O Ministério da Saúde (MS) publicou, em 21 de junho, as portarias MS 4.472/24 e MS 4.473/24, que regulamentam o programa de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) e o Programa de Desenvolvimento da Inovação Local (PDIL), respectivamente.

As novas regulações são resultado das consultas públicas MS 53/23MS 54/23, que receberam contribuições entre dezembro de 2023 e março de 2024.

De acordo com o anúncio feito pelo MS durante a reunião do Grupo Executivo do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (Ceis) em 18 de junho, as entidades interessadas terão até o fim de setembro para submeterem propostas de projetos no âmbito do programa para PDPs e do Programa de Desenvolvimento da Inovação Local (DIL), por meio de formulário que estará disponível no site do MS.

As áreas que serão analisadas com prioridade incluem:

  • preparação para emergências sanitárias (como dengue);
  • produtos com risco de desabastecimento;
  • saúde digital; e
  • contribuições ao Programa Mais Acesso a Especialistas e ao Programa Nacional de Redução de Filas (como oncologia, cardiologia, ortopedia e oftalmologia).

Principais aspectos do novo regulamento de PDP

De acordo com a Portaria MS 4.472/24, as PDPs envolverão a cooperação entre instituição(ões) pública(s) IP(s) e/ou instituições científicas, tecnológicas e de inovação ICT(s) e entidade(s) privada(s) para desenvolvimento, transferência e absorção de tecnologia, capacitação produtiva e tecnológica, visando a produção local de tecnologias e produtos estratégicos para atender a demandas do Sistema Único de Saúde (SUS).

São elegíveis para projetos de PDP as soluções produtivas e tecnológicas para o SUS listadas na Matriz de Desafios Produtivos e Tecnológicos em Saúde e que atendam aos seguintes requisitos:

  • registro sanitário ou perspectiva de submissão em até 36 meses – a partir da data de submissão da proposta de projeto;
  • ausência de restrição de patente que impacte o arranjo proposto ou perda da restrição em até 36 meses a partir da data de submissão da proposta de projeto;
  • aquisição centralizada ou passível de centralização ou aquisição por meio de programas, medidas, iniciativas e ações específicas coordenadas pelo MS, no âmbito do Ceis; e
  • elevada dependência de importações ou previsão de descontinuação do produto.

São elegíveis para participar de PDPs as IPs ou ICTs e as entidades privadas desenvolvedoras, detentoras, transferidoras ou receptoras da tecnologia (EPs).

A entidade privada nacional poderá, simultaneamente, atuar como receptora e transferidora da tecnologia em um mesmo projeto de PDP, desde que a produção ocorra localmente.

De acordo com a Portaria MS 4.472/24, as fases da PDP serão as seguintes:

  • Proposta de projeto de PDP. Submissão dos projetos, análise pelo MS, pela Comissão Técnica de Avaliação (CTA) e pelo Comitê Deliberativo (CD) do Ceis, com a publicização do resultado e assinatura dos termos de compromisso para projetos aprovados.
  • Projeto de PDP. Preparação para a transferência tecnológica entre os parceiros, incluindo a realização de treinamentos e conclusão do desenvolvimento do produto para a absorção do conhecimento científico e tecnológico envolvido na parceria. Essa fase tem início com a publicação do extrato do termo de compromisso no Diário Oficial da União (DOU) pelo MS e finaliza com a publicação do instrumento de formalização da primeira aquisição do produto.
  • Transferência e absorção de tecnologia, produção inicial e aquisição pelo MS. Etapa de transferência tecnológica, produção nacional, aquisição do produto ou serviço pelo MS, fornecimento do produto objeto da PDP pela instituição pública/ICT. Essa fase tem início com a publicação do instrumento de formalização da primeira aquisição do produto pelo Ministério da Saúde e finaliza após o prazo aprovado pelas instâncias colegiadas para internalização da tecnologia.
  • Verificação da internalização da tecnologia. Comprovação do domínio da tecnologia/plataforma estratégica. Essa fase tem início imediatamente após o encerramento da fase III e finaliza com a publicação no DOU do extrato do termo de deliberação de internalização da tecnologia.

Em relação ao processo de avaliação e classificação das propostas de projetos de PDP, destacam-se os seguintes critérios:

  • menor prazo para internalização da tecnologia e produção pela IP/ICT;
  • histórico de internalização de produtos objeto de PDP ao portfólio da IP/ICT;
  • previsão de investimento público para execução da PDP, assim como investimentos pela EP;
  • disponibilidade das plataformas tecnológicas, produtivas certificadas e compatíveis com o projeto proposto e atividades executadas;
  • menor proposta de preço global, considerando preço inicial, representatividade da escala decrescente dos valores e viabilidade do projeto;
  • apresentação de soluções produtivas e tecnológicas para o SUS que impliquem transferência de tecnologia, com sinergia para tecnologias futuras;
  • menor prazo para produção com insumo farmacêutico ativo (IFA), componente tecnológico crítico (CTC) ou dispositivo tecnológico (DT) nacional;
  • alinhamento ao Programa de Produção e Desenvolvimento Tecnológico para Populações e Doenças Negligenciadas (PPDN) ou Programa para Preparação em Vacinas, Soros e Hemoderivados (PPVACSH).
  • grau de verticalização de etapas produtivas do(s) IFA, CTC ou DT associado(s) à forma farmacêutica para o parque fabril nacional.

