O STF reconheceu a constitucionalidade da CSLL em 1º de julho de 1992, por meio da decisão proferida no RE nº 138.284/CE. Tal posicionamento foi confirmado de maneira consolidada na ADI nº 15/DF, julgada em 14 de junho de 2007. Desde então, no entanto, há uma controvérsia em torno dos efeitos da decisão do STF para contribuintes que têm em seu favor decisão judicial transitada em julgado que reconheceu a inconstitucionalidade da norma. Não está claro, no caso, se haveria uma data limite para a aplicação das decisões judiciais e, em caso positivo, qual seria essa data. Tudo isso vem gerando dúvidas na atuação do contribuinte e da Receita Federal.
Há, no momento, repercussões gerais reconhecidas que poderiam, em tese, sanar essas dúvidas. Primeiramente, o RE 949297, tema 881,[1] já está liberado para julgamento, porém sem movimentações no sentido de sua efetiva inclusão em pauta. Em estágio anterior, o RE 955227, tema 885,[2] não está ainda liberado para julgamento.[3]
Se por um lado não é possível contar até o momento com posicionamento do STF sobre o tema, há decisão do STJ que, a princípio, poderia resolver a questão. Como bem delimitado no julgamento na sistemática de recursos repetitivos, restou assentado no REsp nº 1.118.893/MG que “o fato de o Supremo Tribunal Federal posteriormente manifestar-se em sentido oposto à decisão judicial transitada em julgado em nada pode alterar a relação jurídica estabilizada pela coisa julgada, sob pena de negar validade ao próprio controle difuso de constitucionalidade”.
Ocorre que a aplicação do repetitivo tem se mostrado controversa. O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), por meio da Câmara Superior de Recursos Fiscais, é a última instância administrativa que realiza a análise de matérias tributárias no âmbito da União. O órgão analisou diversos casos em que se discute a tributação da CSLL nos termos acima. Desde abril de 2016, a jurisprudência vem se consolidando no sentido de que a decisão tomada no REsp nº 1.118.893/MG não tem o condão de afastar certas autuações realizadas. Explica-se.
O posicionamento exposto pelo contribuinte, tanto em âmbito administrativo quanto em âmbito judicial, se pauta principalmente nos efeitos da coisa julgada e no princípio da segurança jurídica. Reafirmando o que foi exposto pelo STJ no REsp nº 1.118.893/MG, as decisões posteriores tomadas pelo STF não teriam o condão de alterar a coisa julgada individual do contribuinte, em especial em casos nos quais o prazo revisional por meio de ação rescisória tenha se encerrado.
Contraditando os principais argumentos da Fazenda Nacional, o contribuinte entende que a Súmula do STF nº 239,[4] ao analisar o contexto jurídico à época de sua elaboração, tinha como foco ações repressivas contra cobranças específicas, não ações que confirmariam a inexistência de uma relação jurídica, estas muito mais abrangentes que as primeiras. Além disso, as alterações posteriores das leis que regem a CSLL não configurariam mudanças substanciais na legislação analisada na ação judicial individual. Nesse sentido, o “estado de direito” sobre o qual foi realizada a análise da inconstitucionalidade do tributo permanece sem alterações.
Por outro lado, o posicionamento da PGFN se pauta essencialmente na construção lógica do Parecer PGFN/CRJ nº 492/2011. Conforme a análise contida no parecer, a jurisprudência do STF leva ao entendimento de que deve haver uma relativização da coisa julgada individual para eventos futuros, quando esta contrasta com um entendimento posteriormente expedido pelo STF em precedente “objetivo e definitivo” e de eficácia vinculante. A justificativa para essa relativização para eventos futuros se dá em especial deferência ao princípio da isonomia e livre concorrência, para evitar uma disparidade entre contribuintes ad aeternum.
No caso concreto da CSLL, haveria uma alteração no cenário fático das decisões transitadas em julgado – a maioria delas obtida durante a década de 1990 – em relação ao cenário sobre o qual foi realizado o exame de constitucionalidade na ADI 15/DF, julgada apenas em 2007, tendo em vista as alterações legislativas posteriores. Essa modificação justificaria ainda que a coisa julgada obtida não abarcasse anos posteriores.
Assim, não haveria que se falar de ofensa à coisa julgada. Ela abrangeria apenas o período até as alterações legislativas posteriores, sendo respeitada em sua integralidade. Nesse mesmo sentido, o REsp nº 1.118.893/MG teria analisado a CSLL apenas em sua redação com as alterações até 1992. Sua aplicação não seria passível para o período das alterações de 1995 em diante.
Administrativamente, a Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf tem analisado a questão e decidido pela possibilidade da cobrança de CSLL,[5] mesmo quando o contribuinte obteve decisão favorável transitada em julgado. Em tais processos são analisados inclusive períodos anteriores à decretação de inconstitucionalidade pelo STF na ADI nº 15/2007, fazendo menção ao julgamento do RE nº 138.284/CE, de 1992, pelo STF.
De acordo com o posicionamento atual administrativo, haveria a possibilidade de cobrança de CSLL para fatos geradores posteriores a 1995, apesar da decisão individual transitada em julgado. Por outro lado, com base no entendimento defendido pelo contribuinte, o posicionamento exposto no REsp nº 1.118.893/MG garantiria o direito de não recolher o tributo até o presente momento.
A celeuma atual se deve à ausência de um posicionamento consolidado e leva invariavelmente a uma insegurança jurídica para os contribuintes. Espera-se que o STF, ao analisar a discussão, leve em conta ambos os argumentos e consiga determinar uma solução efetiva para os casos concretos, dirimindo a divergência existente.
1. 881 - Limites da coisa julgada em matéria tributária, notadamente diante de julgamento, em controle concentrado pelo Supremo Tribunal Federal, que declara a constitucionalidade de tributo anteriormente considerado inconstitucional, na via do controle incidental, por decisão transitada em julgado.
2. 885 - Efeitos das decisões do Supremo Tribunal Federal em controle difuso de constitucionalidade sobre a coisa julgada formada nas relações tributárias de trato continuado.
3. Tendo em vista a determinação da suspensão do trâmite de todos os processos que tratassem dos temas 881 e 885, as recentes decisões do STJ são no sentido do sobrestamento dos feitos, conforme realizado por exemplo no ERESP nº 841.818 e no EAg nº 991.788.
4. Decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores.
5. Referências recentes, os acórdãos 9101-003.531, 9101-003.472 e 9101-003.496.