Um dos temas mais importantes relacionados ao direito coletivo do trabalho é a estabilidade daqueles que se dedicam à representação de classe, o que abrange não só os empregados vinculados às entidades sindicais, mas também aqueles que fazem parte de cooperativas.
Embora o movimento corporativista tenha suas origens na Revolução Industrial, ele só foi introduzido no Brasil por volta dos anos 1900. O primeiro diploma legal sobre o tema surgiu em 1907, com o Decreto 1.637/1907, que regulava ao mesmo tempo os sindicatos e as cooperativas.
A regulamentação dos sindicatos evoluiu ao longo dos anos e, em 1943, foi incluída na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), cujas disposições relacionadas ao tema visaram não só regular e dispor minuciosamente a respeito das regras da organização sindical, como também proteger os empregados sindicalistas, a fim de garantir o direito de reivindicação pelos trabalhadores.
Como uma das medidas (Art. 543, § 3º, da CLT), vedou-se a dispensa do empregado sindicalizado a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação de entidade sindical até um ano após o fim do seu mandato.
As cooperativas, por sua vez, ficaram fora da CLT e foram objeto de poucas alterações legislativas nos anos seguintes. Foi apenas em 1971, quase 30 anos após a entrada em vigor da CLT, que a Lei 5.764/71 (Lei de Cooperativas) foi promulgada, trazendo definitivamente o cooperativismo para o ordenamento jurídico brasileiro. O art. 55 da lei conferiu aos diretores dessas sociedades as mesmas garantias asseguradas aos dirigentes sindicais pelo artigo 543 da CLT – entre elas, a estabilidade.
Embora a redação da lei não deixe dúvidas a respeito da vedação de dispensa dos dirigentes de cooperativas, colocando como único requisito o fato de se tratar de cooperativa por eles mesmos constituídas, o tema é bastante polêmico e vem sendo amplamente discutido nas cortes trabalhistas.
Conforme já assentado pela doutrina e jurisprudência, a finalidade da estabilidade conferida aos dirigentes sindicais é justamente garantir a efetividade da representação sindical. Isso significa dar condições aos trabalhadores para se candidatar e ser eleitos livremente por seus pares para representar uma categoria, com o objetivo de reivindicar melhores condições de trabalho sem sofrer qualquer tipo de retaliação por parte dos empregadores.
Ocorre, no entanto, que tal premissa não pode ser aplicada de forma indiscriminada aos diretores de cooperativas de qualquer natureza, já que nem todas elas são criadas com a mesma finalidade de proteção e desenvolvimento da categoria, como os sindicatos.
De acordo com o Anuário do Cooperativismo Brasileiro publicado em 2021, o Brasil tinha em 2020 4.868 cooperativas, das quais apenas 685 eram do segmento de trabalho e emprego, cujo objetivo é a promoção de cursos para aperfeiçoamento profissional e auxílio a trabalhadores na recolocação e busca de vagas.
Ou seja, apenas 14% das cooperativas existentes em 2020 tinham como finalidade a promoção de melhores condições para a categoria. As outras quase 86% eram destinadas ao consumo de bens e serviços, transporte, entre outras atividades sem qualquer relação com a proteção dos trabalhadores.
Assim, o reconhecimento da estabilidade de todo e qualquer diretor de cooperativa indistintamente, sem preocupação com a natureza e a finalidade da cooperativa a qual ele está vinculado desvirtua por completo o objetivo da norma, estimulando a criação fraudulenta de entidades única e exclusivamente com o fito de conseguir a estabilidade para seus dirigentes.
O assunto é objeto de divergência entre tribunais. Se antes a jurisprudência da Corte Trabalhista adotava, em sua maioria, posição mais conservadora sobre a concessão de estabilidade a dirigentes de cooperativas com base unicamente no art. 55 da Lei 5.764/71, hoje cresce a jurisprudência que reconhece a necessidade de uma análise mais criteriosa sobre objetivos da instituição antes de endossar a estabilidade aos diretores. Foi justamente nesse sentido a recente decisão proferida pela 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho.
No caso, discutia-se a estabilidade de diretor eleito para cooperativa de consumo. O Tribunal Regional da 17ª Região já havia rejeitado o pedido de reconhecimento de estabilidade do ex-empregado tendo em vista que a cooperativa objetivava o comércio varejista de material de construção em geral para que seus associados conseguissem melhores preços nos produtos. Ou seja, a atuação dos diretores da entidade, incluindo o autor da ação, não visava à defesa ou representação dos interesses dos integrantes da categoria profissional. Portanto, não havia justificativa para o reconhecimento da estabilidade.
Com o mesmo entendimento, a 4ª Turma do TST manteve a improcedência do pleito. Conforme decisão de relatoria do ministro Caputo Bastos, o “direito à estabilidade não é uma garantia pessoal do diretor de cooperativa nem resulta do simples fato de ele ocupar essa posição, mas uma prerrogativa conferida à categoria profissional, para que o dirigente tenha condições de defender os interesses dos trabalhadores associados”.
Embora algumas decisões reconheçam a estabilidade com o argumento de que o artigo 55 da Lei de Cooperativas não restringe a estabilidade a determinado tipo de cooperativa, a lei não pode ser aplicada de forma indistinta, sem qualquer tipo de interpretação, especialmente quando se está diante de uma norma que estabelece restrição a um direito legalmente previsto.
Esse é justamente o caso das normas que conferem estabilidade a determinados tipos de empregados. Elas restringem o poder diretivo do empregador, conferido pelo artigo 2° da CLT, bem como o princípio da liberdade econômica, impedindo a empresa de exercer uma prerrogativa básica da relação de emprego: a rescisão contratual sem justa causa.
Admite-se tal restrição tendo em vista que as estabilidades geralmente são conferidas em situações específicas, nas quais o empregado fica em posição de extrema vulnerabilidade em relação ao empregador.
Por esse motivo, é vital a moderação do Judiciário na análise do tema para que a estabilidade conferida aos diretores de cooperativas de maneira irrestrita não acabe por violar o poder diretivo do empregador e banalizar a finalidade da norma, desprestigiando os legítimos detentores do direito.