Principais aspectos do regulamento de PDIL

A Portaria MS 4.473/24 estabelece que são elegíveis ao PDIL as soluções que constem na Matriz de Desafios Produtivos e Tecnológicos em Saúde e promovam a produção e o desenvolvimento tecnológico, territorial e a inovação local.

Os projetos também devem promover ações de capacitação para ICTs, produtores públicos, entidades privadas sem fins lucrativos, startups e empresas públicas, além de contribuir para a transformação digital e ecológica e para a sustentabilidade do Ceis.

Considera-se inovação local a introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços ou processos ou que agregue novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente, capaz de resultar em melhorias e em ganho efetivo de qualidade ou desempenho para produção no Brasil.

De acordo com a nova regra, o PDIL poderá ser implementado com fomento de projetos de inovação local, por meio de convênios, termos de execução descentralizada (TED), encomendas tecnológicas (termo que não foi definido na norma), contratos públicos para solução inovadora, acordos de compensação tecnológica e outros instrumentos correlatos.

Os seguintes critérios serão considerados para avaliação do mérito de propostas de projeto de PDIL:

  • adequação do cronograma de execução das etapas do projeto e plano detalhado de aplicação dos recursos;
  • capacidade tecnológica e produtiva da proponente e dos parceiros para execução da proposta de projeto, considerando as capacitações existentes e os investimentos previstos pelos parceiros;
  • disponibilidade de recursos humanos qualificados para a execução do projeto, considerando as capacitações existentes e os investimentos previstos pelos parceiros;
  • caráter inovador, benefício clínico ou benefício para o sistema de saúde;
  • relevância das contrapartidas para o SUS;
  • previsão de outras fontes de recursos para viabilizar o projeto; e
  • razoabilidade técnica-econômica do plano detalhado de aplicação.

A nova norma autoriza o MS a contratar o fornecimento de tecnologias ou produtos resultantes do PDIL durante o período de até dez anos – contados da finalização da solução. Para isso, devem ser cumpridas as etapas e exigências relativas:

  • ao processo de desenvolvimento da tecnologia;
  • à regularização da solução nas autoridades competentes;
  • à capacidade de produção local da tecnologia ou produto para o SUS; e
  • à incorporação no SUS.

Impactos para PDPs e alianças estratégicas vigentes

De acordo com as novas portarias, deverão ser adequadas ao modelo de PDP as parcerias de desenvolvimento tecnológico e os acordos de transferência de tecnologia celebrados até 31 de dezembro de 2022 ou que tenham instrumento de aquisição do produto atualmente em vigor.

Esses acordos e parcerias devem ser informados à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde do Ministério da Saúde (SECTICS/MS) até 22 de agosto de 2024.

Da mesma forma, até junho de 2025, podem ser adequadas ao modelo do PDIL as alianças estratégicas em vigor para o desenvolvimento local de soluções inovadoras que tenham como objetivo fornecer produtos ao SUS.

Vale lembrar que passados poucos dias do anúncio da nova estratégia para Ceis pelo governo em outubro passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou que o MS suspendesse novas PDPs até que fossem adotadas medidas para avaliar transferências tecnológicas e critérios objetivos para seleção de parceiros privados (processo TC 034.653/2018-0) – confira nossa análise completa aqui. A Advocacia-Geral da União (AGU) interpôs pedido de reexame sobre a decisão.

Em 15 de abril de 2024, a SECTICS/MS apresentou esclarecimentos parciais sobre as medidas tomadas pelo MS para atender àsdeterminações do TCU. Especificamente informou que:

  • o tema foi colocado em consulta pública, para ampliar a discussão, embasar decisões, promover diálogo e legitimar a transparência e a participação social com o objetivo de obter informações, opiniões e críticas sobre programa de PDPs;
  • a atualização dos regimentos internos da Comissão Técnica de Avaliação (CTA) e do Comitê Deliberativo (CD) seria feita após a publicação da nova portaria do programa;
  • os pontos de mérito alvos das determinações do TCU teriam sido abordados na minuta da portaria objeto da consulta pública; e
  • todas as instituições públicas foram comunicadas, por meio de ofício via e-mail, sobre a necessidade de realização de um processo seletivo ou de pré-qualificação do parceiro privado ou justificativa adequada em caso de inviabilidade.

Além disso, o MS requereu que o prazo de 180 dias para a verificação de conformidade com os princípios de direito público entre os critérios para aprovação de PDPs – em particular os de publicidade, legalidade e moralidade – passe a contar a partir da publicação do novo regulamento – confira nossa análise sobre o tema aqui.

O processo TC 034.653/2018-0 havia sido incluído na pauta do plenário do dia 17 abril, mas foi retirado de pauta em seguida, sem justificativa. Até o momento, não foram divulgados outros andamentos.

A prática de Life Sciences & Saúde pode fornecer mais informações sobre o tema.