O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) publicou a Resolução CNMP 300/24, que disciplina a atuação das promotorias estaduais do Ministério Público no velamento das fundações de direito privado.
Com base no artigo 66 do Código Civil[1] e diante da regulamentação esparsa ou inexistente das promotorias estaduais, a Resolução CNMP 300/24 busca padronizar procedimentos para garantir maior eficácia, previsibilidade e transparência ao velamento, ou fiscalização, das fundações privadas. Antes da resolução, várias promotorias estaduais não tinham resoluções específicas para regulamentar sua atuação no velamento das fundações,[2] que passam a ser regidas agora pelas novas disposições.
Embora a resolução traga uniformização, compete à promotoria de cada estado publicar seus próprios atos normativos, conforme as peculiaridades locais. Portanto, a Resolução CNMP 300 não retirou a autonomia local, apenas definiu e uniformizou a competência do Ministério Público no velamento das fundações.
Nos termos da resolução, compete a cada unidade estadual do Ministério Público velar as fundações que atuem no respectivo território estadual ou distrital, exceto em alguns casos específicos: fundações públicas de direito privado com contas prestadas ao Tribunal de Contas, fundações de direito privado estrangeiras autorizadas a funcionar no país e que não recebam verbas brasileiras de qualquer natureza, fundações de previdência complementar e outras fundações excluídas do regime de velamento por expressa previsão legislativa.
No exercício de velamento, devem ser observados os seguintes princípios:
- a presunção de boa-fé dos gestores funcionais;
- uniformização dos bancos de dados e informações;
- transparência dos atos administrativos;
- redução da burocracia;
- concentração e previsibilidade dos atos decisórios;
- amplo acesso à informação, com a proteção da intimidade e observância do sigilo constitucional; e
- fomento à recuperação econômico-financeira das fundações.
Quanto aos atos de velamento, o artigo 4º da Resolução CNMP 300/24 lista exaustivamente as competências da Promotoria, com destaque para:
- Requisição de documentos necessários ao exercício da função de velamento, especialmente para análise das prestações de contas – sem especificar limites dos requerimentos;
- Requisição judicial ou extrajudicial de intervenção na administração, remoção e responsabilização de dirigentes, em caso de gestão irregular, seja por violação legal ou estatutária, malversação ou qualquer outro ato lesivo aos interesses fundacionais;
- Expedição de recomendações visando ao saneamento de impropriedades ou aprimoramento dos serviços, com a fixação de prazo para a adoção das providências cabíveis; e
- Instauração de procedimentos investigatórios para apurar indícios de irregularidades.
Observa-se um destaque significativo à importância de o Ministério Público acompanhar de forma rigorosa o funcionamento das fundações, garantindo que estejam alinhadas com seus objetivos e que seus atos sejam fiscalizados quanto à legalidade e pertinência.
Quanto à obrigação de prestação de contas pelas fundações privadas, a Resolução CNMP 300/24 determina que cada promotoria estabeleça critérios próprios, desde que garantam a transparência e a legalidade do procedimento adotado, sem contrariar as disposições da resolução.
No caso de necessidade de retificação ou esclarecimentos das contas prestadas, a resolução fixou prazo de 45 dias para cumprimento das diligências, prorrogável apenas com justificativa fundamentada.
A resolução também veta a reavaliação de contas já prestadas e apreciadas pelo Ministério Público, salvo nos casos de contas rejeitadas por ausência de requisitos formais ou por inconsistências contábeis. Nessas hipóteses, a contas podem ser objeto de nova análise desde que as pendências e irregularidades sejam resolvidas.
A Resolução CNMP 300/24 inovou ao prever a possibilidade de interposição de recurso, no prazo de 15 dias, contra decisões de mérito proferidas pela promotoria estadual, com análise do órgão revisor de cada Ministério Público. A título de exemplo, as resoluções que tutelam a atuação do Ministério Público de Minas Gerais e de São Paulo, embora sejam extensas, não estipulam um procedimento recursal envolvendo as decisões proferidas pelo órgão.
No caso do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, já era possível a interposição de recurso no prazo de dez dias, mas apenas contra alguns tipos de decisões:
- Apreciação ou alteração de ato de instituição, dotação e de estatutos;
- Apreciação de contas;
- Apreciação de pedido de autorização ou aprovação de atos de administração; e
- Outras deliberações finais.
Portanto, a Resolução CNMP 300/24 não apenas estendeu o prazo previsto, aplicando a regra mais favorável ao recorrente,[3] mas também ampliou o escopo recursal.
Com o escopo de velamento das fundações privadas devidamente regulamentado pela Resolução CNMP 300/24, o Ministério Público deve seguir os limites legais estabelecidos, e as fundações privadas não podem questionar as competências que sejam exercidas pelo órgão nos termos da regulamentação vigente. O próximo passo é acompanhar a aplicação da resolução no cotidiano das fundações privadas e a forma como o Ministério Público interpretará os artigos da norma.
[1] Art. 66. Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas.
- 1 º Se funcionarem no Distrito Federal ou em Território, caberá o encargo ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
- 2º Se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao respectivo Ministério Público.
[2] Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins.
[3] Resolução nº 300. Art. 42, § 2º Caso na legislação local seja estipulado, para interposição do recurso de que trata este artigo, prazo diverso do previsto no caput, prevalecerá a disposição mais benéfica ao recorrente.