Sancionada em agosto, a Lei nº 14.195/21 (Lei do Ambiente de Negócios) traz expectativa de desburocratização para as empresas brasileiras e incentivo a investimentos no país. O texto é resultado da conversão da Medida Provisória nº 1.040/21, editada pelo governo federal para melhorar a posição ocupada atualmente pelo país – 124º lugar – no ranking Doing Business do Banco Mundial.

Entre as mudanças legislativas de natureza societária introduzidas pela lei, destaca-se a facilitação do procedimento de abertura de empresas. Um dos aspectos de maior relevância do texto legal refere-se à possibilidade de emissão automática de licenças e alvarás de funcionamento (sem análise humana) para atividades de risco médio, desde que o empresário, sócio ou responsável legal pela sociedade[1] assine um termo de ciência e responsabilidade.

A classificação de risco levará em conta as legislações estaduais, distritais e municipais específicas. Na hipótese de ausência de regramento legal, a definição será baseada na classificação da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim).[2] Além disso, a Lei do Ambiente de Negócios prevê a dispensa do reconhecimento de firma em atos arquivados nas juntas comerciais[3] e proíbe, no processo de registro de empresários realizado pela Redesim, solicitar dados ou informações que já constem na base de dados do governo federal.[4]

A Lei do Ambiente de Negócios também altera importantes aspectos da Lei nº 6.404/76 (Lei das S/A). A primeira alteração refere-se à previsão de voto plural para uma ou mais classes de ações, a fim de permitir que acionista não majoritário possa controlar a sociedade.[5] Tal previsão não se aplica, no entanto, às sociedades controladas direta ou indiretamente pelo poder público, às empresas públicas e às sociedades de economia mista e suas subsidiárias. Houve também aumento da proteção aos acionistas minoritários.

Por meio dos incisos I e II do parágrafo 1º do artigo 124 da Lei das S/A, a nova lei alterou os prazos mínimos para a convocação da assembleia geral de acionistas, que passam a ser de:

  • no caso de companhia fechada, 8 dias de antecedência para a primeira convocação e 5 dias de antecedência para a segunda convocação; e
  • no caso de companhia aberta, 21 dias de antecedência para a primeira convocação e 8 dias de antecedência para a segunda convocação.

O art. 124, parágrafo 5º, inc. I, prevê ainda que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) poderá, de ofício ou a pedido de qualquer acionista, e após ouvir a companhia, determinar o adiamento de assembleia geral por até 30 dias, caso as informações fornecidas sejam insuficientes para deliberação.

Com a inclusão do inciso X no artigo 122 da Lei das S/A, caberá à assembleia geral de acionistas deliberar sobre a celebração de transações com partes relacionadas, a alienação ou contribuição de ativos para outra empresa, caso o valor da operação corresponda a mais de 50% do valor dos ativos totais da companhia apontados no último balanço aprovado.

Em relação às companhias abertas, foram inseridos os parágrafos 3⁰ e 4⁰ no artigo 138 da Lei das S/A, proibindo a acumulação dos cargos de presidente do conselho de administração e do cargo de diretor-presidente ou de principal executivo da companhia[6] e possibilitando à CVM excepcionar essa regra para as companhias abertas com “menor porte”, com base nos termos de sua regulamentação.

Além disso, a Lei do Ambiente de Negócios inseriu o parágrafo 2⁰ no artigo 140 da Lei das S/A, por meio do qual tornou obrigatória para as companhias abertas a participação de conselheiros independentes, nos termos e nos prazos a serem definidos pela CVM. Essa regra já era observada como boa prática de governança corporativa, mas passou a ser legalmente exigível com a nova lei.

Na tentativa de impulsionar a arrecadação tributária, o texto original enviado para sanção do presidente da República previa a extinção das sociedades simples no ordenamento jurídico brasileiro – tema de intenso debate na comunidade jurídica. Contudo, a disposição foi vetada[7] pelo presidente da República, decisão celebrada por diversas entidades – especialmente aquelas ligadas a profissionais liberais.

Apesar desse veto, o presidente sancionou a extinção da empresa individual de responsabilidade limitada (Eireli), o que já era esperado, tendo em vista que, antes mesmo da criação do formato de sociedade limitada unipessoal, instituído pela Lei Federal nº 13.874/19 (Lei da Liberdade Econômica)[8], o formato Eireli já estava em desuso.

A nova lei não deve ser totalmente capaz de produzir efeitos práticos imediatos, já que determinados aspectos dependem de regulamentações e portarias específicas dos órgãos responsáveis. De qualquer forma, o texto representa um importante passo para a retomada da atividade econômica no Brasil, fomentando o empreendedorismo ao promover a desburocratização de procedimentos e incorporando valores introduzidos pela Lei da Liberdade Econômica, de 2019.

 


[1] Art. 6º-A, caput e §1º da Lei nº 11.598/07.

[2] Art. 5º-A, caput da Lei nº 11.598/07.

[3] Art. 63 da Lei nº 8.934/94.

[4] Art. 11-A da Lei nº 11.598/07.

[5] Art. 16 c/c 110-A da Lei nº 6.404/76.

[6] Essa previsão somente produzirá seus efeitos em 360 dias contados de 27/08/2021.

[7]De acordo com a mensagem de veto, o dispositivo contraria os interesses públicos por mudanças profundas no regime societário, submetendo parcela significativa da população economicamente ativa a indesejados reflexos tributários nas legislações municipais e a custos de adaptação.

[8] Código Civil: “Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.

  • 1º A sociedade limitada pode ser constituída por 1 (uma) ou mais pessoas”.