O ano de 2024 foi marcado por importantes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que prometem influenciar as formas de contratação, as decisões e práticas das empresas em 2025, bem como o acesso à Justiça do Trabalho nos próximo anos.

Seguem abaixo os principais temas discutidos ao longo de 2024.

Tema 1.291, STF: vínculo empregatício entre motorista e plataforma

Em 1º de março de 2024, o STF reconheceu a existência de repercussão geral da matéria tratada no Recurso Extraordinário 1.446.336 (RE 1.446.336), apresentado pela plataforma Uber. No recurso, se discute o “reconhecimento de vínculo empregatício entre motorista de aplicativo de prestação de serviços de transporte e a empresa administradora de plataforma digital” (Tema 1.291).

Desde então, diversos sindicatos, associações e empresas têm ingressado como amicus curiae nos autos, que, atualmente, estão conclusos com o relator, ministro Edson Fachin, aguardando análise e agendamento do julgamento.

A Suprema Corte, em sua maioria, entende que não há vínculo de emprego entre os motoristas e a plataforma digital. Por isso, a expectativa é que o STF mantenha o mesmo entendimento ao julgar definitivamente o Tema 1.291.

Espera-se que o tema tenha um desfecho este ano. Após proferida pelo STF, a decisão será aplicável a diversos processos que discutem o mesmo assunto. Além disso, o entendimento dado pela Suprema Corte deverá ser aplicado por todos os tribunais brasileiros.

Tema 1.072, STF: licença-maternidade à mãe gestante em união homoafetiva

O STF julgou, em 13 de março de 2024, o Tema 1.072 para decidir que a mãe não gestante em união homoafetiva tem direito à licença-maternidade. Fixou também a tese de que, caso a companheira já tenha utilizado o benefício, a mãe não gestante terá direito à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade.

Diante desse novo cenário, cabe às empresas ajustarem suas políticas e práticas internas para concederem a licença-maternidade às mães gestantes em união homoafetiva, observadas as limitações e condições definidas pelo STF, a fim de garantir adequadamente o benefício às empregadas elegíveis.

Tema 1.226, STJ: natureza jurídica das stock options

O STJ julgou, em 11 de setembro de 2024, o Tema 1.226 e definiu que os ganhos decorrentes de planos de outorga de opções de compra de ações (SOPs ou stock options) não têm natureza jurídica remuneratória para fins de IRPF, mas sim de ganho de capital, quando ocorrer a venda das ações adquiridas pelo participante.

A decisão do STJ atribui grande segurança jurídica às companhias que optarem por implementar planos de opções de compra de ações. Isso porque, além de alinhar o entendimento fiscal com a jurisprudência trabalhista, consolidando o entendimento de que os ganhos obtidos não têm natureza remuneratória na esfera judicial, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos que tratem de matéria idêntica ou decidirão aplicando a tese firmada – já que a decisão do STJ tem caráter vinculante para o Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), que não poderá proferir decisões divergentes sobre o tema em casos similares.

Diante dessa decisão, surge um novo ambiente favorável para a discussão sobre a implementação de planos de opções de compra de ações por companhias no Brasil, desde que os SOPs estejam alinhados aos requisitos estabelecidos pela Justiça do Trabalho, pela Justiça Federal e pelo próprio STJ.

RR 713-03.2010.5.04.0029, SDI-1 do TST: correção de débitos trabalhistas

Em 2020, no julgamento da ADC 58, o STF considerou inconstitucional a utilização da taxa referencial (TR) como índice de atualização dos débitos trabalhistas e determinou a aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), na fase pré-judicial, e a taxa do Sistema Especial de Liquidação de Custódia (Selic), depois da citação, até que houvesse lei específica sobre o tema. Em 2024, a Lei 14.905/24 estabeleceu a variação do IPCA como índice de correção monetária e a Selic como taxa de juros em caso de inadimplemento das obrigações.

Com base nessas duas premissas, a Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST decidiu, em 25 de outubro de 2024, no âmbito do processo RR 713-03.2010.5.04.0029, que, para fins de correção dos débitos trabalhistas, deve-se aplicar o IPCA a partir da citação e compor os juros de mora pela diferença entre a Taxa Selic e o IPCA. Com isso, altera-se a maneira como os débitos trabalhistas são corrigidos atualmente.

Ressaltamos que, caso a Taxa Selic seja menor que a inflação do período, a taxa será considerada zero, nos termos do artigo 406, parágrafo terceiro, do Código Civil.

