Discussão travada recentemente no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) suscitou dúvidas sobre os critérios aplicáveis ao cálculo de faturamento de grupo econômico dos fundos de investimento, exercício necessário para avaliar a necessidade de submeter ao crivo do órgão atos de concentração que envolvam fundos.
A norma do Cade atualmente em vigor (Resolução nº 2/12, alterada em 2014) dispõe que, para tal finalidade, consideram-se partes do grupo econômico de um fundo de investimento o grupo de cada cotista que detenha participação igual ou superior a 50% das cotas do fundo (individualmente ou por acordo de cotistas), as empresas controladas pelo fundo e as empresas nas quais esse fundo detenha direta ou indiretamente participação igual ou superior a 20% do capital social votante.
No caso em comento, o fundo comprador, gerido pela Tarpon Gestora de Recursos S.A., pleiteou à Superintendência-Geral do Cade o reconhecimento de que a submissão da operação era obrigatória sob o argumento de que o gestor deveria ser visto como parte do seu grupo econômico, pois teria autonomia e controle sobre seus investimentos.
Em sua decisão, a Superintendência-Geral optou por considerar o gestor como parte do grupo do fundo. Porém, fez referência ao fato de que, originalmente, a Resolução nº 2/2012 considerava que o gestor era parte do grupo do fundo para fins de cálculo do faturamento, mas, ao revisar essa norma em 2014, o Cade optou por limitar o grupo aos cotistas com percentual substancial das cotas e às empresas de portfólio do fundo, mesmo conhecendo o papel exercido pelo gestor. Mencionou ainda que julgados recentes do Cade confirmaram o entendimento de que a norma aplicável desconsidera o gestor de fundos. Ressaltou por fim que, por cautela, entendeu-se que o gestor deveria ser considerado parte integrante do grupo do fundo comprador, sobretudo pela reiterada manifestação de que o fundo está sob seu controle.
Em suma, ainda que a decisão da Superintendência-Geral não tenha mencionado expressamente o caráter excepcional do entendimento adotado, seu teor já autorizaria essa conclusão.
Essa conclusão foi reforçada diante das discussões travadas na sessão de julgamento do Tribunal do Cade realizada em 4 de março deste ano. Na ocasião, foi analisada a proposta de avocação apresentada por um de seus membros, para quem o tribunal deveria tratar o tema da definição de grupo econômico de fundos de investimento de maneira mais precisa e definitiva, dada a possibilidade de que aquela decisão ensejasse insegurança jurídica em casos futuros. A proposta foi rejeitada, pois prevaleceu entre os membros do tribunal a percepção de que a Superintendência-Geral não havia adotado uma interpretação contrária ao texto atual da Resolução nº 2/12, tampouco uma interpretação que gerasse insegurança jurídica. Por fim, o presidente do Cade sugeriu a formação de um grupo de trabalho para discutir a possibilidade de rever a norma em questão.
Portanto, até que a norma seja alterada ou que o Cade eventualmente venha a adotar uma interpretação não literal de seus dispositivos em decisões reiteradas, hipótese que neste momento parece improvável, não é necessário levar em consideração o gestor ao se calcular o faturamento do grupo de um fundo de investimento.