que os custos gerais com a manutenção das áreas comuns são rateados entre os proprietários por meio da cobrança de uma taxa.

Diante da inexistência de previsão legal sobre a obrigatoriedade do pagamento das taxas de associação até então, a posição geral contrária a essa obrigação tem base na interpretação objetiva do artigo 5º, inciso XX, da Constituição Federal, segundo o qual uma pessoa não pode ser obrigada a se associar. Alguns precedentes jurisprudenciais entendiam pela impossibilidade de cobrança da taxa. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) chegou a firmar tese no sentido de que as associações de moradores não poderiam exigir taxas de quem não é associado, em razão de não haver manifestação de vontade do proprietário para contrair a obrigação de pagamento.[1] Por outro lado, discutia-se também que os serviços da associação eram presumíveis para qualquer adquirente de lote em loteamento, ainda que sem a manifestação formal de concordância com a cobrança das taxas.

Com a promulgação da Lei Federal nº 13.465/17, ficaram reconhecidos três aspectos relevantes para discussão: a nova modalidade de loteamento com acesso controlado (o chamado loteamento fechado), as atividades exercidas por associações de proprietários de lotes como similares à atividade de administração de imóveis e a possibilidade de rateio de despesas dessas associações entre os proprietários dos lotes.

Em razão disso, o STF entendeu que, para que a cobrança de taxa associativa seja válida, é necessário, ao menos, que o proprietário do lote tenha participado do ato constitutivo da associação, concordando com o rateio das despesas comuns do loteamento, ainda que anterior à lei federal de 2017, ou que a obrigação de pagamento da taxa associativa esteja registrada na chamada “matrícula-mãe” do loteamento em cartório de registro de imóveis. Isso garante publicidade ao ato para ciência de todos aqueles que adquirirem lotes após a constituição da associação.

Considerando a competência municipal para regulamentar o ordenamento e o uso do solo urbano, o STF reconheceu ainda que, havendo lei municipal anterior à lei federal de 2017 que regulamente a cotização de despesas de loteamento para um determinado município, a cobrança das taxas também será considerada válida. Fora das hipóteses indicadas, a cobrança é inconstitucional.

Recentemente, em julgamento realizado em 22 de junho deste ano, o STJ entendeu que as taxas associativas devidas por proprietário de lote não têm natureza propter rem e, portanto, não estão vinculadas ao lote, ainda que a existência de tais taxas esteja mencionada no contrato-padrão de compra e venda dos lotes. Isso implica que os futuros adquirentes não serão responsáveis por pagar dívidas pretéritas de taxas associativas em aberto, ficando obrigados ao pagamento das taxas incorridas apenas a partir de sua aquisição.

 


[1] Tema 882 do STJ em sede de recursos repetitivos - REsp nº 1.280.871/SP e REsp nº 1.439.163/SP.