A sigla ESG (Environmental, Social and Governance) passou a fazer parte do cotidiano das empresas e da sociedade. Ela representa um conjunto de práticas que buscam aumentar o comprometimento com políticas e condutas voltadas à sustentabilidade.

No direito, o ESG passou a integrar diversas áreas, seja por meio da regulação estatal – com a edição de normas que recomendam ou obrigam a adoção de determinadas condutas – ou pela demanda da sociedade, de investidores e de stakeholders.

Em relação ao direito do consumidor especificamente, a demanda por produtos e serviços comprometidos com políticas mais robustas de sustentabilidade tem aumentado muito ao longo dos últimos anos, o que reforçou a preocupação de fornecedores e prestadores de serviço com o tema.

O Código de Defesa do Consumidor, apesar de ter amplas regras de proteção ao consumidor, principalmente em relação ao acesso à informação, não tem previsão expressa que obrigue fornecedores e membros da cadeia de consumo a adotar práticas mais sustentáveis nos seus processos produtivos.

Entretanto, além das normas ambientais que têm regramento próprio e podem se relacionar com o consumo verde e consciente – e não serão tratadas neste artigo –, existem legislações esparsas que buscam implementar padrões de produção e consumo mais sustentáveis. Entre elas estão:

  • Decreto 7.963/13: instituiu o Plano Nacional de Consumo e Cidadania com o objetivo de “promover o acesso a padrões de produção e consumo sustentáveis”.
  • Lei 13.186/15: instituiu a Política de Educação para o Consumo Sustentável, que definiu consumo sustentável como “o uso dos recursos naturais de forma a proporcionar qualidade de vida para a geração presente sem comprometer as necessidades das gerações futuras”.
  • Lei 19.413/16 de Goiás: estabeleceu política estadual de incentivo ao consumo sustentável com o objetivo de estimular o consumidor a escolher produtos e serviços ecologicamente sustentáveis; reduzir o consumo de água, energia e outros recursos naturais e resíduos sólidos; incentivar a reutilização e reciclagem; e estimular o uso dos recursos naturais com base em práticas ecologicamente sustentáveis.
  • Lei 7.742/17 do Rio de Janeiro: criou política estadual de consumo sustentável com objetivos semelhantes aos da lei de Goiás. A norma prevê ainda que as autoridades governamentais devem promover campanhas para desenvolver práticas de consumo sustentável e a formação contínua de profissionais do setor de educação em educação ambiental. Devem também obrigar as empresas a divulgar impactos de seus produtos.
  • Resolução 4.945/21 do Conselho Monetário Nacional: estabeleceu que as instituições financeiras e demais instituições sujeitas à autorização do Banco Central do Brasil devem implementar uma Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática e divulgar “a lista de produtos e serviços oferecidos pela instituição que contribuam positivamente em aspectos de natureza social, natureza ambiental ou natureza climática”.
  • Lei 14.181/21: incluiu, no Código de Defesa do Consumidor, o fomento de ações para educação financeira e ambiental dos consumidores como parte da Política Nacional de Relações de Consumo.

ONU incentiva desenvolvimento sustentável

A Organização das Nações Unidas (ONU) já se pronunciou sobre o tema em algumas ocasiões, entre as quais destacamos:

  • Declaração do Milênio, de 2000: o documento listou compromissos dos estados-membros até 2015, como: a erradicação da pobreza, a proteção do ambiente, a defesa dos vulneráveis e a necessidade de alteração nos padrões de consumo.
  • A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, de 2015: estabeleceu plano de ação global com os principais objetivos de erradicação da pobreza e promoção de uma vida digna. O objetivo n° 12 diz ser necessário “assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis” e inclui diversas metas, como:

    • o incentivo à adoção de práticas sustentáveis e à inclusão de informações de sustentabilidade em relatórios;
    • a promoção de compras públicas sustentáveis;
    • a garantia de que as pessoas, em todos os lugares, tenham informação relevante e conscientização para o desenvolvimento sustentável e a adoção de estilos de vida em harmonia com a natureza;
    • o apoio a países em desenvolvimento para fortalecimento de sua capacidade tecnológica para adoção de padrões mais sustentáveis de produção e consumo; e
    • a implementação de ferramentas para monitorar os impactos do desenvolvimento sustentável para o turismo.

