A Lei 14.939/24, publicada em 31 de julho, flexibiliza a comprovação da ocorrência de feriado local no momento da interposição de recursos. A alteração legal modifica o parágrafo 6º[1] do artigo 1.003 do Código de Processo Civil de 2015 (Lei 13.105/15).

O dispositivo mencionado estabelecia a necessidade de comprovar a ocorrência de feriado local quando da interposição do recurso especial. Caso essa obrigação não fosse cumprida, o recurso seria considerado intempestivo. O que se alegava é que os tribunais superiores não são obrigados a conhecer todos os feriados em âmbito local.

O tema era alvo de incessantes críticas dos advogados e de debates nos tribunais, em especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A situação ocorria porque o CPC de 2015 consagrou a regra de sanabilidade dos vícios formais dos recursos e privilegiou expressamente o princípio da primazia no julgamento de mérito.

Apesar disso, o STJ, inclusive por meio da Corte Especial, analisou a questão em diversas ocasiões e consolidou o entendimento de que a falta de documento oficial comprovando o feriado local, recesso, paralisação ou interrupção do expediente forense, no momento da interposição do recurso, é vício grave e insanável. No entendimento do STJ, o próprio CPC não considerava suficiente a mera menção do feriado e/ou a comprovação em momento posterior.

A alteração trazida pela Lei 14.939/24, portanto, é muito importante e põe fim à discussão no âmbito dos tribunais. Com a nova redação do artigo 1.003, parágrafo 6º, do CPC, a partir de agora, se não for apresentada comprovação do feriado local, o tribunal poderá:

  • intimar a parte recorrente para corrigir o vício formal; ou
  • ignorar a omissão, caso o feriado conste no processo eletrônico.

Em termos práticos, isso significa que a parte recorrente não precisará mais comprovar o feriado local no momento da apresentação do recurso. Além de acabar com a punição imediata – a declaração de intempestividade do recurso –, a mudança na norma privilegia a essência do Código de Processo Civil de 2015.

Apesar da importância e dos efeitos da nova lei, é preciso acompanhar as possíveis discussões sobre a aplicação dessa norma de caráter processual aos processos judiciais em curso. Isso se deve ao fato de o CPC adotar a teoria do isolamento dos atos processuais, de modo que as normas de caráter processual têm aplicação imediata aos processos pendentes – como disposto nos artigos 14 e 1.046 do CPC e no artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

Resguardam-se, por outro lado, os atos processuais já praticados e as situações consolidadas sob a vigência da norma revogada, amparado, sobretudo, no ato jurídico perfeito, direito adquirido ou coisa julgada (art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal).

Em algumas ocasiões semelhantes, o STJ entendeu que, em caso de norma processual, a regra tem aplicação imediata aos processos em curso. Isto é, a lei nova deve respeitar os atos processuais já realizados e consumados, incidindo sobre àqueles que estão pendentes e não podendo retroagir para prejudicar direitos processuais adquiridos.

A alteração trazida pela Lei 14.939/24 abre espaço para novos questionamentos no Poder Judiciário. É importante acompanhar as decisões futuras sobre a aplicação (ou não) do dispositivo aos processos pendentes que envolvam a discussão sobre a tempestividade do recurso pela falta de comprovação do feriado local.

 


[1] “Art. 1.003. O prazo para interposição de recurso conta-se da data em que os advogados, a sociedade de advogados, a Advocacia Pública, a Defensoria Pública ou o Ministério Público são intimados da decisão.

[...] § 6º O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso.”