Do ponto de vista judicial, a decisão é de extrema relevância para os processos em curso. Isso porque, por ter sido proferida pela SDI-1 do TST, indica a possibilidade de os tribunais trabalhistas uniformizarem o entendimento sobre o tema, pacificando a jurisprudência e fixando premissas que devem ser observadas e aplicadas às atuais reclamações trabalhistas e às futuras ações.

Para as empresas a decisão também serve de parâmetro para o cálculo do passivo trabalhista, especialmente para adequação do provisionamento dos débitos trabalhistas. Por isso, é importante que elas revejam os valores provisionados para evitar diferenças significativas de valores em caso de condenação judicial.

Tema 23, TST: aplicação da Reforma Trabalhista

O TST decidiu, em 25 de novembro de 2024, por maioria de votos, que a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17), tem aplicação imediata aos contratos de trabalho em curso, mas apenas aos fatos ocorridos a partir da sua entrada em vigor – 11 de novembro de 2017. A tese é aplicável a toda a Justiça do Trabalho.

Ressalta-se que a decisão ainda pode ser objeto de recurso e, portanto, não é definitiva. Entretanto, caso mantido o entendimento do TST, a decisão é de extrema relevância para aplicação dos direitos decorrentes da Reforma Trabalhista e também impacta o limite temporal de pedidos formulados em reclamações trabalhistas relacionados ou não às alterações trazidas pela Reforma Trabalhista.

ADI 5.826, ADI 5.829 e ADI 6.154, STF: constitucionalidade do contrato de trabalho intermitente

O plenário do STF validou, em 13 de dezembro de 2024, por maioria de votos, os artigos 443, 452 e 611-A, inciso VIII, da CLT, introduzidos pela Reforma Trabalhista, que instituíram o contrato de trabalho intermitente.

De acordo com o relator, ministro Nunes Marques, o contrato de trabalho intermitente não suprime direitos trabalhistas nem fragiliza as relações de emprego. Segundo ele, essa modalidade de contratação oferece proteção especialmente aos trabalhadores que estejam na informalidade, além de contribuir para reduzir o desemprego.

Com isso, as empresas que já adotam essa modalidade de contratação passam a ter maior segurança jurídica para continuar contratando trabalhadores intermitentes.

A validação pelo STF também estimula empresas que ainda não fazem uso dessa modalidade, por receio de a prática ser invalidada, a adotá-la.

Lembramos que o contrato de trabalho intermitente é válido para todas as atividades, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria, conforme previsto no artigo 443, §3º, da CLT.

Tema 21, TST: concessão de justiça gratuita

Em 16 de dezembro de 2024, o TST fixou a tese de que o juiz deve conceder automaticamente o benefício da justiça gratuita para o reclamante que comprovar, nos autos, salário igual ou inferior a 40% do teto da Previdência Social. Essa decisão tem o objetivo de facilitar o acesso à Justiça para quem não tem condições de arcar com os custos decorrentes da reclamação trabalhista.

O pedido de justiça gratuita poderá ser contestado pela empresa ou outra parte do processo, que deverá apresentar provas de que o trabalhador tem condições financeiras. Nesses casos, o juiz  deverá dar ao trabalhador a oportunidade de se manifestar antes de decidir se manterá ou não o benefício.

A nosso ver, essa tese do TST promete retomar o cenário anterior à Reforma Trabalhista, em que a justiça gratuita era concedida na maioria das reclamações trabalhistas e, por isso, o número de novas ações era muito maior do que hoje.

Podemos traçar um paralelo com a decisão do STF de 2021, nos autos da ADI 5.766, que invalidou as regras da Reforma Trabalhista que determinavam o pagamento dos honorários periciais e advocatícios por beneficiários da justiça gratuita, caso perdessem a ação.

Após essa decisão, o número de novas reclamações trabalhistas cresceu significativamente no ano seguinte – em 2020 foram propostas 407.373, enquanto em 2022 foram propostas 439.551.[1]

Com a ampliação do acesso à justiça por meio de simples declaração do trabalhador de hipossuficiência e a certeza de concessão do benefício da justiça gratuita pelo juiz, os trabalhadores certamente se sentirão incentivados a recorrer ao Judiciário em 2025 para resolver questões trabalhistas. Com isso, é esperado um novo aumento de reclamações trabalhistas.

Continuaremos acompanhando a evolução jurídica e prática de todos os temas acima.

 


[1] Dados obtidos nas projeções do TST