Princípios constitucionais podem ser usados para proteger o consumidor

No Brasil, apesar da falta de regra consumerista expressa, por meio da interpretação conjunta dos princípios constitucionais de proteção ao consumidor e ambientais, é possível aplicar regras que protejam o consumidor em questões relacionadas à sustentabilidade socioambiental. Além disso, existem projetos de lei em tramitação que pretendem reforçar o entendimento sobre o tema, como:

  • Projeto de Lei 3.899/12, que tem como objetivo criar a Política Nacional de Estímulo à Produção e ao Consumo Sustentáveis – atualmente, aguarda-se a criação de uma comissão temporária. Ao projeto foram anexados diversos outros, que tratam, por exemplo, da criação do produto sustentável, da redução de impostos para produtos ecologicamente sustentáveis, do desenvolvimento de um cadastro e de um selo específico para empresas comprometidas com a sustentabilidade;
  • Projeto de Lei 234/19, que prevê a adoção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas por entidades que recebem recursos públicos – atualmente, o projeto aguarda designação de relator na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS); e
  • Projeto de Lei 1.308/21, que estabelece a Política de Promoção da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável – atualmente, o projeto aguarda designação de relator na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS).

Importância de conscientizar o consumidor e o mercado

Além das iniciativas normativas, existe forte atuação de organizações internacionais e entidades do terceiro setor para conscientizar os consumidores, estimular a produção e o consumo conscientes e valorizar as iniciativas nesse sentido.

Na perspectiva de investimento, merece destaque ainda a pressão de agentes do mercado para que empresas investidas adotem práticas ESG.

Em 2021, a Resolução 59 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) promoveu alterações nas informações divulgadas por companhias abertas em seu formulário de referência para, entre outras mudanças, prever a necessidade de divulgação de informações de ESG e de clima.

Foi adotado o modelo “pratique ou explique”, por meio do qual as companhias deverão implementar ou informar os motivos para a não implementação de práticas ESG:

  • a companhia deverá informar se divulga informações ESG em seu relatório anual e se esse documento considera os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela Organização das Nações Unidas e quais são os ODS materiais para o negócio do emissor. Em caso negativo, a companhia deverá justificar a não divulgação de informações ESG;
  • os diretores devem comentar oportunidades do plano de negócios relacionadas a questões ESG;
  • a companhia deverá divulgar os fatores de risco relacionados a questões sociais, ambientais e climáticas;
  • a companhia deverá informar o papel dos órgãos de administração na avaliação, no gerenciamento e na supervisão dos riscos e oportunidades relacionados ao clima. Em relação ao conselho de administração, deve ser indicado se existem canais para que questões críticas relacionadas a temas e práticas ESG e de conformidade cheguem ao conhecimento do conselho; e
  • em relação à remuneração dos administradores, a companhia deve informar os indicadores de desempenho levados em consideração, inclusive aqueles ligados a questões ESG.

Recentemente, no fim de julho de 2023, a OCDE divulgou o relatório Financial consumers and sustainable finance, em que abordou a demanda dos consumidores por produtos sustentáveis e as ferramentas disponíveis para os consumidores. O relatório também procurou indicar recomendações para a elaboração de políticas específicas sobre o tema. Entre os principais apontamentos do trabalho, destacam-se:

  • adoção de uma abordagem holística e integrada em relação ao consumidor e sua relação com o financiamento sustentável;
  • criação de definição clara de financiamento sustentável para maior clareza, transparência e compreensão do consumidor; e
  • análise da adequação das regras de divulgação de informações ao consumidor sobre as práticas de financiamento sustentável. O objetivo é mitigar o risco de greenwashing, social washing e impact washing, bem como monitorar e punir práticas inadequadas.

Considerando a ausência de obrigações legais específicas sobre a adoção de práticas sustentáveis para bens de consumo, o consumidor ainda não tem fundamentos para exigir judicialmente a adoção dessas condutas como violações à lei ou vício.

Apesar disso, ele pode exercer pressão extrajurídica sobre os membros da cadeia produtiva, ao excluir empresas e agentes não comprometidos com essas práticas ou preferir aqueles que tenham essa conduta.

Dada a relevância do tema e a sua importância para investidores e consumidores, os fornecedores e prestadores de serviços devem buscar o apoio de especialistas para adequar e aprimorar suas práticas ESG. A tendência é que o tema ganhe cada vez mais protagonismo e passe a ser determinante para as relações de consumo.