Prestes a entrar em vigor, a Lei 14.478/22, também conhecida como “Lei dos Criptoativos” ou “Marco Legal dos Criptoativos”, inaugura uma nova fase da criptoeconomia no Brasil, trazendo mais segurança aos participantes do mercado e, portanto, dando mais tração a esse setor.
A lei dá institucionalidade a um setor em franca expansão no Brasil, criando assim condições materiais relevantes para o desenvolvimento do mercado local.
A elaboração do marco legal foi amplamente discutida no Congresso Nacional e com autoridades técnicas, como o Banco Central do Brasil (Bacen) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A lei cria duas definições que funcionarão como pedras de toque para todo o setor: os conceitos de ativos virtuais e prestadoras de serviços de ativos virtuais.
Entre os ativos virtuais, destacam-se as criptomoedas como o Bitcoin, o Ether, a Litecoin e a Dogecoin. Na categoria das prestadoras de serviço de ativos virtuais, incluem-se as exchanges e os custodiantes de ativos virtuais.
Ambas as definições têm importância fundamental na consolidação da criptoeconomia no país, pois a partir delas serão delineadas as regras de conduta, de procedimento e de responsabilização dos diversos atores econômicos atuantes no setor.
Ainda, a Lei dos Criptoativos atribui a uma autoridade da Administração Pública federal o dever de criar regras específicas para as prestadoras de serviço de ativos virtuais. Caberá à entidade, que deverá ser indicada por decreto do Poder Executivo, autorizar o funcionamento das prestadoras de serviços de ativos virtuais, entre outras atribuições.
Os participantes do mercado nacional e internacional de criptoativos com interesse em realizar negócios no Brasil se preparam para a edição do decreto que definirá a autoridade reguladora e o debate envolvendo a edição da regulamentação infralegal.
Enquanto o órgão regulador não for indicado e a regulação infralegal não for publicada, entretanto, as principais disposições da lei terão poucos efeitos práticos. Por exemplo, as revisões que determinam a necessidade de autorização para funcionamento da prestadora de serviços de ativos virtuais no Brasil não terão aplicação prática até que o regime para sua autorização seja estabelecido.
Isso significa que as empresas podem continuar explorando o setor sem qualquer tipo de autorização, permanecendo sujeitas apenas à fiscalização e supervisão de suas atividades nos termos da legislação em vigor até o momento, incluindo a Lei 9.613/98, que trata da prevenção à lavagem de dinheiro.
Até a edição e entrada em vigor do arcabouço infralegal, apenas os princípios e normas de direito do consumidor e as regras de direito penal têm efeitos imediatos, muitos dos quais remetem a leis e obrigações que participantes desse mercado deveriam observar mesmo antes da entrada em vigor da nova lei. A aplicação desses princípios e obrigações de forma adaptada ao mercado de criptoativos depende também de regulação infralegal.
É importante lembrar que o alcance da Lei dos Criptoativos também é limitado, mesmo após a edição das normas infralegais. Embora tenha sido apelidada de Marco Legal dos Criptoativos, a lei não abrange todos os tipos de criptoativos.
O texto legal traz uma definição restritiva de ativos virtuais, ao excluir do seu escopo de aplicação algumas modalidades de criptoativos largamente adotadas no mercado, como os NFTs – non-fungible tokens. A comercialização desses ativos continua sendo governada, conforme o caso, pelo regime geral do direito civil e do consumidor, legislação aplicável à prevenção à lavagem de dinheiro e demais leis e regulamentos pertinentes à natureza dos ativos que representam.
O mesmo vale para os tokens representativos de ativos que tenham características de valores mobiliários. O Marco Legal dos Criptoativos acertadamente exclui do seu alcance de aplicação tais ativos, pois eles já estão sujeitos à legislação do mercado de capitais e a normas infralegais editadas pela autoridade do setor, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
A nova Lei dos Criptoativos entra em vigor pouco depois de o Conselho da União Europeia ter adotado regras sobre o mercado de criptoativos. Em 16 de maio, passou a vigorar a regulação conhecida como MiCA (Markets In Crypto-Assets), que integra um pacote da União Europeia para promover o desenvolvimento tecnológico, com sustentabilidade financeira, fomento à inovação e proteção ao consumidor, ajudando a integrar e harmonizar os direitos locais do bloco.
Com previsões semelhantes, o Marco Legal dos Criptoativos no Brasil e a MiCA, na União Europeia, trarão mais proteção aos participantes do mercado de criptoativos das respectivas jurisdições, com imposições de transparência e implementação de governança e estrutura específica para emissores e provedores de serviços, incluindo a conformidade com as regras de prevenção à lavagem de dinheiro.
A entrada em vigor da Lei dos Criptoativos é um importante passo na consolidação do mercado de criptoativos no Brasil. Seguimos acompanhando e aguardando, junto com o mercado, a edição do decreto para indicação da autoridade reguladora e o início do debate para edição das normas infralegais.