A licitude da terceirização de atividades-fim das empresas já está pacificada, inclusive no STF, permitindo a contratação de empresas para prestação de serviços relacionados às atividades essenciais e não essenciais das empresas.
As dúvidas, agora, dizem respeito à licitude de contratação de pessoas jurídicas para prestação de serviços, essenciais ou não, ainda que presentes os elementos da relação de emprego.
Em recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Dias Toffoli, na Reclamação 65868 (RCL 65868), cassou uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) que reconheceu o vínculo de emprego entre diretor contratado por intermédio de pessoa jurídica e a empresa contratante.
Apesar de o tema já ser objeto de discussão nos tribunais brasileiros, especialmente nos últimos meses, a decisão fomentou argumentos favoráveis à validade desse tipo de contratação.
Nos recentes julgamentos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 324), da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 48), da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3961) e do Recurso Extraordinário 958252 (Tema 725), o STF reconheceu a licitude de outras formas de organização da força de trabalho para além da relação de emprego.
Com base nessas decisões, o STF tem proferido diversas decisões reconhecendo a legalidade da contratação de prestadores de serviços por intermédio de pessoas jurídicas.[1] Tais decisões determinam, em linhas gerais, que diferentes relações de trabalho podem ser estabelecidas, inclusive a prestação de serviços por pessoa jurídica para a terceirização de atividades-fim das empresas, desde que o contrato seja real e reflita, na prática, a ausência dos requisitos do vínculo de emprego, sobretudo a subordinação.
Por exemplo, na RCL 56285, de relatoria do ministro Roberto Barroso, em 6 de dezembro de 2022:
(...) 4. São lícitos, ainda que para a execução da atividade-fim da empresa, os contratos de terceirização de mão de obra, parceria, sociedade e de prestação de serviços por pessoa jurídica (pejotização), desde que o contrato seja real; isto é, de que não haja relação de emprego com a empresa tomadora do serviço, com subordinação, horário para cumprir e outras obrigações típicas do contrato trabalhista, hipótese em que se estaria fraudando a contratação. 5. Caso em que o reclamante não se trata de trabalhador hipossuficiente, sendo capaz, portanto, de fazer uma escolha esclarecida sobre sua contratação. Inexistente, na decisão reclamada, qualquer elemento concreto de que tenha havido coação na contratação celebrada. 6. Agravo interno a que se nega provimento. (g.n.)
A decisão do ministro Dias Toffoli na RCL 65868 faz, inclusive, referência à decisão acima para cassar a decisão do TRT-15. Nesse caso, porém, o TRT-15, soberano na análise de fatos e provas, constatou que, no caso concreto, o diretor em questão prestava serviços sob subordinação e, com base nisso, manteve a sentença de origem que reconheceu o vínculo de emprego.
A decisão do TRT-15, portanto, não se baseou na ilegalidade intrínseca da contratação de prestadores de serviços por intermédio de pessoas jurídicas. Ela se fundamentou na análise dos fatos que, segundo entendimento dos desembargadores, evidenciavam o trabalho subordinado:
Ora, tendo em vista que ambos (testemunha da ré e autor) eram subordinados ao presidente, a única diferença repousa na maior ou menor flexibilidade de horários de trabalho, o que confirma que a não contratação do reclamante como efetivo empregado decorreu unicamente de opção das reclamadas para fraudar direitos trabalhistas. Diante de todo o exposto, não há outra conclusão a ser alcançada senão a de que a contratação do autor por meio de empresa constituída exclusivamente para esse fim (fenômeno conhecido como "pejotização") foi perpetrada com o evidente intuito de fraudar direitos previstos na legislação trabalhista. É de rigor, pois, o reconhecimento de nulidade do expediente praticado (art. 9º da CLT) e consequente declaração do vínculo empregatício durante todo o período de prestação de serviços, inclusive porque presentes todos os requisitos legais necessários ao reconhecimento da relação de emprego. (g.n.)
Assim, ainda que o STF tenha proferido diversas decisões reconhecendo a validade de outras formas de contratação que não sejam o vínculo de emprego, essa validação não é absoluta. A licitude dessa contratação está condicionada à inexistência dos elementos característicos do vínculo de emprego.
Fica claro, portanto, que o tema ainda precisa ser melhor debatido para trazer maior segurança jurídica às formas de contratação que não envolvam somente o vínculo de emprego.
No cenário atual, ainda não há segurança jurídica suficiente para afirmar que o STF considera lícita qualquer forma de contratação de prestação de serviços por intermédio de pessoa jurídica.
Entendemos que a melhor interpretação das decisões proferidas pelo STF até o presente momento é a de que formas de contratação diferentes do vínculo empregatício são válidas, desde que os elementos desse vínculo não estejam presentes no caso concreto.
Continuaremos acompanhando o tema.
[1] Rcl: 58583, Rcl: 56453, Rcl: 60436, Rcl: 57057, Rcl: 59735.