O Superior Tribunal de Justiça (STJ) se posicionou recentemente sobre tema controverso que é alvo de dúvidas e inseguranças: se o recurso cabível contra decisões proferidas em sede de cumprimentos e de liquidações de sentença é o agravo de instrumento ou o recurso de apelação.
Diferentemente da sistemática do CPC/1973,[1] o CPC/2015 trouxe em seu artigo 1.015 hipóteses específicas de cabimento de agravo de instrumento cuja interpretação taxativa ainda está em debate nos tribunais pátrios. O objetivo deste texto é discorrer sobre o parágrafo único do referido artigo que prevê o cabimento de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de cumprimento e de liquidação de sentença, bem como no processo de execução e de inventário.
Com a previsão de manejo de recurso de agravo de instrumento livremente para impugnar decisões interlocutórias proferidas na fase de cumprimento de sentença – e aqui cabe paralelo com o §3º do artigo 475-M[2] do CPC/1973, que considerava cabível agravo de instrumento contra decisões que resolviam a impugnação ao cumprimento de sentença, salvo as que impunham a sua extinção, passíveis de recurso de apelação –, o CPC/2015 não determinou expressamente qual é o recurso cabível contra decisão que resolve a impugnação ao cumprimento de sentença, se agravo de instrumento ou recurso de apelação.
Além dessa questão, o entendimento desarmônico dos tribunais a respeito do tema, possivelmente influenciado pelos dispositivos do CPC/1973, finalmente parece ter alcançado diretriz uníssona no STJ.
No julgamento do Recurso Especial nº 1.698.344/MG, de relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, a Quarta Turma do STJ reformou decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais para conhecer recurso de apelação interposto contra decisão que acolheu impugnação ao cumprimento de sentença. Nesse sentido, estabeleceu que decisões que acolhem parcialmente ou rejeitam a impugnação apresentada são passíveis de interposição de agravo de instrumento, pois o procedimento executivo de cumprimento ou de liquidação de sentença terá prosseguimento.
De acordo com a lógica interpretativa do CPC/2015, lecionada no acórdão publicado em 1º de agosto deste ano, o artigo 1.015 afirma expressamente que o agravo de instrumento é cabível contra decisões interlocutórias, ao passo que o artigo 1.009 dispõe sobre o cabimento de apelação em face de sentença. Nesse sentido, é importante questionar qual a natureza do decisum proferido no cumprimento e na liquidação de sentença. Para sentença, o acórdão destaca que, na sistemática processual atual, há dois critérios previstos no §1º do artigo 203[3] do CPC/2015: (i) conteúdo equivalente a uma das situações previstas nos artigos 485 ou 489; e (ii) encerramento de fase processual, de conhecimento ou execução. Decisão interlocutória, por sua vez, é todo pronunciamento de natureza decisória que não se enquadre no §1º, conforme disposto no §2º do artigo 203 do CPC/2015.
Assim, destacando que “se extinguir a execução, será sentença, conforme citado artigo 203, §1º, parte final; caso contrário, será decisão interlocutória, conforme art. 203, §2º, CPC/2015”, a Quarta Turma concluiu que “a execução será extinta sempre que o executado obtiver, por qualquer meio, a supressão total da dívida (art. 924 CPC/2015), que ocorrerá com o reconhecimento de que não há obrigação a ser exigida, seja porque adimplido o débito, seja pelo reconhecimento de que ele não existe ou se extinguiu”, passível, portanto, de recurso de apelação.
Nessa linha, o STJ firmou entendimento de que, para decisões que acolhem parcialmente a impugnação ou a ela neguem provimento, caberá a interposição de agravo de instrumento, por não acarretarem a extinção da fase executiva em andamento e, portanto, serem decisões de caráter interlocutório. Já a decisão que extingue a fase executiva deve ser impugnada por meio de recurso de apelação.
O entendimento do STJ sobre o tema, fundamentado na lógica processual do CPC/2015, traz maior segurança à interposição de recursos contra decisões proferidas em processos de caráter executivo e muito contribui para evitar a via inadequada de impugnação de decisões com minimização de prejuízo ao jurisdicionado.
[1] O artigo 522 do CPC/73 permitia à parte interpor agravo de instrumento contra toda e qualquer decisão suscetível de causar dano grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e em relação aos seus efeitos.
[2] “Art. 475-M. A impugnação não terá efeito suspensivo, podendo o juiz atribuir-lhe tal efeito desde que relevantes seus fundamentos e o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação. § 3. A decisão que resolver a impugnação é recorrível mediante agravo de instrumento, salvo quando importar extinção da execução, caso em que caberá apelação”.
[3] “Art. 203. Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. § 1o Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”.